quinta-feira, 29 de abril de 2021

 

CARDINHO SANTO

Clerisvaldo B. Chagas, 30 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica:2.523


 

Saí caminhando pela zona rural, passei pelo sítio Barroso, cheguei ao sítio Água Fria e desci por uma estrada carroçável rumo ao rio Ipanema. Adiante a estrada se bifurcava e se unia mais à frente, deixando um capão de mato entre as duas trilhas. Foi aí que olhei para dentro da capoeira e levei um susto com a imagem de Nossa Senhora em cima de uma pedra de bom tamanho. Parecia escondida e colada diretamente na pedra. Ao me recompor da surpresa, imaginei que teria sido algum tipo de pagamento de promessa por devoto do lugar. É assim com quem anda pelas trilhas sertanejas com os mais diferentes objetivos. Imagine, uma imagem de uma santa colada numa pedra dentro duma capoeira! Sim uma surpresa grande, mas também uma gratificante surpresa.

Ainda em trilhas de poeira cinza, daquela trazida pelo remanso do rio, tive outra surpresa.  Desta feita nas imediações do sítio chamado Poço Grande. Caminhando e observando a trilha com o cuidado em possíveis cobras, ao levantar a vista, vejo uma pequena construção verde em cima de uma pedra e se confundindo com a vegetação também muito verde. Era uma espécie de oratório com gradeado, apresentando a imagem do padre Cícero Romão. Fui examiná-lo de perto, segui pela trilha, mas voltei lá outro dia, exclusivamente para fotografar. Segui para tentar ver a cara de um boi que muita gente afirma observar num grande lajeiro formado no Poço Grande também chamado Poço do Boi, por esse motivo. Não consegui distinguir nos desenhos da pedra a cara do ruminante.

Ipanema seco, grande jardim a céu aberto. Nova surpresa que me deixou eufórico. Descobri em um monte de areia num canto de cerca, a mimosa planta Cardinho Santo. É pequena, azulada, folhas recortadas e florzinha amarela. Uma raridade! Era um dos principais ingredientes para fazer garrafadas para pessoas com asma. A Senhora, do sítio Pé da Serra, que fazia o remédio, dizia que só poderia fazer a garrafada com o Cardinho. No rio Ipanema tinha a época de encontrá-lo e a de não o encontrar, daí a minha euforia. Fotografei o espinheiro para adicioná-lo a um Slide de plantas medicinais do rio Ipanema, a ser apresentado na Escola Helena Braga.

Atualmente está muito perigoso andar e pesquisar individualmente.

Missão cumprida, é ajeitar o embornal, aprumar o chapéu e retornar a casa que ninguém é de ferro.

CARDINHO SANTO (ADOBE STOCK).


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/cardinho-santo-clerisvaldo-b.html

quarta-feira, 28 de abril de 2021

 

SANTANA – ÁGUAS BELAS

Clerisvaldo B. Chagas, 28 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.522


 

Quando o interventor Pedro Gaia, vindo de Palmeira dos Índios, assumiu a prefeitura de Santana do Ipanema, aconteceu no mesmo dia a morte de Lampião e Maria Bonita. A gestão de Pedro Gaia foi curta, mas profícua. Entre outras coisas reformou a prédio da prefeitura e que só foi reformada novamente no governo Isnaldo Bulhões, década de 80. Porém, importante mesmo foi a abertura de uma estrada que ligou Santana à cidade pernambucana e fronteiriça de Águas Belas. Um verdadeiro marco econômico, turístico e fraterno entre esses dois núcleos que sempre se respeitaram e se confraternizaram desde os primórdios. Normalmente para se chegar a Águas Belas, o santanense vai pela BR-316, até o entroncamento Carié, município de Canapi e dali continuará seguindo direto a Pernambuco. Arrodeio enorme.

Santana – Água Belas pelo atalho de Pedro Gaia – ainda estrada de terra – é apenas um pulo. A pavimentação asfáltica teria duas opções em Alagoas, uma diretamente pelo povoado São Félix e sítios com Baixio, Imburana do Bicho, Camonga, Gravatá, Poço d’’Anta e vários outros antes e depois de São Félix. A segunda opção teria no roteiro, os sítios Barroso, Água Fria, Salgado, Camoxinga dos Teodósio, Pinhãozeiro e Malembá, puxando um ramal para o povoado São Félix. Esta opção pega boa parte da região serrana de Santana do Ipanema.

O integração em asfalto, já foi cogitada antes, ficou, porém, no campo das ideias. Naturalmente precisaria interesse dos dois prefeitos em questão, além do apoio dos governadores dos estados envolvidos. Um novo leque de progresso se estenderia na região beneficiando os dois municípios em todas as áreas: Economia, turismos, saúde, educação, Comércio e prestação de serviços em geral. O movimento de Águas Belas é para a distante Garanhuns e que poderia reparti-lo com a praça de Santana do Ipanema. O futebol entre os dois núcleos, deixou as portas escancaradas para mais esse futuro intercâmbio que se não acontecer hoje será amanhã.  A propósito, ambas às cidades são banhadas pelo rio Ipanema e sempre se ouviu dizer no passado: “Águas Belas e Santana são irmãs”.

Talvez esteja faltando apenas um cacique do lado de cá e um pajé do lado de lá com a boa-vontade no meio.

PREFEITURA DE SANTANA, REFORMADA EM 1986 (FOTO: B. CHAGAS/LIVRO 230).

 

 

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/santana-aguas-belas-clerisvaldo-b.html

terça-feira, 27 de abril de 2021

 

MULUNGU

Clerisvaldo B. Chagas, 28 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.521


 

Cheguei bem perto do jogo, mas nada entendia de lances do tabuleiro. Apenas ficava de boca aberta contemplando aquelas sementes grandes, vermelhas vivas, envernizadas pela Natureza. Os jogos da tarde aconteciam na calçada, defronte a entrada do Hotel Central, bem no centro do Comércio. Dizia o ditado sertanejo que “jogo de velho ´é gamão”. E estavam sempre ali o dono de farmácia Cariolando Amaral, o Seu Carola (ô) e seus parceiros diante do tabuleiro de madeira, copinhos de sola, sementes de mulungu, aproveitando a sombra do “sobrado da esquina”. Carola, o único homem de Santana que usava cotidianamente gravata borboleta, comercializava no “prédio do meio da rua”, parecia um galego alemão muito sisudo. Era atração na sua farmácia, o busto de um negro lustroso e fortão, envergando uma barra de aço. Representava o efeito do remédio da propaganda. Quando foi demolido o “prédio do meio da rua”, Cariolando passou a negociar em um dos compartimentos do térreo do “casarão da esquina”, mas Seu Carola continuou desafiando concorrentes do gamão.

Aquele homem tão sério se esbaldava nos carnavais de Santana, trocando incrivelmente o tabuleiro pelo reino de Momo.

Catávamos aquelas sementes maravilhosas no mato, quando as árvores mulungus despejavam-nas no solo colorindo a poeira cinza das capoeiras. Para que servia a semente além do jogo de gamão? Não sabíamos, apenas brincávamos com elas aproveitando o capricho da flora sertaneja.

A árvore mulungu (Erythrina mulungu) pode atingir até vinte metros de altura, é medicinal, usada como calmante. Sua madeira é muito leve e boia na água. Seus pedaços trazidos pelas cheias, serviam para o aprendizado da natação no rio Ipanema. A madeira ficava enganchada nas pedras, sendo aproveitada pelos banhistas.

Infelizmente muitas dessas árvores tão simpáticas, ainda são vítimas dos machados clandestinos, com punições zero.

As sementes de mulungu, pela beleza continuam encantando meninos e adultos.

Após Cariolando Amaral, desapareceram definitivamente os jogos de gamão em nosso município.

A diversão dos idosos agora é um celular que une os estranhos de longe e separa a família de perto.

TÍPICO MULUNGU SERTANEJO (CRÉDITO: PINTEREST).

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/mulungu-clerisvaldob.html

segunda-feira, 26 de abril de 2021

 

 

SANTA TEREZINHA

Clerisvaldo B. Chagas, 27 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.520



 

Quem é devoto de Santana Terezinha, deveria aproveitar esse tempo de pandemia e procurar o monte sagrado santanense, serrote do Cruzeiro. As últimas chuvas deixaram verde o monte e seu limite de trás, o serrote Pintado, ponto de luxo da Reserva Tocaia. A capela de Santa Terezinha está localizada em um amplo lajeiro que oferece o melhor cenário de Santana do Ipanema. Esse lajeiro vai declinando na parte de trás, após cerca de 50 metros mais ou menos plano. Ali contempla-se a baixada entre os dois montes citados acima, somente mato e às vezes roça e, a parte alta da Reserva Tocaia. Se pegar um dia de sorte verá saguins transitando por ali. No tempo seco, somente solidão de fim de mundo. Ótimo lugar para meditação. Mas é preciso levar água de beber, pois a trilha de subida cobra pernas e fôlego.

Sobre o lajeiro, apenas uma pequena parte côncava que acumula água das chuvas, quase sempre muito verde, imprestável. Ali também é refúgio de urubus devido a sua altitude. Na parte lateral esquerda, o lajeiro se prolonga, oferecendo outro ângulo de vista para a cidade, consequentemente para quem deseja fotografar. Aliás, subir até o Cruzeiro sem máquina fotográfica parece um pecado do visitante. Quanto a capela em si, é a terceira construída no lugar das duas primeiras que ruíram. Como faz bastante tempo que subimos o serrote, não sabemos como se encontra a parte física da capela, se a mesma continua de porta fechada e quem tem a chave para visitas.

O cruzeiro fica logo na frente da capela e foi colocado ali como marco do século XIX para o século XX. É o segundo cruzeiro erguido no mesmo lugar do original.

A Capela de Santa Terezinha, a mulher que costumava jogar pétalas de flores no Santíssimo Sacramento durante as procissões, foi erguida em torno de 1915, como motivo de promessa do, então, sargento Antides. As duas primeiras capelas foram construídas com muita festa de trio de zabumba, feijoada para os trabalhadores e devotos carregando morro acima, material de construção.

Como chegar lá? Ao atravessar a ponte do Comércio, continua a caminhada sempre em frente, linha reta até a subida da colina e chegar às últimas casas da rua que encosta no sopé do serrote. Daí em diante entra-se por uma vereda que vai se alargando e ficando cada vez mais inclinada. Subindo e descansando, o turista atingirá o topo saindo bem ao lado direito do grande Cruzeiro. O restante fica por conta das emoções de cada um.

SERROTE DO CRUZEIRO E CAPELINHA NO TOPO, VISTOS Da BR-316, BAIRRO CAMOXINGA (FOTO: B. CHAGAS).

Pesquise sobre Santa Terezinha.


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/santa-terezinha-clerisvaldo-b.html

domingo, 25 de abril de 2021

 

ESTRELA

Clerisvaldo B. Chagas, 26 de abril de 20121

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.519

 


Esta é uma reflexão mais particular, porém, cabe na Geografia de compartilhamento. Sempre que eu voltava de Maceió, chamava-me atenção a cidade de Estrela de Alagoas, a última do Agreste para quem viaja pela BR-316 Maceió – Sertão. Primeiro foi a rapidez com que aquele núcleo evoluiu e modernizou-se, após a sua emancipação política de Palmeira dos Índios. Segundo, a admiração em contemplar tantas árvores nos seus arredores, entre a cidade e uma serra próxima. Um parque rural espontâneo, pensei, mas sem oportunidade de visitá-lo. Ali nos arredores também existem dois montes famosos que foram parar na Geografia de Alagoas, do saudoso Professor Ivan Fernandes (1963).

Várias tentativas da minha parte foram feitas para fotografar ambos os montes afastados da cadeia de montanhas de Palmeira dos Índios: serrote do Cedro e serrote do Vento. Este é belíssimo e visitado por inúmeras pessoas em época de Semana Santa. O máximo que consegui foram fotos azuladas pela distância da BR para lá (cerca de 3 Km) e tempo chuvoso. Era para o meu livro “Repensando a Geografia de Alagoas”, inédito e engavetado. Modesta à parte um compêndio que nada deixa a desejar ao do mestre Ivan. Entretanto, fiquei mais admirado ainda com suas terras rurais de barro vermelho constantemente exibidas na Internet em vídeos de compra e venda de chácaras e fazendas daquele município. Acho que a morada naquelas terras caracteriza bem a vida dupla campo/cidade. Mundo rural com Estrela de Alagoas e Palmeira dos Índios.

Nem sei ainda como os políticos não se assanharam para emanciparem povoados, distritos e vilas como fizeram no passado. Mas isso ainda pode acontecer com lugares como Areias Brancas, em Santana do Ipanema; Canafístula Frei Damião, em Palmeira dos Índio; e vários outros lugares progressistas de Alagoas como o Pé Leve, Candunda, Caboclo, Piau, Alto do Tamanduá, Carié e muito mais.

Mas nessa hora em que estou planejando plantar meus tomateiros pérolas, bem poderia ser com aquelas terras vermelhas e belas de Estrela de Alagoas e do sítio serrote do Vento.

Amar à natureza.

SERROTE DO VENTO (Crédito: mapio. Net)

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/estrela-clerisvaldob.html

quinta-feira, 22 de abril de 2021

 

BAIRRO PERDE O SÍMBOLO

Clerisvaldo B. Chagas, 23 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.518

 



     Na última terça-feira (20) Santana do Ipanema perdeu um dos pontos de referência da cidade e o principal símbolo de origem de bairro. Com já foi historiado em outra crônica, vândalos derrubaram  um grupo de Cajaranas que davam nome ao lugar, na antiga rodagem, saída para Olho d’Agua das Flores. Tudo ficou por isso mesmo. O lugar tradicional “As Cajaranas”, caiu assim no anonimato histórico da cidade. Agora, por coincidência, longe dali a árvore Cajarana que deu nome as habitações da Cajarana, por trás do Hospital Clodolfo Rodrigues de Melo, tombou naturalmente, graças `a sua idade e os fenômenos da Natureza. A queda da árvore que originou o lugar Cajarana, danificou três casas vizinhas e teve, após, as ações do Corpo de Bombeiros.

Felizmente esse ponto de referência do Bairro Floresta, ficou imortalizado no livro “Negros em Santana”, de autoria nossa e parceiros. Agora só pode ser visto pela nossa foto imorredoura, pelas conversas de quem a conheceu ou pela memória dos que a vivenciaram. Cajarana (Spondias dulcis) é originária da Oceânia e, conforme a região tem outros nomes como Cajazeira, Cajá-manga e outros mais. Seu fruto é o cajá, azedo/doce, consumido in-natura e excelente para sucos, picolés e sorvetes. Sua madeira é mole e branca muito usada pelos artesãos em madeira. Em nossa juventude conhecemos o jovem filho do conhecido Ney Damasceno que fazia cabeças de piratas com o miolo da cajarana, à canivete. Uma perfeição.

Como a árvore foi cortada em pedaços, demos ideia ao Secretário da Agricultura e Meio Ambiente Jorge Santana, que oferecesse a madeira a um artesão de Senador Rui Palmeira e que tem seus trabalhos expostos na Feirinha Camponesa das sextas-feiras, em Santana do Ipanema. Lembrando também que, Cajazeira foi vulgo de um dos cangaceiros de Lampião que escapou do massacre de Angicos e chegou a ser prefeito da sua cidade, em Sergipe. O lugar Cajarana faz parte do Bairro Floresta, por trás do Hospital Clodolfo Rodrigues de Melo. É uma área muito sofrida e que recentemente foi contemplada com pavimentação em pedra. A Cajarana que lhe o título, já sofrera uma tentativa de incêndio por um morador local. Mas quis a natureza tombá-la pela idade centenária à base de chuva e ventania na parte alta da Floresta.

´CAJARANA EM PÉ (FOTO: LIVRO NEGROS EM SANTANA, B. CHAGAS). CAJARANA TOMBADA (FOTO: CORPO DE BOMBEIROS LOCAL).

 

 

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/bairro-perde-o-simbolo-clerisvaldo-b.html

quarta-feira, 21 de abril de 2021

 

REMANSO

Clerisvaldo B. Chagas, 22 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.517

ONTEM, 21 DE ABRIL FOI O DIA DO RIO IPANEMA



 

Em tempos de cheias no rio Ipanema, o ponto predileto do banho era no Poço dos Homens, dividido em Estreitinho, Largo Fundo e Largo Raso. O Estreitinho era uma pequena garganta pedregosa no início do poço. Recebia as águas que por ali entravam. Era mais escondido e tinha a preferência de muitos banhistas e pescadores de anzol. O Largo Fundo, logo abaixo do Estreitinho, era aberto e mais exposto, tinha a preferência de vários banhistas e tarrafeiros. O Largo raso, vizinho e na parte de baixo, era mais usado pelas crianças e por aqueles que aprendiam a nadar. Assegurava pesca de litro para piabas.

Quanto ao movimento das águas, nós o dividíamos em Correnteza, Carneiros, Fervedouros, Panelas e Remansos.

Correnteza, o corpo mais forte das águas. Carneiro, corcovas sucessivas formadas na correnteza. Panela, forte redemoinho que funcionava como sugadouro, ao lado dos Carneiros. Fervedouro, Formação ao lado dos Carneiros com aspectos de água fervente no fogo. Remanso, retorno manso das águas nas laterais mais distantes da correnteza. Quase todos os santanenses tomavam banho no poço, até o, então, futuro governador Geraldo Bulhões. Houve muitas passagens engraçadas que foram narradas em nosso livro:” Ipanema um Rio Macho.” Bem que o Poço dos Homens merecia uma estátua de banhista anônimo nas pedras do Estreitinho. Uma bela estátua iluminada que desafiasse as cheias. Todos tinham medo das panelas, cujo redemoinho aquático podia levar o banhista ao fundo. O fervedouro paralisava os movimentos do banhista podendo levá-lo ao afogamento.

Felizmente sua memória está no livro citado acima, resgate único da maior fonte de lazer do santanense, antes da Ponte General Batista Tubino. ONTEM, 21 DE ABRIL FOI O DIA DO RIO IPANEMA.

RIO IPANEMA, SERENO (FOTO OBRA DE ARTE: JEANE CHAGAS)

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/remanso-clerisvaldob.html

terça-feira, 20 de abril de 2021

 

AINDA OS CASARÕES SANTANENSES

Clerisvaldo B. Chagas, 21 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.516



 

Tudo leva à década de 20 do século passado, a construção do enorme prédio do governo estadual no Bairro São Pedro.  Ficou conhecido pelo povo como o prédio do Fomento Agrícola.  Foi a época em que o governo resolveu apostar tudo na agricultura sertaneja, sendo designado para a missão o agrônomo Otávio Cabral que fundou o Sítio Sementeira para experimentos agrícolas e chegou a ser dirigente de Santana do Ipanema. Foi construído ainda o prédio em forma de sobrado chamado Perfuratriz, onde hoje funciona a Associação da Rua da Praia. O prédio da Perfuratriz (belo edifício) foi marco da cheia do Ipanema de 1941, a mais famosa da história. Esse foi demolido. O casarão do Fomento foi sendo desgastado pelo tempo até chegar a sua vez de desaparecer. Abrigava o primeiro tanque para corpo de bombeiros de Alagoas, diziam, ferrugem o devorou e, o prédio sem socorro, deixou de existir.

O casarão era como um senhor respeitável que atraía prestígio para o bairro São Pedro. Era muito imponente virado para a Rua São Paulo, início da antiga rodagem para Olho d’Água das Flores. Pertinho dali, no final da Rua Antônio Tavares, um segundo casarão havia, cheio de janelões e quintal chegando até a rua de baixo, na época chamada Rua de Zé Quirino. (Fora ele quem a iniciara). O casarão visto pela lateral de onde se avistava a metade dos seus janelões de madeira era realmente impressionante. O casarão era em preto, isto é, só tijolo e barro sem reboco. Ali funcionava a fábrica de colchões de junco do Sr. Júlio, vulgo Júlio Pezunho, por ter um dedinho a mais na mão, atrofiado.

Santana era a terra de casarões e sobrados que marcavam o tempo faustoso da época de vila. Construir casas enormes e sobrados demonstravam prestígio para os respectivos donos. A marcha inexorável do tempo, foi acabando com a moda que foi sendo esquecida na Santana moderna.

Raras fotografias vão contando uma história sem texto da Arquitetura dos ricos.

FOMENTO AGRÍCOLA EM RUÍNAS, 2013. (FOTO: B. CHAGAS/LIVRO 230)


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/aindaos-casaroes-santanenses.html

segunda-feira, 19 de abril de 2021

 

PERFUME

Clerisvaldo B. Chagas, 20 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.515


 

Essas chuvas esparsas que estão acontecendo em nosso sertão de Alagoas, têm aparência de fim de inverno. Mas como estamos ainda no outono, combina vez em quando esse refresco em terras sertanejas. Com esses serenos aguando a caatinga, o aroma selvagem de mato invade gostosamente as narinas dos transeuntes. O velame, comum nas veredas e margens de riachos, aparenta  comandar toda a perfumaria da caatinga. Parece até que são as primeiras chuvas que agradam mais aos matos nativos. Como é rica a nossa flora! Até o mato baixinho dos terrenos baldios, bota florezinhas variadas e perfuma tudo. Isso me lembra uma curta viagem ao sítio rural Curral do Meio com o zelador do Ginásio Santana, na época, Sebastião Veríssimo.

O zelador que voltava sempre á noite para casa no citado sítio nos convidou para conhecer sua morada. Contou-nos a história de ter se encontrado com um guará choco e disse que lutou muito com uma faca-peixeira à mão e via a hora de sucumbir perante a ferocidade e insistência do lobo solitário. Quando a fera desistiu do ataque, ele já estava completamente exausto. São os perigos de quem transita pelos campos em horas inconvenientes. Mas voltemos à visita ao Curral do Meio onde fica a Fazenda Sementeira, hoje Reserva ambiental do governo do estado. Terras planas, bonitas, de lá se avistava o serrote do Gonçalinho, atualmente chamado serra das Micro ondas.

Veríssimo saiu me mostrando o mato do campo, nomeando e dando sua serventia: Favela, rabo-de-raposa, mata-pasto, capim santo... Até que disse: “vou lhe fazer uma surpresa”. Mostrou-me uma plantinha roxa que não tinha dez centímetros de altura, perdida no meio de tantas maiores e mais ativas, arrancou suas folhas, entrego-as na minha mão e disse: esfregue-as e cheire. Assim procedi e fiquei muito agitado como se tivesse descoberto ouro. Um perfume extraordinário que poderia ser comparado aos melhores perfumes franceses. Infelizmente não dá para lembrar o nome da plantinha. Adiante, mostrou-me outra planta sem falar o nome, depois só fez confirmar o que o cheiro forte revelava: Vick Vaporub, matéria prima do famoso unguento de farmácia. Eu não tinha a menor ideia do que estava testemunhando. Aprendi muito com o homem simples do campo.

É assim a nossa flora sertaneja. Surpresas por todos os lugares.

LOBO GUARÁ (Crédito: notícias.smbiente.com.br)

 

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/perfume-clerisvaldob.html

domingo, 18 de abril de 2021

 

O RELÓGIO DA MATRIZ E AGRIPINO

Clerisvaldo B. Chagas, 19 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.514

 



A imponente Matriz de Senhora Santana, em Santana do Ipanema, possuía na sua torre, um grande relógio que ocupava as quatro faces do edifício, acima do campanário. É conhecido desde o final dos anos 40. Com suas poderosas badaladas acontecidas de meia em meia hora, o soar do sino era ouvido à distância incrível. O comércio da cidade obedecia ao relógio da Matriz. Abria com a badalada das sete e trinta e fechava exatamente as onze e meia. Com o passar do tempo o relógio foi precisando de reparos aqui, acolá, até que chegou ao ponto de parar completamente. Práticos da terra sempre tentaram dar sobrevida ao marcador, mas os paliativos não deram certo.

Bem que tentamos pesquisar a origens dos sinos da Matriz indo à casa do padre Jaciel, mas nada encontramos em registros do passado: de onde vieram os sinos, o preço, os diferentes sons... Assim também não encontramos sobre o relógio. Fazer o quê? O relógio não manda mais no Comércio, porém continua lá como ornamento indispensável à torre e a história. Isso lembra os homens corajosos que subiam até o campanário, continuavam para o compartimento do relógio e alcançavam a passarela dos minaretes, subindo desafiadoramente a escadinha da cruz para consertos de lâmpadas ou implantação de outras. Vistos do solo, dava até mal estar diante daquela coragem nas alturas.

No chamado Casarão de esquina, vizinho à igreja e que formava esquina com a Rua Coronel Lucena, havia uma loja com várias portas de madeira pertencente ao senhor – comerciante e fazendeiro – José Quirino. Ali trabalhava o senhor Agripino Pontes, descendente Fulni-ô de Água Belas, bem adaptado em Santana e querido na sociedade santanense. Entre o trabalho e a brincadeira, Agripino começava a abrir a primeira porta da loja na badalada única das sete e meia. Depois saía abrindo as outras até a última quando dizia: “Dar doze horas e não dá onze e meia”.

Ilustração do relógio rigoroso.

RELÓGIO DA MATRIZ (FOTO: B. CHAGAS).

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/orelogio-da-matriz-e-agripino.html

quinta-feira, 15 de abril de 2021

 

CHEGANDO O PAI VELHO

Clerisvaldo B. Chagas, 16 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.51

 



     Para a sensibilidade poética de qualquer santanense, a chegada das águas mansas, arrastadas, do rio Ipanema, é um verdadeiro poema de amor no ventre do semiárido. Elas vão surgindo fazendo meandros na areia grossa, devagar igual a uma grande jiboia preguiçosa. Chegando e fervendo à areia, preenchendo as baixadas, cobrindo as cacimbas, espantando teiús... Vez em quando a jiboia d’água cerca um caçador desatento, uma lavadeira cantora, um pescador distraído. Mas, ao contrário das cheias bruscas e violentas, o chegar tangido das águas traz esperanças aos ribeirinhos que sonham com peixes maiores e a pesca rudimentar. As florezinhas enroladas do marmeleiro fazem uma saudação perfumosa em suas saudosas margens. As águas confirmam os mandacarus floridos no alto das colinas prenunciando o bom inverno sertanejo.

Rio Ipanema, primeira grande estrada de penetração para os desbravadores do estado do Norte que subiam pela sua foz no lugar Barra do Ipanema, até suas cabeceiras na serra do Ororubá, em Pernambuco. Rio percorrido também em Alagoas pelos índios Carnijós ou Fulni-ôs com sede em Água Belas. Rio em que foi descoberto ouro na sua parte inferior, no antigo tempo das penetrações. Rio que deu lugar aos canoeiros do Ipanema em época de pontes inexistentes.

O rio penetra em Alagoas pelo município de Poço das Trincheiras, banha aquela cidade de fronteira, desce para Santana após banhar o povoado Tapera do Jorge. Arrebanha vários afluentes importantes naquele município e chega à Santana pelo Norte e outrora periferia, hoje urbanizada do Bairro Barragem.

Quando o Ipanema está seco é um jardim. Variados tipos de vegetais nascem na areia grossa e salgada, nas frestas das pedras quebradas com gramíneas, arvores, arbustos e arvoretas. Mas nem sempre esse jardim é respeitado pela população que ali deposita seus lixos doméstico e comerciais, despeja direto de fossas e todos objetos descartados em casa. Mas isso é antigo na história do rio. Quando a chamada Cadeia Velha funcionava na Rua Nilo Peçanha, os presos eram obrigados a jogarem as fezes recolhidas em cubas, no rio Ipanema. Conta-se que o soldado Fonfon era bom atirador e ficava vigiando dos fundos da Cadeia os presos que desciam para o rio. Um deles tentou fugir, porém, Fonfon atirou de fuzil de uma distância enorme e o fugitivo foi baleado nas areias do rio.

Rio meu, rio seu, rio nosso.

ÁGUA CHEGANDO MANSA EM TRECHO DO RIO IPANEMA. (FOTO: ACERVO B. CHAGAS).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/chegandoo-pai-velho-clerisvaldob.html

quarta-feira, 14 de abril de 2021

 

SEM MÉDICOS

Clerisvaldo B, Chagas, 15 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.512

 



Você já ouviu falar em Arnica, Mastruz, óleo de Copaíba e Terebentina? Quando não havia médicos no sertão de Alagoas, esses nomes acima estavam sempre presentes no conhecimento popular. Quando as pessoas adoeciam entravam em ação as rezas e os remédios do mato, os mesmos das tradições indígenas e dos repasses pelos mais velhos.  Em casos mais complicados quem tinha condições viajava a Palmeira dos Índios, no agreste, mais perto da capital ou mesmo para Garanhuns, Pernambuco, conhecido como lugar de bons profissionais da medicina. Afora as orações e os remédios da vovó, havia ainda as garrafadas, ervas e raízes de vários tipos, dentro de uma garrafa, preparada pelo raizeiro, benzedor ou garrafeiro, que tanto vendia o seu produto curativo nas feiras livres quanto aguardavam específicas encomendas.

As parteiras foram essenciais nos campos e nas cidades. Muitas delas ficaram famosas porque nunca perderam uma só criança. A parteira também possui as suas orações particulares. No campo era praxe o curador de cobras. Eram curados até cercados onde as cobras que havia se retiravam e as de fora não entravam naquela propriedade. Da mesma maneira que havia ervas medicinais para os humanos, a prática sertaneja também curava todos os tipos de animais: galinha, cavalo, vaca, carneiro, bode... Pois sempre havia alguém com algum conhecimento sobre o tema, uns superficialmente, outros, profundos conhecedores dos efeitos transformadores da flora.

Em Santana do Ipanema, o Dr. Arsênio Moreira, foi o primeiro médico de fora. Já trabalhava para o Batalhão de Polícia de combate aos cangaceiros e também ficou atuando em sua própria residência. Daí em diante muita coisa mudou no sertão. Foi o doutor Arsênio quem examinou o frasco de veneno que Lampião carregava. Isso após a hecatombe de Angicos. Arsênio chegou a morar no edifício onde hoje funciona o Museu Darras Noya. O segundo médico a clinicar em Santana, foi o Dr. Clodolfo Rodrigues de Melo, filho da terra, vindo da zona rural, trazido pela família que fora importunada pelos sequazes de Virgulino Ferreira, o Lampião. Clodolfo atendeu muita gente no campo e atuou em cursos para parteiras leigas.

Já havia as chamadas boticas. Com as chegadas de médicos, também foram implantadas farmácias e chegando medicamentos modernos.

O padre Cícero do Juazeiro era profundo conhecedor da flora sertaneja. Gostava de receitar mastruz com leite para pessoas com problemas de pulmões. Nós sertanejos confiamos na medicina, mas dificilmente você encontrará uma residência que não guarde no armário um chazinho qualquer, tirado da mata catingueira ou dos terrenos baldios de periferia.

ARNICA (crédito: Pinterest).


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/sem-medicos-clerisvaldo-b-chagas-15-de.html

 

SANTANA: RUAS, RUAS E RUAS

Clerisvaldo B. Chagas, 14 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.506

 


No governo Marcos Davi, Santana do Ipanema teve a oportunidade em ser 100% calçada.  No início do seu governo, o gestor havia prometido pavimentar todas as ruas de Santana, com paralelepípedos. Não temos a menor ideia do que aconteceu para o prometido que estava sendo realizado a todo vapor, arrefecesse e deixasse de ser cumprido. Fez muito, mas a meta prometida não foi alcançada. Entra prefeito e sai prefeito, mas sempre aparecem novas ruas impulsionadas pelo progresso. Você já pensou em uma cidade sem uma única rua no barro, na areia, na lama e sem esgotos a céu aberto? Isso evitaria doenças e mais doenças que lotam as unidades de saúde, proporcionando mais conforto para seus habitantes. Não importa que uma rua seja pavimentada com asfalto, cimento ou pedras, contanto que dê dignidade a seus moradores.

Atualmente a força do governo estadual tem beneficiado os municípios com pavimentação de asfalto e pedras, o que não havia nos governos passados. Daí o grande ensejo para a nossa cidade eliminar do mapa urbano qualquer rua, grande ou minúscula sem calçamento cobrindo-as com paralelepípedos. Veja a notícia dos sites locais: “O município será contemplado com serviços de pavimentação de 122 vias urbanas, que equivalem a 18 quilômetros. Além disso, serão implantados cinco equipamentos de lazer, com quadra e brinquedos infantis, que vão garantir opção de lazer público à população”. 

Santana já era calçada com pedras brutas desde o seu período de vila. A substituição do calçamento bruto por paralelepípedos, aconteceu na gestão do prefeito Ulisses Silva. Daí em diante ficava proibido o trânsito do carro de boi pelo novo calçamento. O aro de ferro da roda do veículo poderia danificar a nova pavimentação. Os carreiros, passaram a imitar as carroças de burro: Trocaram as rodas de madeira de lei por rodas de pneus e continuaram rodando pelo centro da cidade. Mas, a grande maioria dos carreiros, abandonaram as ruas de Santana, trafegando apenas da zona rural até o limite do rio Ipanema. Assim fomos deixando de ser a terra dos carros de boi.  Ainda existe alguns metros de calçamento bruto como museu a céu aberto na final da Rua Barão de Rio Branco, acesso ao rio.

RUAS, RUAS, RUAS...

Rua Antônio Tavares (Foto: B. Chagas/Livro 230).


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/santana-ruas-ruas-e-ruas-clerisvaldo-b.html

segunda-feira, 12 de abril de 2021

 

SER OU NÃO SER

Clerisvaldo B. Chagas, 12 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.510

 

Os cangaceiros usavam espinhos de mandacaru para palitar os dentes. As indústrias não fabricam palitos inspiradas nas cactáceas sertanejas. Entretanto, algum tipo de cola branca tem a ver com o aveloz ou labirinto como se chamavam no semiárido. Aproximadamente na década de 60, o sertão nordestino surgiu com essa planta para ser colocada junto as cercas de arame. A praga infestou o sertão, tanto que o transeunte da estrada sertanejas não avistavam mais as roças, as paisagens dentro das fazendas, todas rodeadas de labirinto. A planta crescia até mais de três metros de altura deixando as estradas como grandes túneis porque eram ladeadas pela planta.  O labirinto produz um leite pegajoso que bateu no olho, cega.  O labirinto (Euphorbia tirucalli) é um arbusto com mais de 40 denominações.

Para fazer as podas necessárias, os raros homens que se prestavam a fazer esse tipo de serviço, usavam máscaras de metal que cobriam completamente o rosto, deixando vidros no lugar dos olhos. Vez em quando se ouvia dizer que Fulano ou Beltrano teriam ficado cegos com leite de aveloz. Eu achava essa praga um absurdo. Algumas pessoas usavam o leite pingando nas verrugas como remédios de cura. Porém, nunca testemunhei a eficácia. Pensei que aquilo poderia ser aproveitada como cola. Décadas e décadas depois, vim a saber que indústrias estavam usando justamente o leite de aveloz como ingrediente nos produtos de colagens. Fui profeta realizado. Depois da década do aveloz, os matutos começaram a se livrar daquela planta e as estradas foram ficando limpa de um lado e do outro e aí já podíamos contemplar as fazendas cercadas somente pelas cercas de arame farpado. A praga acabou, mas revelando a surpresa do desmatamento que se escondia por trás do labirinto.

 No caso daquilo que era considerado erva daninha pelos criadores de gado, o mata-pasto, que se gastava fortunas para erradicá-los das pastagens. Imaginei na época se aquela erva não serviria para outra coisa. Descobri lá na frente que pesquisadores atestavam o valor nutritivo do mata-pasto e assim ele foi incorporado à silagem para ração animal nos tempos de estiagem. Vejam como a coisa muda! É quando o vilão passa a ser herói. E assim poderíamos citar vário produtos da nossa caatinga, antes desprezados, servindo de matéria-prima para as indústrias diversas, inclusive a farmacêutica, mas cultivada e sem desmatamento

Voltemos ao passado dos grandes filósofos: “ser ou não ser, eis a questão”

MATA-PASTO (FOTO: WIKIPÉDIA)

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/ser-ou-nao-ser-clerisvaldo-b.html

domingo, 11 de abril de 2021

 

SANGUE RURAL

Clerisvaldo B. Chagas, 12 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.509




 

Sou do tempo em que os terreiros das fazendas se enchiam de galináceos: pintos, galinhas, galos, guinés, capãos, pavões, patos, perus e guinés. Os cuidados de defesa eram apenas com o gavião e com a raposa. Revejo-me aguardando o canto da galinha para pegar ovo do ninho. Mulheres quilombolas chegando para capar os pintos maiores e torná-los frangos e capãos. A cuia cheia de milhos e o sacudir de mancheias quando o alvoroço da galinhada chegava para catar os grãos jogados no terreiro. Vinham correndo, voando, uma por cima das outras disputando o milho dourado produzido no local. Ti, ti, ti... Chamava a alimentadora.  Gradeados gigantes de ripas prendiam os capãos para cevá-los e transformá-los em delícias nas ocasiões especiais.

Revejo ninho enjeitado, com caramujo para atrair a galinha. Rezadeira aplicando remédio caseiro contra o gôgo no criatório. As batidas da mão de pilão pilando café com rapadura e o aroma alcançando dezenas e dezenas de metros de distância. Roupas sendo lavadas nos pilões de pedra, ruídos de cavalos comendo milho em aiós pendurados à cabeça. Placas à querosene nos pregos das paredes. O vai e vem do balanço de redes cearenses e as cantigas evocadas de mestres dos Guerreiros. Noites tremendamente escuras e o medo no pé da goela. Arrebóis de lindas estampas e garrinchas fazendo ninho nas biqueiras da casa. Abelhas sobrevoando pé de coração da índia. Pancadas de chuva no telhado; cheiro gostoso da terra molhada e fartura da roça transportadas em carros de boi.

A mente ainda vê o homem arrancando mandioca na terra fofa. Senhoras rapando raízes para farinhada. Pessoas tangendo o gado para longe da manipueira. Batalhões de trabalhadores apanhando algodão com sacos brancos e fundos. Cantigas na roça do “Mineiro ou Maneiro Pau”. Litros de gás óleo vendidos nas bodegas. Ensacamento do algodão em estopa para venda às algodoeiras. Bêbados conversando miolo de pote e cuspindo no pé do balcão. Cavaleiros esquipando seus cavalos baixeiros de volta à casa após as feiras livres. Bois de cambão esticando correntes puxando carros de boi lotados de mercadorias. Remoer de garrotes devorando ração de palma santa. Carreiros elogiando as morenas do sertão e o musical no mundo dos forrós que ilustravam as noites de escuro.

 

 

Ô sanfoneiro

Moça mandou lhe chamar...

Para tocar um baião no Ceará

Tu diz a ela

Que de pé em não vou lá

Eu só vou de avião

Se mandarem me buscar...

 

Como deixar ausente o vermelho e verde SANGUE RURAL?!

 

TERREIRO COM GALINHAS DE CAPOEIRA (CRÉDITO: STOOK FHOTO)

 

 

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/sangue-rural-clerisvaldo-b.html

sexta-feira, 9 de abril de 2021

 

MARCO DO SÉCULO XX

Clerisvaldo B. Chagas, 10/11 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.508

 


Foi pensando em um marco para o final do Século XIX e início do Século XX que o sacerdote Manuel Capitulino de Carvalho, de Santana do Ipanema resolveu erguer um monumento. Assim, na parte alta da cidade o padre construiu um monumento em que foi aproveitada a religião católica na marcação limiar dos séculos. Dedicou a obra à Nossa Senhora da Assunção. Feita a igrejinha/monumento, Capitulino – tudo indica que foi ele – encomendou uma imagem em Portugal da santa escolhida.  A imagem de Nossa senhora Assunção viajou de navio de Portugal ao Brasil, andou de trem de Maceió a Viçosa e de lá chegou a Santana do Ipanema viajando em lombo de jumento. Finalmente foi entronizada na capelinha que aguardava a sua chegada. Tudo leva a pensar que a imagem de Nossa Senhora de Fátima ocupava provisoriamente aquele lugar de oração.

N.S. Assunção foi recebida com festa e basicamente daí em diante, o monumento/igrejinha, além de marcar o início do Século XX, também originou o nome do novo bairro que se iniciava por ali: Bairro do Monumento. Ao mesmo tempo da construção da igrejinha, também era erguido um cruzeiro de pau no morro da Goiabeira com a mesma finalidade da igrejinha. O morro da Goiabeira passou a se chamar, então, serrote do Cruzeiro. Só em 1915 foi construída uma ermida no alto do serrote, mas nada tinha a ver com marco de alguma coisa, tendo sido apenas motivos de uma promessa particular.

Em 1938, as cabeças dos onze bandidos trucidados na fazenda Angicos, Sergipe, pela polícia alagoana, foram expostas nos degraus da igrejinha do Monumento, inclusive as de Lampião e Maria Bonita. Primeiro foram apresentadas em latas de querosene com álcool e formol, depois distribuídas nos três degraus, forrados com lençol branco. Multidões se aglomeravam e chegavam repórteres de todas as partes do País, inclusive do Rio de Janeiro. O evento motivou feriado em Santana, escolas fechadas, desfiles das forças com seus troféus, discursos, bebedeiras e banda de música nas ruas.

Foi ali onde se misturou a paz das orações e a violência do mundo.

IGREJINHA/MONUMENTO EM 2013. (FOTO: B. CHAGAS/LIVRO 230).

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/marcodo-seculo-xx-clerisvaldob.html

quarta-feira, 7 de abril de 2021

 

SANTANA PERDE

Clerisvaldo B. Chagas, 8 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.507


 

Com a morte do santanense Romildo Pacífico, vem a lembrança do senhor Benedito Pacífico contando como fazia na época de adolescente para estudar. Dizia que morava no sítio Batatal que fica à margem direita do riacho João Gomes e vinha estudar no centro da cidade de Santana do Ipanema. Como a estrada era longa, ele e Romildo cortavam caminho, justamente por uma antiga trilha bicentenária, a da Igrejinha das Tocaias. Desciam a ribanceira em direção ao riacho, atravessavam o João Gomes seco e entravam pela trilha que saía no Bairro Floresta. Quando não saiam juntos, quem chegasse primeiro numa bifurcação, deixava um sinal que já havia passado para a escola. Seu Biu, não me falava de assombrações ao passar pela cruz de beira de estrada ou se já era transformada em igrejinha.

Há muitos relatos sobre assombrações no lugar, inclusive registradas por saudoso escritor da terra da família Monteiro. Terno de zabumba invisível tocando em pleno meio-dia, botou muita gente para correr.

Conheci de longe Romildo Pacífico trabalhando na padaria do senhor Álvaro Granja, defronte a escolinha da Professora Helena Oliveira, na Ponte do Padre, onde fiz Admissão ao Ginásio. A conversa sobre ele, na época, era que o rapaz gostava muito de estudar e na padaria, ficava dividido entre o livro e o cliente. Nunca tive maior aproximação até porque ele era adulto e eu ainda criança. Sua trajetória na vida é muito conhecida do povo santanense. Infelizmente a pandemia não escolhe qualidade.

Nunca ouvi falar no sítio Alto Bonito, onde ele morou, mas com certeza era vizinho ao Batatal do seu primo Benedito Pacífico. Certa feita o Biu convidou-me para conhecer o seu lugar de nascimento. Fomos a pé pela mesma trilha da Igrejinha das Tocaias por onde suas pernas tanto caminharam. A casa no sítio estava fechada, precisando de reparos. Lembro-me da beleza do lugar e de um imbuzeiro em que Seu Biu colhia imbus e matava a saudade da zona rural. Quanto ao irmão de Romildo, Benildo Pacífico, estudamos juntos na 50 série do Ginásio Santana. Como era difícil estudar na cidade morando no sítio!

Existem muitas estradas boas e confortáveis, porém, continuamos – simbolicamente – em nossas vidas, usando veredas e mais veredas tais quais a dos primos Romildo e Benedito.

ROMILDO PACÍFICO (FOTO: REDES SOCIAIS).

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/santana-perde-clerisvaldo-b.html

terça-feira, 6 de abril de 2021

 

TOCAIAS: O ECO DO PASSADO

Clerisvaldo B. Chagas, 7 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica:2.506


 

Havia na região santanense de Bebedouro/Maniçoba, uma família de artesãos em madeira. Ela trabalhava com réplicas das partes do corpo humano para pessoas católicas que precisavam pagar dívidas. As peças que mais víamos eram: cabeça, mãos e pés, denominadas ex-votos. Eu identificava todos os membros da família, mas havia um galego que parecia que as cabeças de pau, eram baseadas na sua própria figura. Peças rústicas, feias, mas com certeza bem recebidas pelos donos das encomendas. Não sei dizer se aquela era a única família que confeccionava ex-votos, em Santana. Ao visitar certa feita a Igrejinha das Tocaias, nos confins do Bairro Floresta, vi uma verdadeira montanha de peças deixadas pelos devotos e juntadas ao pé da cruz do pátio. Como era grande a fé dos que faziam promessas na Igrejinha das Tocaias, com o santo estrangeiro Seu Manoel da Paciência que representava Jesus!

Quem vê o cantor e milionário Amado Batista, com todo respeito, vê a cópia das cabeças feitas pelos artesãos da Maniçoba. Sem ter onde colocar tantas peças, zeladores da Igrejinha tiveram que se desfazer de muitas e guardar um pouco das mais conservadas. Estou falando isso porque iremos fazer um movimento entre escritores e sociedade para darmos a assistência devida à igrejinha que precisa de reforma e muito mais. Há um ano estive procurando um artesão em madeira e ninguém soube informar de nenhum. Acho que artífice para essa finalidade de seguidores católicos, não existe mais no município santanense.

Não sei se o assunto interessa ao amigo e amiga, mas é fremente que resgatemos e conservemos a Igrejinha das Tocaias, cuja história já foi contada em cordel, por nós. Único resgate desta saga desconhecida pelo nosso povo. Uma vez revelada sua história, falta agora restaurá-la e até propor um tombamento uma vez que o humilde templo não pertence a ninguém. Quanto aos que gostam de fazer promessa, sobre membros do corpo, estamos sem artistas, pelo menos na cidade, restando recorrer a artesãos em outros tipos de material como gesso, por exemplo.

A propósito, nosso singelo subúrbio Maniçoba/Bebedouro, sempre foi rico no artesanato em couro de bode, em palha Ouricuri e em madeira e renda.

Seria bom um levantamento pela municipalidade para registro e benefício dos artesãos e artesãs remanescentes.

IGREJINHA DAS TOCAIAS (FOTO: B. CHAGAS).

 

 


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2021/04/tocaiaso-eco-do-passado-clerisvaldob.html