OS VÂNDALOS Clerisvaldo B. Chagas, 10 de outubro de 2017 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica 1.755   Foto de Maur...

OS VÂNDALOS


OS VÂNDALOS

Clerisvaldo B. Chagas, 10 de outubro de 2017

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica 1.755

 
Foto de Mauro Wedekin

Vândalos era um povo germânico que invadiu e devastou a antiga Hispânia e o Norte da África, onde fundou um reino. De certo tempo para cá, a palavra vândalo passou a ser utilizada no Brasil, como indivíduo destruidor dos bens públicos. Chamávamos por aqui a esse tipo de gente de maloqueiros, desocupados, vadios. Eles, os vândalos, quebram estátuas, bancos de praças, chafarizes, picham o patrimônio histórico e até incendeiam ônibus lotados de passageiros. Como não encontraram um nome mais forte para o sem-vergonha, ficou em vândalo, mesmo.

Semana passada, três adolescentes numa moto agiram pela madrugada na cidade de Porto Real de Colégio. Colocaram abaixo uma estátua de ferro e concreto em homenagem ao índio. Feito o serviço, partiram para a cidade sergipana de Propriá. Nessas alturas, chovem as opiniões domésticas sobre o vandalismo em cima de uma representação já estigmatizada. As destruições do patrimônio público acontecem nas cinco Grandes Regiões brasileiras, em algumas, é verdade, de forma mais intensa. Entre todas as causa das maldades está à básica falta de educação. Um povo educado não faz essas coisas diariamente por aí pelo simples prazer e ignorância dos danos.

Alcançamos ainda o tempo de vigias nos logradouros públicos. No interior sertanejo alagoano, não só em Santana do Ipanema, mas também em outras cidades, eles estavam ali noite e dia protegendo canteiros, bancos, estátuas e seus usuários. Recordamos, talvez do último deles, o soldado reformado Gonçalo. Uma doçura de pessoa que estava sempre no seu posto de trabalho e merecia a atenção e o respeito de todos. Até os comerciantes do entorno da Praça Manoel Rodrigues da Rocha (Praça da Matriz) cooperavam financeiramente com o ex-militar. Em Maceió não conhecemos monumentos que não tenham sido pichados, mutilados ou ambas as coisas. Mas se muita gente não enxerga o mal que está praticando, as autoridades tem obrigação de colocar vigias, como antes. Não estamos falando sobre a tal guarda municipal, polêmica e pior.

Semana passada, derrubaram o índio; qual será o alvo desta semana?

 

 

 

BANHO DE CUIA Clerisvaldo B. Chagas, 9 de outubro de 2017 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica 1.754 O regionalismo impera...

BANHO DE CUIA

BANHO DE CUIA
Clerisvaldo B. Chagas, 9 de outubro de 2017
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.754

O regionalismo impera em todos os países do mundo, pequenos ou grandes. Além dos cardápios específicos, reinam ainda palavras e frases antigas e modernas, notadas apenas quando chegam visitantes de outras regiões. O futebol é um esporte que apresenta muitos termos locais, regionais e nacionais, uma grande riqueza de palavreado do mundo da bola. Na minha região sertaneja, passar a bola entre as pernas do adversário é “passar por debaixo da saia”. Mandar a pelota por um lado do adversário e alcançá-la do outro é “arrodeio”. Demonstrar cansaço no jogo é “abrir o bico” e puxar a bola por cima da cabeça do oponente é chamada “banho de cuia”. A maior desmoralização de todas é levar um “banho de cuia”.
A meditação geográfica dos termos futebolísticos veio com o jogo Brasil X Bolívia, realizado na quinta-feira passada em La Paz. Os narradores falaram mais de mil vezes na altitude, causando até enjoo de tanta repetição. Mas é verdade que La Paz vive nas alturas. Está localizada exatamente a 3.660 de altitude, entre um vale profundo rodeado de altas montanhas. Apresenta-se como a terceira cidade mais populosa da Bolívia e abriga a sede do governo. Foi fundada em 1548. Seu clima é tropical de altitude e sua temperatura fica em torno de 8 graus. Muitas atrações culturais atraem turistas de todas as partes do mundo, tendo a sua altura na Cordilheira dos Andes como atração maior.
Visto isso, voltemos ao futebol da quinta-feira. Creio que nenhum brasileiro jamais viu o Brasil jogar daquele jeito em nenhum lugar da Terra. Foi uma maneira inédita, inovadora e atraente como se o Tite estivesse inventando a roda. Muito mais de que uma belíssima partida – embora sem gol – o Brasil participava na prática de uma teoria científica que valeu muito mais de que uma vitória. Contribuía com a Ciência diante de um mundo perplexo em observar aquilo pela primeira vez. E se era espetáculos de três jogadores brasileiros que os bolivianos aguardavam ansiosos, foram brindados com um time inteiro na maneira de jogar que eles e o mundo jamais viram naquela altitude. Entusiasmado também com o que testemunhei, volto ao meu Sertão com suas expressões arretadas: FOI UM VERDADEIRO BANHO DE CUIA.


OS CASARÕES DE SANTANA Clerisvaldo B. Chagas, 6 de outubro de 2017 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica 1.753 FOTO: (Domí...

OS CASARÕES DE SANTANA

OS CASARÕES DE SANTANA
Clerisvaldo B. Chagas, 6 de outubro de 2017
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.753

FOTO: (Domínio Público).
Houve um impacto entontecedor quando saiu à súbita notícia de iminente demolição dos grandes casarões de Santana do Ipanema. O chamado popularmente “prédio do meio da rua” e o “sobrado do meio rua”, estavam definitivamente na ideia fixa do, então, prefeito Ulisses Silva. Derrubá-los a cacete como se derruba um bode, estirá-los de cabeça para baixo e tirar o couro. Assim a cidade se dividiu entre saudosistas e futuristas em comentários em todos os pontos bem frequentados da urbe. A surpresa do redemoinho foi tanta que nem deu tempo de muito remoer. Aconteceu como a demolição do primeiro cemitério da cidade, pela noite e na base do cacete, às escondidas para que não houvesse nenhuma polêmica. Pelo menos o espetáculo dos casarões foi às claras com a populaça boquiaberta e tonta.
Os dois casarões haviam sido construídos nos tempos de vila no centro do amplo quadro comercial. A impressão que se tem é que todos os quadrantes do comércio já estavam preenchidos com prédios de negócios e residências, tendo ficado o enorme vazio no meio. Foi, então, que alguém muito poderoso conseguiu o espaço público para a construção dos dois enormes casarões repartidos para fins comerciais. O “prédio do meio da rua” abrigava farmácia, armazém de secos e molhados, lojas de tecidos, barbearia e outros ramos substituídos pelo tempo. O prefeito demolidor morava no único primeiro andar do prédio, um pequeno cômodo de esquina. O “sobrado do meio da rua” era muito mais elegante com cerca de três casas comerciais no térreo e um primeiro andar em salão único que ocupava toda a estrutura. Ali funcionaram os primeiros cinemas, teatros e o Tribunal do Júri, entre outras coisas.
Muito se poderia ainda dizer sobre os dois casarões, mas deixamos a cargo do “O Boi, a Bota e a Batina; História Completa de Santana do Ipanema”, inclusive, com o mapa de todas as casas comerciais de Santana, títulos de fachadas e proprietários: relíquia única para o santanense. Acompanhei a demolição e tenho detalhes no papel. Com a demolição do “prédio do meio da rua”, se foi o meu primeiro barbeiro, Nésio e sua máquina manual torturante.
Quem irá financiar O BOI, A BOTA E BATINA? O maior documentário jamais produzido no interior.