O BAR DA CÍCERA
(Clerisvaldo B. Chagas. 6.7.2010)
Em nossas brincadeiras em Santana do Ipanema, tínhamos os nossos lugares prediletos. O bar do Erasmo, no início da Rua São Pedro, era um deles. Os frequentadores dividiam-se entre profissionais autônimos e funcionários do governo. Cerveja sempre gelada, mas o tira-gosto vinha das casas de alguns desses frequentadores que moravam próximos. O Erasmo colocava bastante pimenta e poucos provavam dos pratos que chegavam. Lembro de pessoas interessantes que buscavam aquele bar como os professores Marques (Filosofia), Eli (Matemática) e José Maria (História). Entretanto, o nosso refúgio predileto era o bar do Biu, à Rua Delmiro Gouveia. Depois o Benedito Pacífico ampliou o estabelecimento, mudando de categoria com o sugestivo título: “Biu’s Bar e Restaurante”. Ali frequentamos por mais de vinte anos porque o Biu atendia com gentileza, era um local aconchegante e tranquilo. Nas paredes havia quadros com paisagens de países estrangeiros, principalmente os de quatro estações. Ao fundo, o belíssimo quadro panorâmico natural do rio Ipanema. Durante as cheias, águas por cima das pedras do poço das Mulheres. Na estiagem, o bucólico cenário típico nordestino. Areia, pedras e mato. Um jumento pastando, uma vaca amarrada, um menino caçando passarinho. Nada pagava o cenário tristonho do rio. Foi dali do Biu’s Bar e Restaurante que partiu a primeira excursão a pé até a foz do Ipanema. Com a falta do Benedito, o seu filho Jairo assumiu definitivamente o negócio que hoje funciona como bar e salão de festa, muito solicitado, por sinal.
Certo dia, porém, eu e o Zé Maria, resolvemos girar por outros lugares de Santana e fomos parar na Rua São Pedro. O ponto escolhido foi a bodega da Cícera que também funcionava como bar. Pois bem, quando chegamos por ali, ouvimos logo a música “Feiticeira” que estava fazendo sucesso. Pedimos cerveja, puxamos conversa vendo a satisfação da dona com a nossa presença. O amigo Zé Maria foi logo dizendo que a música era muito bonita. Com isso, a Cícera encheu-se de satisfação e esqueceu o CD que rodou até ninguém não mais aguentar. Pagamos a conta e fomos embora com a cabeça cheia de cerveja e os ouvidos zoando com a “Feiticeira”. Em outros lugares comentamos que o bar da Cícera só tocava aquela música, por isso não iríamos mais ali. Ora, ninguém pode dizer daquela bebida não beberei. Uns quinze ou vinte depois retornamos, sem sentir, à mesma bodega. A Cícera aproveitou à hora, colocou os cotovelos no balcão, segurou o queixo e indagou contundente: ”Zé Maria, me diga uma coisa. É verdade que você e Clerisvaldo andaram dizendo por aí que meu bar só tocava “Feiticeira”? Confesso que na hora não encontrei saída. Mas o professor Zé Maria Amorim, improvisou bonito igual ao Nêgo Zé Lima. Disse bem sério diante do rosto interrogador: “É verdade, Cícera, a gente comentou mesmo, mas se você não colocar agora a música “Feiticeira”, a gente vai embora nesse momento e nunca mais vem aqui”. A mulher abriu-se num sorriso largo, e haja cerveja com tira-gosto de “Feiticeira” até umas horas. Depois dessa, cabra velho, não me lembro de ter posto os pés novamente no BAR DA CÍCERA.
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