O
QUANTO PODE UMA TROVOADA
Clerisvaldo
B. Chagas, 14 de fevereiro de 2024
Escritor
Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica:
3.014
A última chuvada em Santana do Ipanema, na
tardinha do domingo passado, foi rápida, muito forte, acompanhada de ventos,
relâmpagos e trovões. Na verdade, uma bela trovoada de natureza mansa. Apenas
muitos benefícios para este Sertão encantado, de meu Deus. Diz o homem rural:
enche a palma, revigora o pasto, nivela barreiros e açudes, reverdece o mundo,
traz fartura para o campo e dinheiro para o bolso. Mesmo assim, o tempo de
verão vai se disfarçando de outono quase todos os dias, quando o sertanejo diz
olhando para os céus manchados de cinzas fechadas: “tá bonito pra chover”.
Diferente do cinza que engana: “não é nada, é só carregação”.
Nos cercados, corre o cavalo saudando o tempo,
escaramuça a novilha, o boi cava o chão, o mandacaru, o alastrado, o xiquexique
escurecem o verde e botam flor. As montanhas largam o marrom e se veste de
bandeira nacional. A favela estica o galho de espinhos esbranquiçados, o teiú
estira-se no lajeiro e vai à caça de serpentes. Centenas e centenas de sapinhos
deixam os rios secos e formam exércitos a percorrerem a periferia, Nos ares,
gaviões, carcarás, sacodem as penas, procuram as folhagens, espreitam animais
ariscos. Batido na cancela, passa a morena faceira, o vaqueiro assoviador, o
dono gordo da fazenda.
É novembro, dezembro, janeiro, fevereiro...
Caatinga fechando, alegria na terra, fluir de vaquejadas, pega-de-boi no-mato.
Prova de macheza exposta, famas de bois ligeiros, cavalos encouraçados, gibões
anônimos nas quebradas silenciosas. Ouça o hino da seriema, da fogo-pagou, da
juriti... É a hora do café encorpado, do cuscuz fumegante, do queijo da hora,
dos afagos macios da cabocla com perfume de mato.
Como posso deixar
O meu Sertão
Pra morrer no concreto da cidade?
MOMENTO DO TEMPO NO SERTÃO (Foto: B. Chagas)
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