terça-feira, 19 de janeiro de 2021

 

AS CARÇAS DO CARCELEIRO

Clerisvaldo B. Chagas, 20 de janeiro de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.455


 

No momento em que o estado de Alagoas estar abrindo concursos para diversos seguimentos sociais, chegou à lembrança de um acontecimento humorístico já apresentado aqui faz bastante tempo. Omitiremos desta feita o nome do protagonista, para evitar melindres desnecessários.

O penúltimo dos grandes alfaiates de Santana do Ipanema, também seresteiro e pescador ocasional, trabalhava em sua residência à Rua Nilo Peçanha que por coincidência também pertencera a outro alfaiate e pescador conhecido como Seu Quinca. Porta de ferro aberta direta para a rua, grande balcão de trabalho, manequim olhando para fora e fita métrica no cabide do pescoço, nosso amigo alinhavava de pernas cruzadas. Vez em quando chegava um cliente para encomendar uma roupa ou um conhecido para puxar conversa.

Fo assim que em manhã de trabalho puxado chegou um amigo auxiliar de mecânico, fala mansa, estudo a desejar e a conversa com “Seu Juca” teve início. O visitante sentou-se num banco de tiras de couro e abriu o livro da sua vida. Juca de vez quando estimulava a palestra que girava em torno de trabalho, emprego, remuneração e coisas assim, até que foi tocado o assunto novidade de Alagoas: o concurso público cujo edital já fora publicado. O Alfaiate indagou se o amigo já estava sabendo e recebeu resposta inusitada.

As pessoas de pouca instrução costumam chamar “carça”, no lugar de calça: “Nem deu tempo de fulano vestir as carça”.

Pois bem, voltemos ao diálogo. Esperançoso com as boas novas do estado, o auxiliar de mecânico disse: “Eu mesmo vou fazer o concurso para carceleiro” (carcereiro). Juquinha fez de conta que tinha ouvido mal: “Concurso para quê?”. “Para carceleiro”, repetiu o mecânico. Juca deixou escapar uma risada gostosa e irônica e disse: Tá doido, rapaz! E você vai fazer “carça” na penitenciária? Diante da sarcástica advertência, o mecânico tentou remendar as “carça” perante o alfaiate... Gaguejou aqui, acolá... E zás! Abandonou ligeirinho o banco de tiras e mergulhou na Rua Antônio Tavares, onde morava, levando a vergonha na cabeça, na camisa e nas “carças dos carceleiros”.


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COMPARANDO

Clerisvaldo B. Chagas, 19 de janeiro de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.454

 

 

      Sempre lembrada pelos mais velhos e repetidas aos mais novos, a maior cheia do rio Ipanema ficou imortalizada em 1941. Como marco, as águas chegaram até os pés do prédio da Perfuratriz no final da Rua São Paulo. Esse prédio estava localizado onde é atualmente, mais ou menos a sede da Associação de Moradores da Rua da Praia, defronte a sua a igreja. O prédio da Perfuratriz, muito bonito, tinha forma de cubo, rodeado de janelas. Diante dele, um caminho ladeado de aveloz iniciava ali onde hoje é a Rua da Praia e seguia até o último beco da Rua São Pedro, atualmente extinto por moradores. Esse caminho de cerca de 400 metros, parecia um túnel, não deixava penetrar a luz do Sol por causo das cercas altas do aveloz.  Aponta-se como a segunda cheia do rio Ipanema, a de 1960. Essa nós presenciamos de perto.

     De acordo com o cidadão de mais de 80 anos, Manoel Fontes, o senhor Pedro Agra, falava que 100 anos antes da cheia de 1941, isto é, em 1841, houve cheia semelhante.

Na cheia de 1941, não havia ponte nem no rio Ipanema, nem no riacho Camoxinga. Na cheia de 1960 não havia construções no leito do riacho e nem no lastro do rio Ipanema.

Na última cheia, a de 2020, pode até ter sido a maior, mas vamos levar em conta o seguinte, no rio Ipanema: havia uma pequena aglomeração de casas, logo após a barragem. Por trás da Rua Delmiro Gouveia, uma rua completa dentro do rio Ipanema, não no centro, mas dentro do rio.  Mais abaixo, uma oficina debaixo da ponte General Batista Tubino. Casas comerciais dentro do rio, trepadas por colunas. Rua da Praia construída no limiar do Panema. Por onde você acha que o rio iria passar?

No riacho Camoxinga, construções dentro do riacho a partir da Ponte do Colégio Estadual. Antes, casarios margeando o riacho com seus quintais. Garagem construída na foz do riacho Camoxinga. Além da sua cheia, o riacho represou com o rio Ipanema, por onde você acha que riacho iria passar?

     Essas obstruções vêm sendo construídas desde os tempos da gestão de Genival Tenório. Um dos seus auxiliares na época, diante da minha crítica, chegou a me oferecer um lote no rio Ipanema, na Ponte do Padre. Agradeci e saí enojado. Daí para cá, ninguém mais segurou as construções absurdas nos leitos dos riachos Salgadinho, Camoxinga e rio Ipanema. Inclusive, o represamento do valente riacho Salgadinho também foi responsável pela inundação da parte baixa dos Bairros Domingos Acácio e Floresta.

     Será que depois do susto todos voltaram para os mesmos lugares? O rio continua vivo.

 CHEIA DO RIO IPANEMA, MARÇO 2020 (FOTO: ÂNGELO RODRIGUES/ACERVO B. CHAGAS).

 

 

 


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