terça-feira, 6 de novembro de 2012

CALANGO MATOU UM BOI



CALANGO MATOU UM BOI
Clerisvaldo B. Chagas, 6 de novembro de 2012.
Crônica Nº 9001

Lá ia eu pelos aceiros da fazenda, puxando fio de ouro, tirando melãozinho das cercas, fazendo flautas de talos de abóboras. Lá ia eu caçando rolinhas, sentindo o cheiro do gado, descascando laranjas com as unhas. Lá ia eu vendo flutuando o brilhante algodão, caminhando pela poeira das estradas, camisa aberta ao peito, ritmando com os indicadores no peito:

“Calango matou um boi
Retaiou botou na teia
Lagartixa foi bulir
Calango largou-lhe a peia
Lagartixa foi dar parte
Calango foi pra cadeia...”

O pensamento fugaz desaparece, mas não pretende fugir do Sertão, mesmo no meio desse trânsito maluco da capital, do ruge-ruge urbano que não consegue esconder o romper de lembranças rurais.
E como apreciadores do inusitado, do incomum, vamos também registrando cenas de fotógrafos de artes. Pena ter deixado a máquina numa gaveta qualquer, pois o homem de barba longa está esperando alguma coisa na esquina. Ali, bem pertinho, sob um antigo poste de ferro de lampião de gás, o lixo amontoado estar sendo movido por um velho anão que jamais para o seu serviço. Usa um pau curto e, seu bigode parece rir do que faz. Adiante, somente a cabeça do moreno por trás do carrinho de mão, fazendo suas necessidades em plena avenida. Ao lado, no automóvel, uma madama se ajeita no espelho do carro como se não houvesse ninguém em seu redor. Um motorista grita a palavra “barbeira”, colocando a cabeça para fora do veículo. A mulher ofendida se volta e espeta o dedo maior de todos em direção ao gritador. Volto a pensar no sertãozinho de todos os dias, no sol quente de rachar do interior. Maceió diz arreda, que ninguém aguenta. Fico preocupado em escrever a crônica do dia seis e de repente desperto nos seus braços. Sei não camarada, deixe-me viver mais um pouco entre o sonho e a realidade. Droga!

“Calango matou um boi
Retaiou botou na teia
Lagartixa foi bulir
Calango largou-lhe a peia...

Ah! Pise fundo motorista, CALANGO ACABA DE MATAR UM BOI...




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domingo, 4 de novembro de 2012

A CRÔNICA DA CRÔNICA



A CRÔNICA DA CRÔNICA
Clerisvaldo B. Chagas, 5  de novembro de 2012.
Crônica Nº 900

Clerisvaldo e lançamento do livro "Ipanema um rio macho". Foto: (Maltanet).
Atingimos, finalmente, o início da reta final de mil trabalhos. Nunca pensei em ser cronista. Esse mister surgiu da necessidade de preencher o vazio entre uma publicação de livro e outra. Crônica registra a simplicidade do dia a dia. Os gritos de um vendedor de rua; a conversa do povo no mercado, na praia; Uma batida de automóvel... É o retrato fiel do presente. Mas o que faz o cronista escrever todos os dias, não deixar faltar nunca às palavras quentinhas da manhã? Doente, lacrimoso, desiludido, sem inspiração, o dono dos textos espreme a cabeça e as crônicas saem. Inspirado, melhor, as frases aceleram em cachoeira numa velocidade incrível. Mas, quantas noites em claro para que o leitor anônimo, fiel e que não interage, tenha o seu pão seguro da manhã. O pão da alma, o pão que alimenta na prosa e na poesia, ajudando a viver. É de se perguntar, entretanto, numa parada reflexiva, se vale à pena tanto esforço para o leitor sem nome. Para que continuar uma caminhada de mais cem crônicas para completar as mil? Uma necessidade orgânica? Uma vaidade do autor? Missão divina ou coisa sem nexo que é melhor parar. Qual o prêmio em completar mil crônicas publicadas na Internet?
Temos revirado o planeta pelo avesso, falando sobre tudo. Mas têm horas que esse tudo aborrece. E mesmo aborrecido, temos que revirar os “cumbucos de sal”, como se diz por aqui, para cumprir um compromisso pessoal de escrever. Ah, meu Deus! E os meus romances onde ficam? “Negros em Santana” foi aparecer. “Lampião em Alagoas” foi aparecer. Lá ficaram na fila “Deuses de Mandacaru”, “Fazenda Lajeado” (romances) “Colibris do Camoxinga”, “O Boi a Bota e a Batina” e “Cem Milagres do Padre Cícero”. Ainda bem que estamos apenas aguardando da gráfica, os dois primeiros, para continuarmos essa sequência. Mas, e as crônicas, como ficam? Será que atingiremos as mil? E depois, fazer o quê? Selecionar, publicar? Não seria melhor encerramos logo nas 900 e retirar o blog? Enquanto isso vamos viajar e respirar fundo para decidir se amanhã surge mais uma história retirada de um porvir cibernético ou de um colchão “engembrado” de um hotel.
Novecentas crônicas, de segunda à sexta, sem parar, puxam para quatro anos de atividade digitando para o mundo. O tapete vermelho das próximas cem vai dizer sobre a possibilidade ou não de estiramento. Cinco meses estão aí na frente aguardando a resposta do autor. Pelo menos hoje, dia 5, sai A CRÔNICA DA CRÔNICA.

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