ERA ELE, JESUS
Clerisvaldo B. Chagas,
23 de agosto de 2021
Escritor Símbolo do
Sertão Alagoano
“Crônica”: – Conto: 2.575
Conduzia um cordeirinho doente na sela quando passei pela região do Gólgota. Já era tardinha e o tempo ficara negro como a noite. Ao avistar a silhueta de um crucificado no monte Calvário, dei rédeas soltas ao animal e para lá me dirigi. Diante do homem na cruz, percebendo que ele ainda não morrera fiquei contemplando por certo tempo, aquele rosto sofrido. Quem seria o crucificado? Em certo momento o cavalo espantou-se com o cheiro de um felino, jogou-me ao chão e disparou levando o cordeiro. Senti quebrar uma perna e me arrastei até aos pés da cruz, para tentar avistar o corcel do ponto mais alto. Não o avistei. Senti doer muito a perna. Imobilizado sem saber o que fazer, olhei para o alto. Uma gota de sangue e água caiu sobre minha testa. Senti esquentar o local e veio a vontade de ficar de pé. Levantei-me quase de repente sem mais nada sentir na perna. Coisas estranhas estavam acontecendo comigo.
O
cavalo chegou sem que eu percebesse, tão concentrado estava tentando decifrar o
momento. Roçando o focinho nas minhas costas, o animal avisava o seu retorno.
Estava sem o cordeirinho. Um guarda surgiu cambaleante. Parecia sonolento. Indaguei quem era o homem
da cruz. Ele apenas respondeu com ênfase: “Um homem injustamente condenado.
Ele, verdadeiramente, é o filho de Deus”.
Montei
e ouvi um balido. O cordeirinho estava se coçando na haste principal da cruz.
Coloquei-o na sela e me afastei devagar. Mais adiante, o cordeiro escapou da
sela e correu saltitante de volta ao Calvário. Demonstrava que ficara
totalmente sadio e não mais queria ser conduzido. Respeitei sua vontade. Voltei
a cavalgar. Mais adiante parei a cavalgadura e olhei para trás contemplando
longamente a silhueta do homem crucificado. Espontaneamente, um rio de lágrimas
inundou por muito tempo a minha face, enquanto meu coração repetia o tempo todo
o que afirmara o guarda romano: “Ele, verdadeiramente, é o filho de Deus”.
Prossegui
a jornada de volta a casa quando percebi alguma coisa me seguindo. Era um manto
arroxeado esvoaçante a cerca de 100 metros de altura. Eu parava, ele parava. Eu
prosseguia, ele prosseguia como a me proteger de longe contra todos os perigos
que surgissem. Voltei a chorar e dessa vez com muita emoção e afirmando
inúmeras vezes para mim mesmo: “Ele é verdadeiramente o filho de Deus. O
cordeiro ficara deitado aos pés da cruz... Do outro cordeiro.
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