PINGANDO SANGUE (Clerisvaldo B. Chagas. 21/22.8. 2008) Aos professores alagoanos para reflexão nas assembléias Quando Moisés, no deserto de ...

PINGANDO SANGUE

PINGANDO SANGUE
(Clerisvaldo B. Chagas. 21/22.8. 2008)
Aos professores alagoanos para reflexão nas assembléias

Quando Moisés, no deserto de Sin, tocou na pedra de Horeb, a água jorrou para mitigar a sede da multidão e dos rebanhos. O milagre de Deus também fez mudar o nome do acampamento de Rafidim para Tentação, segundo o livro do Êxodo. Se Moisés mudou o nome do lugar, mais adiante é o próprio Deus que chama “água da contradição”, quando o mesmo Moisés precisou tocar à pedra duas vezes ao invés de uma. Novamente jorra água para o povo incrédulo que não tolerava o sofrimento. Nem toda a assistência do Criador aos refugiados do Egito, impediu o fraquejar do comandante.
A Educação no Brasil nunca teve nenhum valor para os dirigentes políticos. As conquistas suadas, sofridas, martirizadas, tentam servir de fermento para uma longa continuidade. Os que estão no poder passaram pelas bancas escolares e muitos pelas mãos dos que continuam desvalorizados e clamam nos gabinetes, nas ruas, nas clínicas médicas à realidade dos seus direitos. As pedras, os monumentos, os insensíveis — agora com barrigas de prosperidade — viram às costas para os mestres que os iluminaram. Como se sente um professor que foi político votou contra as conquistas dos colegas, caiu do poder e volta a pedir voto de antigos companheiros? As autoridades, principalmente municipais e estaduais, devem se sentir como os imperadores romanos nas orgias e na gula dos banquetes, olhando com ironia para a plebe esfomeada. As mais esfarrapadas desculpas saem dos privilegiados, para não dividirem o bolo fabricado com o dinheiro dos desassistidos. Essa luta infinita dos mestres pela sobrevivência é uma vergonha nacional, para os responsáveis manipuladores dos cofres e das chaves. Profissão pensante nobre, gigantesca, vítima dos executores, algozes, carrascos que só enxergam a frente, a cupidez do ouro e as manobras enxadristas dos cargos eletivos. Quanto ganha um edil, um deputado, um governador... Um prefeito? Mas professor não. Professor é para viver massacrado, pensativo e silencioso. Escada para muitos crápulas que ao invés das grades cinzentas das detenções, comem, dormem e passeia mangando introspectivamente das antigas luminárias. Muitos nada são; apenas bajuladores, capachos, homens das “norminhas” que ficam contra as justas reivindicações para serem agradáveis a patrões esculachados. Como se sente a sociedade vendo a multidão de mestres às ruas, entes tão respeitados pelos pais e guias dos seus filhos?
Marcham os professores nessa profissão espinhosa sem glória nenhuma. Lutas e mais lutas por coisas tão poucas que os faraós se recusam a conceder. Homens e mulheres que pelejam como os do deserto do Sin, procurando uma fonte para saciar a dignidade e só encontram a pedra. Não a pedra de Horeb que jorrou água em abundância, mas a pedra da injustiça, da incompreensão, da falta de patriotismo e da igualdade que ao ser tocada pelo cajado do Magistério, ao invés de soltar água fica PINGANDO SANGUE.

CONTINUA A PAZ (Clerisvaldo B. Chagas. 20/21.8. 2008) Voltando a comentar sobre Santana do Ipanema, antes da ponte sobre a BR-316, ...

CONTINUA A PAZ

CONTINUA A PAZ

(Clerisvaldo B. Chagas. 20/21.8. 2008)

Voltando a comentar sobre Santana do Ipanema, antes da ponte sobre a BR-316, onde foi formado um açude e surgiu também o Bairro Barragem, alguma coisa mudou. Com a falta da ponte sobre o rio, os automóveis que chegavam pela margem direita, rodeavam por um lugar denominado Volta do Rio. Era ali aonde o Ipanema chegava do norte e fazia uma curva para o leste. Como ainda era distante do centro, a Volta passou a ser lugar de passeios aos domingos, principalmente para os garotos que frequentavam o catecismo na Matriz de Senhora Santa Ana. O escritor Raul Monteiro dedica duas crônicas a Volta. Uma sobre a chegada do automóvel de Delmiro a Santana, outra sobre personagem que morava por ali de nome Satuba.

Visitando recentemente a Volta, notamos o estiramento do Bairro Barragem em direção ao Poço das Trincheiras. Pela parte de trás, surge um novo bairro chamado pelo povo de Clima Bom, pois, sendo alto e quase plano, recebe toda ventilação vinda pela Volta do Ipanema. Ainda pelas margens da BR-316, o casario do centro da cidade conseguiu encostar à ponte da Barragem, cujo leito está assoreado. É bem dinâmico o movimento na BR que se inicia logo ao amanhecer. O Bairro Barragem já possui alguns tipos de serviços como oficinas mecânicas, mercadinhos, churrascaria, bares e matadouro de bovinos.

Olhando, entretanto, pela parte baixa, no lugar exato onde o Ipanema faz a curva, a paz continua como antigamente. A Rua Manoel Medeiros conseguiu também encostar as suas residências a Volta do Ipanema. Mas, ao se chegar à margem propriamente dita, o passado retorna imediatamente. É a paisagem bucólica da área rural. As águas descem mansas por entre pedras e areia; os burros pastam nas ervas rasantes; as vacas holandesas caminham no sopé da barreira, do outro lado, e os garranchos cinzentos resistem às águas nas lascas dos pedregulhos. Lá adiante, na outra margem da Volta, casa confortável na confluência do riacho Salobinho; urubus passeando nos arredores do matadouro; tapera de parede caída perto dos lajeiros.

Quando se olha do meio do rio à jusante ou a montante, vem a impressão fortíssima de que o tempo parou em meados do século passado. Enquanto os sons da festa de Santana parecem distante dali, no Panema reina um silêncio de ontem e de paz. Uma paz longa, sem fim, infinita, que acalma que suaviza que desintoxica e que transporta.

Uma coisa, entretanto, não para de incomodar. O lixo, essa praga urbana que tomou conta dos núcleos humanos. A falta de cooperação do povo que insiste no hábito perverso de afogar os cursos d’água com entulhos os mais diversos.

E se o escritor Raul viesse de novo rever a Volta que ele descreveu o que diria da casa de Satuba? O que falaria sobre o areal que não deixava passar o automóvel lustroso de Delmiro?

Enquanto isso o rio Ipanema continua o seu novo fadário: agora não abastecendo mais à cidade — farta de água doce — mas sim, levando o lixo e as areias das encostas; vez em quando mantendo a tradição de levar gente também. Todavia, bravo, silencioso e servidor no seu vale repleto de quietude. Ipanema, “Pai de Santana”, lugar onde CONTINUA A PAZ.

Acesse o blog do escritor: http://clerisvaldobragadaschagas.blogspot.com/

O CANAL DO PROFETA (Clerisvaldo B. Chagas. 19/20.8. 2009) Os sertões nordestinos semp...

O CANAL DO PROFETA

O CANAL DO PROFETA
(Clerisvaldo B. Chagas. 19/20.8. 2009)

Os sertões nordestinos sempre foram pontilhados por frades, padres, beatos, fanáticos religiosos. Alguns criaram fama na época em que viveram, caindo no esquecimento tempos depois. É o caso do beato Severino e suas coisas absurdas no sertão de Alagoas. Todavia, pessoas sérias tornaram-se famosas permanentemente, pela religiosidade, pela vibração, pelos conselhos, pelos prodígios e mesmo pelos acertos de previsões marcantes. Com estilos diferentes permanecem na história do povo, o Padre Cícero Romão Batista e Frei Damião de Bozzano, considerados santos pelos seus seguidores. Mas existiu também um homem sério e venerado pelos sertanejos que saiu da memória do século XX. Francisco José Correia de Albuquerque, 1757-1848 — penedense e um dos fundadores de Santana do Ipanema — foi um padre carismático, milagroso e visionário. Entre suas inúmeras previsões, ficaram registradas em caráter inédito as que diziam sobre Batalha, Pão de Açúcar, Capim (Olivença) e Santana do Ipanema (ver em breve: O Boi, a Bota e a Batina, História Completa de Santana do Ipanema). Foi ele quem silenciou no meio de um sermão no antigo povoado Poço das Trincheiras, para depois dizer erguendo a cabeça: “Acaba de iniciar a Revolta Pernambucana no Recife”. 1817.
Quando acontece uma estiagem prolongada no sertão das Alagoas, surge em Santana do Ipanema, um verdadeiro festival de caminhões-pipa. Ruas e mais ruas ficam tomadas por esses veículos pesados, inclusive trecho urbano da BR-316. A sede toma conta dos animais e dos homens nos lugares mais longínquos da cidade. Não raras vezes esse modo obsoleto de salvação chega já em início da estação chuvosa, causando até mesmo prejuízo para os cofres públicos.
Quem não já ouviu falar no Canal do Sertão? Uma obra que vem sendo debatida há cerca de vinte anos e que se tornou fonte de propagandas eleitorais, o famoso e famigerado canal já se encontra em andamento. (Dizem até que é a mais importante obra hídrica do PAC). Quem conhece canal semelhante em Petrolina, no estado de Pernambuco, louva a iniciativa que é a única saída para a lavoura e o gado em seca prolongada. Mas as marchas e contramarchas desse trabalho corroem a paciência do sertanejo. Será que esses fatos só acontecem em Alagoas? Enquanto isso, lá o vem! Eita parou! Parou por quê? Já vem subindo! Chegou ali à casa de Chico Bento! Parou de novo, Mané!
Entre a fraude, a burocracia, e a fé, oremos irmãos. O que fazer para adivinhar quando será concluída essa obra? Nas caatingas do interior o jabuti ainda transporta operários para o batente. E só quem pode responder com fineza e exata precisão é o espírito iluminado de um Padre Francisco José Correia de Albuquerque ou o do próprio Padre Cícero do Juazeiro. O nome dessa vala pé-frio, pelo jeito, vai perdendo a denominação inicial e passa ser — isenta de qualquer demagogia — O CANAL DO PROFETA.