OS ARUBU COMEU Clerisvaldo B. Chagas, 6 de abril de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.505   Seu Agenor era um ...

 

OS ARUBU COMEU

Clerisvaldo B. Chagas, 6 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.505


 

Seu Agenor era um verdadeiro cientista. Homem rude da nossa cidade, tomava conta do motor alemão da Empresa de Força e Luz que abastecia Santana do Ipanema com eletricidade. Era inventor e artesão, uma espécie de professor Pardal. Morou uma época em nossa Rua Antônio Tavares, vizinho de apenas duas casas. Sua esposa era chamada Mariquinha. O casal, quando do meu conhecimento, já era gente da terceira idade. Para mim, pessoas ótimas, mas eu não entendia o porquê de uma musiquinha que a meninada cantava na rua, entre tantas outras normais e chulas que se ouviam de adultos sem-vergonhas. Mas a melodia de Mariquinha, eu nunca soube do sentido e absolutamente nada. Cantava com os outros meninos como quem estava marchando:

 

Dona Mariquinha

Cadê Pompeu?

Pompeu foi pra rua

Os arubu comeu...

 

Quem era Pompeu? Apesar das cantigas acontecerem nas imediações da sua casa, Dona Mariquinha tinha duas filhas: Dedé e Lola. Dedé, solteira. Lola, casada com o músico chamado pelo povo de Zé Bicudo ou Zé de Lola. Salvo engano também era motorista de praça. Mas, nada de Pompeu! Quem diabo era Pompeu? Por que Pompeu fora para rua? Porque os urubus comeram Pompeu?

Quem for do meu tempo me explique direitinho esse negócio. Talvez o escritor Luiz Antônio, Capiá, saiba alguma coisa.

Lembro-me que a casa de Agenor, também foi habitada por Zé Bicudo e Lola, Dona Zora, Valmiro, atual prefeito de Poço das Trincheiras e outros bons vizinhos.

Voltando, porém, a Seu Agenor, um cientista que foi relevante para Santana do Ipanema, nunca vi uma homenagem à sua inteligência, nem sequer um beco. Diz-se no Sertão que “pão comido é pão esquecido”. Santana hoje, com energia elétrica de Paulo Afonso, prefere fazer de conta que Agenor não existiu. Para que serve um homem que garante energia para uma população durante quatro anos? Para que um cientista na cidade?

A história de Agenor para as novas gerações, nunca foram registradas em livros. Ela se mistura apenas com o enigma “sem importância” da melodia de dona Mariquinha:

 

Dona Mariquinha

Cadê Pompeu?...

 

INAUGURAÇÃO DO PRÉDIO NOVO DA EMPRESA DE FORÇA E LUZ, EM SANTANA DO IPANEMA, ENTRE 1961 E 1965. (FOTO: LIVRO 230/DOMÍNIO PÚBLICO/Acervo B. Chagas).

 

 

  RAINHA E PRINCESA Clerisvaldo B, Chagas, 5 de abril de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.504   Vamos esclarecer ...

 

RAINHA E PRINCESA

Clerisvaldo B, Chagas, 5 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.504

 

Vamos esclarecer geograficamente sobre Palmeira dos Índios e Santana do Ipanema. Uma se diz Princesa e a outra Rainha do Sertão, onde está o erro?

Cognomes de pessoas e lugares são coisas tão antigas que suas origens se perderam no tempo. Apelida-se tanto para denegrir quanto para elogiar. Temos uma cidade vizinha a nossa no sertão de Alagoas que todos os elementos masculinos têm apelidos, até o prefeito. Temos ainda no estado vário cognomes e citamos como exemplo: “Maceió, Cidade Sorriso”. Maceió, Paraíso das Águas” e assim por diante. E quando se trata de Palmeira dos Índios, a tradição fala: “Palmeira, a Princesa do Sertão” e Santana do Ipanema, “A Rainha do Sertão”. Falaríamos dessa maneira uma princesa e uma rainha?

Vejamos sobre Santana do Ipanema. Foi cognominada primeiro “Terra dos carros de boi. Em seguida, “Rainha do Sertão” e agora “Capital do Sertão”. Todos justificados: o carro de boi nunca deixou de existir em grande quantidade. Rainha, pela beleza, principalmente nos dias atuais. E no caso da Capital, é por funcionar no sertão e alto sertão como a mais importante aglutinadora da área. Correta a sua posição que é no Médio Sertão Alagoano.

Vejamos agora Palmeira dos Índios: “Princesa do Sertão”. Princesa deve ter sido por sua merecida beleza. Sertão, creio basear-se ainda numa Geografia que não estava bem definida na época  do epíteto. Não existe demarcação de fronteira natural exata. Mas, em nosso estado, como dizia o professor Ivan Fernandes Lima com sua respeitada Geografia de Alagoas (1965) o Sertão alagoano – para quem trafega pela BR-316, vindo de Maceió para o extremo Oeste – a grosso modo se inicia no rio Traipu. Portanto, Palmeira dos Índios é agreste bem como Estrela de Alagoas, sua vizinha, que está situada quase no limiar da fronteira, o que eu não diria sobre Minador do Negrão que tem características totais do semiárido.

Visto o que foi apresentado acima, seria correto: Palmeira dos Índios, a “Princesa do Agreste”. Aliás, a segunda cidade em importância nessa faixa classificatória, perdendo apenas para Arapiraca, segunda capital de Alagoas com apelido ou sem apelido.  Caso você venha de Maceió para o extremo Oeste via Arapiraca, a primeira cidade sertaneja será Jaramataia, pertinho do limiar do agreste.

Esclarecida a dúvida, cada um coloca o cognome que quiser, tendo um respaldo seguro, melhor ainda.

“Princesa do Agreste”, “Rainha do Sertão”, duas tradicionais e gigantes cidades que honram e orgulham nossa gente.

TERRAS DE JARAMATAIA VISTAS DA AL-220. BARREIRO EM CASA DE FAZENDA. AO FUNDO, SILHUETA DO SERROTE DO JAPÃO (FOTO: ÂNGELO RODRIGUES).

  PADRE CIRILO, MAJOR E SACRISTÃO Clerisvaldo B. Chagas, 2 de abril de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.503   E...

 

PADRE CIRILO, MAJOR E SACRISTÃO

Clerisvaldo B. Chagas, 2 de abril de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.503

 

Em Santana do Ipanema, após as procissões de Semana Santa, as imagens que arrastavam multidões pelas ruas e avenidas, eram retiradas de cena e guardadas superficialmente no Salão Paroquial. Ali no salão contíguo à Matriz, ficavam por vários dias até que eram levadas para lugares definitivos. O preto velho, vulgo Major, maior sineiro de todos os tempos da Matriz de Senhora Santana, tomava conta das imagens, pois também era uma das pessoas zeladoras da igreja. O sacristão Jaime, por ser de baixa estatura, também era chamado de Jaiminho, ajudava no recolhimento das imagens junto ao Major. Aliás, o sacristão Jaime preenchia toda a trajetória do padre Luís Cirilo Silva. Quando o padre e o sacristão chegavam ao povoado Pedrão, em Olho d’Água das Flores, para celebrações de missa, casamentos e batizados, lá estava eu na casa dos meus tios Manoel Anastácio e Delídia, para hospedá-los e providenciar todas as mordomias possíveis. Ambos chegavam a cavalo e eu ficava boquiaberto vendo ali a quatro léguas (24 Km) da minha cidade, o nosso pároco e o sacristão.

Mas retornando à Matriz, quando a igreja estava vazia ou quase, porém aberta, eu aproveitava para percorrê-la com a complacência do bondoso zelador Major. Fazia uma incursão pelo salão paroquial, entrando por trás ou pela porta lateral que se comunicava com a nave. Jaime era mais ríspido, todavia, o Major – em avançada idade, já – era doce, calado, tolerante e paciente com as crianças como eu. Nunca esqueci do impacto dentro do silencioso salão quando me deparei com a imagem do Senhor Morto e Nossa Senhora, ainda no andor. Pareciam vivos e, como foi uma visão inesperada, senti todo o peso da surpresa e uma atmosfera espiritual muito forte, tanto que abandonei o salão imediatamente.

E é assim que nesse tempo de pandemia sem sino, sem matraca, com a saudade do padre Cirilo, do sacristão Jaime e do sineiro Major, vamos recordando momentos felizes do livro dos tempos no meu sertão nordestino na religiosidade da minha querida Santana do Ipanema.

A propósito, o padre Luís Cirilo era natural da serra da Mandioca, município de Palmeira dos Índios, ainda de descendência holandesa. O Major, era filho do povoado quilombola Tapera do Jorge (Fui saber depois de adulto), município de Poço das Trincheiras.

Reviver é viver. Hoje é Sexta-Feira Santa. Silenciosa Sexta-Feira Santa!...

CENTRO COMERCIAL DE SANTANA DO IPANEMA, VISTO DA IGREJA MATRIZ. (FOTO: ACERVO B. CHAGAS).