RAUL, SATUBA
E ROSINA
Clerisvaldo
B. Chagas, 30 de agosto de 2017
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica
1.726
RIO IPANEMA. Foto: (Clerisvaldo B. Chagas). |
“Sou
fervoroso adepto da vida na roça. Desde cedo, corpo e alma dediquei-me à
plantação, a criação e aos livros. Viver, como ora vivo, em contato direto com
a Natureza, ouvindo canto de pássaros livres da floresta, à noite, o sussurro
do Ipanema no declínio poético de suas cheias, aspirando o cheiro que se exala
da floração dos arbustos que cercam a minha casa e bordam, ainda, as margens do
rio, tudo isso, francamente, me parece o sopro de Deus-Vivo embalando a minha
própria existência, e o mundo santo da espiritualidade. Sou, portanto, um homem
feliz”.
Certa
vez encontrei esse personagem no livro de Raul Pereira Monteiro, “Espinhos na
Estrada”, publicado em 1999. Referindo-se aos seus costumes de criança, Raul
fala das caminhadas que fazia para vê as borboletas esvoaçantes da periferia de
Santana do Ipanema. Curioso em vista de alguns boatos, lá no rio, no lugar
Volta do Ipanema, resolve desvendar o mistério de um ser solitário chamado
Satuba. Descobrindo que Satuba não era assustador como imaginava, mas sim, um
doce roceiro intelectualizado e poético que lhe relata o motivo de viver
solteirão. Fala do único amor da sua vida com a desastrada Rosina, rompido por
ele mesmo. Raul conversa bastante com Satuba.
Adepto
também das caminhadas no entorno da minha cidade, fui à Volta lembrar o Satuba
apaixonado de cerca de meio século atrás. Nada encontrei que tivesse a menor
relacionamento com o roceiro. Nada de Raul para apontar o dedo para algum sítio
daqueles e afirmar: “Era ali a morada do romântico”. E assim os sertões estão
cheios de histórias esquisitas, algumas capturadas por escritores tão sensíveis
quanto os atores naturais encontrados nas quebradas.
A simplicidade da história bem conduzida
faz o pequeno ficar grande na Literatura. Vejamos o desfecho do caso, novamente
passando à palavra ao autor:
“No
caminho de casa, eu disse de mim para mim, baixinho, mentalmente mesmo, como se
temesse fosse o meu pensamento interceptado por alguma viva alma. ‘Fique
tranquilo, Satuba’. Eu também sou um covarde – não tive a coragem de lhe
transmitir esta outra mensagem, tão sincera, do meu espírito. Você não é como
disse, privilegiado nem homem feliz, sob nenhum aspecto. Você é, isso sim, um
triste apaixonado”.
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