quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A REVOLTA DA CACHAÇA

A REVOLTA DA CACHAÇA
(Clerisvaldo B. Chagas, 20 de janeiro de 2011).

       Não sei quantas pessoas bebem no Brasil, nem quero saber, mas que a coisa é séria é. A onda avassaladora não respeita sexo nem idade e não existe fabricante nesse país que consiga encalhar mercadorias. Quanto mais se fabrica mais se bebe. Já contei a história do vereador que em outra época nos convidou a visitar o seu engenho, em Boca da Mata, cidade de Alagoas. Ao chegarmos à casa do homem, ele nos levou para um amplo galpão atrás de casa, colocou aguardente numa vasilha e limão aberto num pilão manual, colocou açúcar, pegou a mão de pilão, começou a moer e nos deu a provar aquela verdadeira delícia. Eu, sendo sertanejo e esperando ver muitas máquinas trabalhando naquele lugar da Zona da Mata, fui surpreendido quando o vereador disse que seu engenho era aquele artefato de fazer caipirinha.
       Como deve acontecer em todas as cidades do Brasil, os viciados aguardam o amanhecer nas imediações das bodegas e bares. Um desses pontos “alugados” é a Praça Frei Damião, em Santana do Ipanema. As quatro da matina já tem gente aguardando companhia pelas imediações. Olho comprido no barzinho que abre cedo, lá na frente. São os chamados “pés na cova” que desafiam o golpe final da “moça branca”. Tristes cenas que bem caracterizam a fraqueza humana.
       Na costa da África, a aguardente era chamada de “Jeribita”, cujo sabor agradava bastante o paladar dos nativos. A principal região produtora de cachaça na América era o Rio de Janeiro, mas havia fabrico espalhado por vários lugares, chamados engenhocas. Essa cachaça, juntamente com o tabaco produzido principalmente no recôncavo baiano, Pernambuco, Maranhão e no próprio Rio, serviam de moeda de troca para o comércio escravagista com a África. A coroa portuguesa, para proteger seus destilados vinícolas, proibiu o fabrico da aguardente no Brasil em 1647. Mesmo assim a aguardente de cana continuou sendo produzida, principalmente depois da expulsão dos holandeses, 1654. O jeitinho brasileiro continuava até que em 1659, nova lei de Portugal manda destruir todos os alambiques. O Rio tentou uma saída, deixando as engenhocas em paz, contanto que se pagasse uma alta taxa para a administração da colônia. Foi aí quando explodiu o que ficou registrado como a Revolta da Cachaça.
       A sociedade brasileira pouco tem feito por essas criaturas que tanto precisam de ajuda. Contudo, piadas sobre português, papagaio e bêbados, são produzidas com as mesmas velocidades dos alambiques. No Brasil também já houve inúmeros levantes com as mais diferentes denominações. Com toda a certeza, se fossem contados esses episódios com a “Jeribita” brasileira aos “pés na cova” da Praça Frei Damião, haveria um preito significativo aos que fizeram a REVOLTA DA CACHAÇA.


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FACHEIROS E MANDACARUS

FACHEIROS E MANDACARUS
(Clerisvaldo B. Chagas, 19 de janeiro de 2011)

       Prosseguindo a tradição brasileira de correr atrás de prejuízos, é anunciado o resgate aos nossos cientistas. Quando partimos para a industrialização do país, nós o fizemos com atraso de cem anos. O pioneirismo da Inglaterra foi acompanhado pela França, Alemanha, Bélgica, Japão e Estados Unidos. Com a mentalidade voltada unicamente para a Agricultura, tendo como expoentes primeiro à cana-de-açúcar e depois o café, entramos para a corrida industrial com esse espaço todo no meio, daí ter sido chamada “industrialização tardia”. Enquanto essas nações enriqueciam rapidamente e nós comprávamos a elas desde navalha de barbear e talheres a máquinas sofisticadas como descaroçador de algodão, nossas indústrias davam os primeiros passos através do ramo de alimentos. Entre outros fatores, inclusive o de exploração das Américas, foram usadas as cabeças dos seus inventores que continuam sendo estimulados para descoberta de novas tecnologias.
       Quando estudante ginasiano, discutíamos de tudo na “Esquina do Pecado”. Eu ficava triste quando a pauta partia para o cientista brasileiro. Sentíamos a falta de estrutura e o descaso com os nossos jovens inventores que deixavam o país, atraídos pelos convites de outras nações, como os Estados Unidos, por exemplo, que formaram o “Vale do Silício”. Diziam que o Brasil não podia pagar bem. Mas afloravam informações de que vários cientistas brasileiros queriam apenas condições de trabalho e ninguém apertava por dinheiro. Novamente perdíamos as oportunidades históricas de nos igualarmos as outras nações poderosas. Continuamos até hoje pagando “royalties” dos inventos alheios, pela nossa ignorância progressista. É verdade que já temos um razoável parque tecnológico, formando um arquipélago, principalmente sob o comando de universidades. Mas não basta. Continuamos a indolência Império/República Velha puxada por carros de boi ou automóveis sem estradas.
       Quando o insípido político Aloizio Mercadante disse que o Brasil iria tentar repatriar os nossos cientistas, marca um belo gol, sem dúvida alguma, porém, com outro atraso de cem anos, como o da industrialização brasileira: um “Repatriar Tardio”. Mercadante, ex-vice-presidente do PT, candidato derrotado ao governo de São Paulo, ganhou como consolo o Ministério de Ciência e Tecnologia. Para atrair nossos cientistas, esperamos que ele ponha mel nas iscas, sal no assunto, reais na capanga e condições no trabalho. Foi assim que fizeram e continuam fazendo, Coreia do Sul, Índia, China... Vietnã.
       Em Santana do Ipanema, década de 1950, um cidadão chamado Agenor, cuidava do motor da Companhia Força e Luz que abastecia a cidade com energia elétrica. Todos o chamavam cientista, devido aos seus inventos, pesquisas e trabalho constante, individualmente. Era pobre, morreu pobre, sem nenhum tipo de ajuda que o levasse a desenvolver grandes projetos para o país. Um professor Pardal perdido nas caatingas nordestinas. Talvez agora Mercadante leia e descubra nessa crônica o Agenor, representante falecido de dezenas de outros companheiros de invento que se perderam entre FACHEIROS E MANDACARUS.



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