O CALANGO E O DOCE
Clerisvaldo B. Chagas, 15 de fevereiro de 2024
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3.015
Criativas e
sem sentidos eram muitas as modinhas inventadas no mundo rural do Sertão:
“Calango matou um boi
Retaiou botou na teia
Lagartixa foi bulir
Calango largou-lhe a peia
Lagartixa foi dar parte
Calango foi pra cadeia.
Quando a moça ia casar-se vinha do sítio rural para a igreja,
na cidade. Além da comitiva a cavalo, vinha por último um cidadão escanchado
numa égua conduzindo o baú de roupas da noiva. Era chamado de “calango”. Ao
passar o calango pela praça defronte à igreja, era alvo de engraxates e
desocupados que gritavam: Calango! Calango! E calango respondia às investidas, erguendo
o braço e estalando bananas e mais bananas para a turba. (Fonte: Alberto Nepomuceno Agra).
Quando
a comitiva retornava à casa da noiva, havia muito exibimento dos cavaleiros com
seus animais baixeiros em corridas pelas estradas poeirentas. Ao chegar perto
da casa da noiva, os mais afoitos corriam à frente, pegavam doce de coco na
casa da noiva e traziam para ela ainda no caminho. A noiva e o noivo, felizes
da vida, comiam o doce ali mesmo, cavalgando e metendo os dedos cheio de poeira
nas taças abarrotadas. Era uma tradição.
(Fonte: Escritor Oscar Silva).
A pressa dos cavaleiros que iam buscar o doce,
esquecia das colheres. Mesmo sem colher, o doce era doce. A figura do calango
desapareceu, mas o doce de coco ainda é encontrado aqui ou ali sem a frequência
do passado. Gostoso é. O “enjoativo” fica por conta de quem quer almoçar doce.
E assim, os registros vão sendo feitos em livros esporádicos e ganham vida na
boca dos mais velhos. Que bom, ouvir as narrativas da vovó, do vovô... E o
Sertão velho de meu Deus, vai moendo, nos mitos, nas lendas, nas verdades,
enriquecendo conhecimentos orais e literaturas curiosas que graças a elas
seguramos a lupa preciosa de quem quer aprender. Envelheça, se puder e, conte
seu mudo aos que virão.
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