FIM DE SEMANA Clerisvaldo B. Chagas, 18 de novembro de 2011. O Sol quer se esconder por trás da lagoa Mundaú. A Natureza vai retirando as ...

FIM DE SEMANA

FIM DE SEMANA
Clerisvaldo B. Chagas, 18 de novembro de 2011.

O Sol quer se esconder por trás da lagoa Mundaú. A Natureza vai retirando as brancas nuvens, deixando um esplendor prateado a ofuscar os transeuntes que marcham para o oeste, na “Cidade Sorriso”. O forte azul do centro bebe o desbotado da periferia celeste. Balançam-se os coqueirais gigantes e românticos na paisagem vespertina. Farfalham as longas folhas num acalanto sereno, saudoso e murmurante para as bandas do mar de Maceió. Nos quintais estreitos, nos sítios urbanizados, nos jardins enriquecidos, reduzidas aves canoras acompanham a chegada do crepúsculo, procurando os ninhos. Chega pelas sombras das calçadas à serena brisa navegando pelos becos, entrando nos corredores, penetrando nas janelas solitárias dos apartamentos. As águas quase adormecidas peitam levemente o baixo ventre do cais. Vergam-se caniços na restinga comprida. Folhas secas brincam no ar como se fossem algodão seda das terras sertanejas. E longe, bem longe... Nas alvas areias da praia, morena de vestido amarelo parece trocar beijos com a espuma que lhe envolve os pés.
Movem-se apressados veículos modernos. Há pressa, pela pressa fugidia da tardinha. Roncos de caminhões fazem mossas na delicadeza feminina do turno. Motos vadias procuram quebrar a maciez do tempo no asfalto quente. E o vento fininho agita com gentileza o pano branco da tapioca, do bolo de milho, da cocada dos tabuleiros à sombra das avenidas. O boêmio à moda antiga escora-se no poste, olhar esconso nas bundas grandes que trafegam sob saias coloridas. Sobe fumaça de chaminé estreita. Aroma deixam as padarias em busca das narinas dos transeuntes. A aproximação da noite procura acalmar o trânsito de vidros foscos. No meio do progresso razoável, um homem conduz sua carroça de burro, onde ele mesmo é burro, onde ele mesmo é o burro. Lá dentro vai um bêbado, talvez amigo do dono do burro, que não sabe que é burro. Pelos muros baixos das casas, jorram mangueiras nas plantas de luxo, nas pedrinhas redondas, nas terras pretas vindas do âmago das grotas. A coroa assanhada puxa o cachorro na rua; um padre passa a passos largos e um tipo importante acerta a gravatá, entrando no veículo importado.
Estranho carro estacionou no meio-fio. Uma belíssima dama saiu de trás, dando a impressão que seria uma espécie de noiva, tal à semelhança das suas vestes. Andou alguns metros pelo passeio sombreado como se deslizasse, irradiando simpatia. Quem viu, encheu-se de felicidades. E àquele vulto tão elegante e prateado, de repente sumiu como uma miragem. O rapaz do poste riu e disse como se estivesse falando para todos: “Era a poesia em sua folga de FIM DE SEMANA”.. 

 CANGAÇO E VOLANTES Entrar na catingueira Clerisvaldo B. Chagas, 17 de novembro de 2011 Pela fama do cangaço que escorria pelos jornais da...

ENTRAR NA CATINGUEIRA

 CANGAÇO E VOLANTES
Entrar na catingueira
Clerisvaldo B. Chagas, 17 de novembro de 2011

Pela fama do cangaço que escorria pelos jornais da época e pela boca do povo, foi surgindo o mito Lampião. Só ultimamente os pesquisadores começaram a valorizar as ações dos verdadeiros heróis esquecidos das caatingas. Homens brutos como os cangaceiros, conhecedores da geografia, da fauna e da flora regional. Muitos ganhavam pouco e passavam meses para receber o soldo; compravam seus próprios uniformes e amedrontavam tanto quanto os bandidos. Enfrentando as adversidades da natureza e sociais, esses perseguidores de cangaceiros, muitas vezes passavam semanas dentro do mato, sujeito às cobras, às formigas, às onças, lutando contra sede, fome e emboscadas que ceifaram a vida de tantos defensores da sociedade. Antes havia apenas poucos soldados nos destacamentos de algumas cidades interioranas. Depois surgiram as chamadas “forças volantes” com a exclusividade de combater o cangaço. Várias forças volantes foram criadas nas áreas de atuações de cangaceiros como Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba, Alagoas, Bahia, Sergipe e Pernambuco. Inúmeros comandantes dessas forças ficaram famosos e somente nos últimos anos, exaltados por escritores, talvez cansados de apresentarem somente Lampião.
Brilharam na campanha muitos guerreiros do governo até mais valentes do que Virgolino e por ele mesmo, admirados e respeitados. É o caso de homens da estirpe de um Manoel Neto, de um José Rufino, dos irmãos Flor e outros dignos no Sertão do título de “Homem Macho”. As volantes também tinham momentos de felicidades, tristezas e situações inusitadas. Certa feita, ocasião de seca e fome mexia com os nervos das tropas do tenente João Bezerra da Silva. Viajando a pé, em coluna, Bezerra foi atraído por uma discussão travada entre dois volantes. “Filho de uma puta para lá, filho de uma égua para cá; sustente o que disse!” e o apelo imediato às armas. O tenente ordenou a entrega dos fuzis, pelos dois valentões. Em seguida, sem pronunciar uma só palavra, pegou o facão, entrou no mato e saiu com dois bons cacetes de catingueira, arbusto Família: Leguminosae (Caesalpinia pyramidalis). Entregou a cada soldado briguento, um desses pedaços de pau e disse: “Pronto, podem se matarem! Menos com fuzil”. Como diria a minha avó: foi o santo remédio! Os dois enjoaram de vez a arenga besta que poderia terminar em baixa. A partir daquele momento, quando dois desinformados queriam arengar, os mais experientes diziam: “Tão esquecidos dos dois cacetes seus fios da peste! Querem entrar na catingueira?”
 Não sei dizer os nomes dos soldados do tenente João Bezerra. Talvez um se chamasse Adair. O outro pode ter sido Lupi. Mas que momento tão bom para ENTRAR NA CATINGUEIRA!