quinta-feira, 31 de outubro de 2024

 

OS JACARÉS DE FERNÃO

Clerisvaldo B. Chagas, 1 DE novembro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.140



 

 Nunca tive aptidão para a Matemática, mas o professor não gostava de faltar. Vinha de longe, lá de Fernão Velho, montado em moto da época ainda chamada Lambreta. Eu sabia que Fernão Velho era um distrito de Maceió, queria conhecê-lo, mas as circunstâncias não permitiam. E o professor Arnaldo, moreno, novo e sisudo, ensinava bem, cumpria o seu dever, mas não era chegado a conversas particulares com seus alunos. E difícil era pegar um professor bom em um colégio já em decadência. Como seguir estudando numa turma para engenharia se eu não gostava de Matemática? Terminei migrando do Colégio particular famoso para uma escola do governo no CEPA, onde vi maravilhas e como funcionava bem o ensino público. Em cada matéria dois professores competentes formando um Curso Médio seguro e competitivo.

Década depois, cismei em conhecer Fernão Velho e terminei chegando lá. Após um aclive enorme, pus os pés ali na beira da lagoa e fiquei encantado com a beleza do lugar. Da antiga e famosa ‘Fábrica de Tecidos Carmem”, restavam apenas as ruínas e que alguns moradores ali jogavam dominó. O que mais admirei foi o cais na lagoa Mundaú. Uma maravilha, tanto o cais quanto as suas imediações. Outras décadas após, retornei ali, até desejando conhecer o frigorífico de jacarés que se tornara famoso e exportava o bicho para o restante do Brasil. Mas, qual não foi a minha decepção. Encontrei o lugar decadente, feio, desorganizado e sem nexo. Não existia o cais de outrora nem lugar que eu pudesse me sentir bem. Voltei tão ligeiro quanto fui e nunca mais quis saber e nem recomendar lugares de visita a ninguém.

Como nunca mais estive por ali. Não sei se o meu professor de Matemática, Arnaldo, se formou em Engenharia como estava querendo, se é vivo ou se já fez sua passagem. Espero também que a comunidade pobre e pescadora de Fernão Velho, tenha encontrado um ou mais administradores para devolver o progresso e a beleza que o distrito merece. De um lado as águas da laguna Mundaú, do outro, parte importante da Floresta Tropical (Mata Atlântica) dominando as encostas que levam a Maceió. Após a extinção da Fábrica de Tecidos Carmen, não havia surgido nada em grande estilo que empregasse toda a mão-de-obra local que congregava a fábrica. E assim, aquele tesouro que muitos estados gostariam de possuir, talvez continue sofrendo por falta de política pública.

BAIRRO FERNÃO VELHO

 

 

 


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quarta-feira, 30 de outubro de 2024

 

SERTÃO ORNAMENTAL

Clerisvaldo B. Chagas, 31 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.139

 



A história se repete no Sertão quando se aproxima o Natal, descrito tantas vezes neste espaço. Quase todas as árvores sertanejas prestam tributo ao Criador dos Mundos.  Árbustos, cactáceas, árvores, arvoretas e gramíneas enfeitam parte do sertão diante dos olhos dos animais selvagens, domésticos e do ser humano. É o mandacaru, o facheiro, a coroa-de-frade, a favela, o alastrado o rabo-de-raposa, as margaridas do campo, o pereiro, o jasmim, a craibeira... E vamos nos deleitando com as variadas flores que surgem isolada ou não nas trilhas, nas veredas, nos caminhos, nas baixadas, nos cocurutos dos serrotes, nas beiras das lagoas. Em muitas dessas vezes nos sentimos pequenos, mínimos, sumidos, diante da grandeza da flora e sua homenagem ao Senhor Jesus e às suas criaturas.

E vamos terminando o mês de outubro numa primavera típica: dias ensolarados e quentes, noites úmidas e ventos frios nos conduzindo para novembro que às vezes nos brinda com trovoadas, primeiras. E como não temos mar, vamos marcando presença nos açudes, nas represas, nas praias do “Velho Chico” em Piranhas, Pão de Açúcar e se aventurando para as bandas de Belo Monte, Olho d’Água do Casado, Delmiro Gouveia...  Novembro, o mês tradicional dos ventos por aqui, há muito os antecipou e ainda continuamos vivendo essa realidade.  E se as matas, no geral ficam crestadas, pontos isolados da caatinga destacam-se com seus preciosos ornamentos ao viajor de olhares perscrutadores.

É por isso que também na paisagem urbana, vamos nos surpreendendo com as maquiagens das nossas damas representativas como a craibeira que surge por cima dos quintais nos pátios de escolas tais como A Francisco Correia e a antiga Helena Braga, já tem adolescente com mais de 15 metros de altura. Lançar um olhar de aprendizado aos vegetais neste período é prazeroso e cultural onde aprendemos com a Natureza a resistir, a acreditar, a ornar a alma e fortificar as virtudes. A aproximação do final de ano é mais um motivo de reflexão, na igreja, no quarto, na varanda, no alpendre, na rede...  Pois, como nos foi ensinado no catecismo da Igreja Matriz de Senhora Santana: “Deus está aqui, aqui, aqui, ali, em todos os lugares”, mas você é quem decide se quer se encontrar com Ele.

CRAIBEIRA NA ANTIGA ESCOLA HELENA BRAGA. FILHA AO LADO QUERENDO FLORAR. (FOTO: B. CHAGAS).


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terça-feira, 29 de outubro de 2024

SINUCA E VIDA

Clerisvaldo b. Chagas, 30 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.138




 

O salão de sinuca ficava no “prédio do meio da rua”, onde fora o armazém do senhor Marinho Rodrigues. Pertencia a Zé Galego, ex-jogador do Ipanema. Ainda estudando na escolinha de dona Helena Oliveira na Ponte do Padre, sentia grande atração por aquele melhor jogo que já provei na vida. Tinha até um colega nosso, já homem feito, família dos Bigula, que vinha a pé do sítio João Gomes para a escola e terminava sempre gazeando e indo parar no salão de sinuca como apreciador e apostador. Havia muitos bons jogadores, muitos nem dar para lembrar os nomes, mas o maior de todos para aplicar sinuca era o chamado Nego Dézio, também ex-jogador do Ipanema. Para enfrenta-lo só havia outro jogador que era o melhor em incestar. Portanto o duelo entre ambos era casa cheia e tempo de espetáculo no salão de Zé Galego.

Mas ali também se aprendia sobre a vida. Havia muitas reflexões como estas, tradicionais na sabedoria popular ou pensada na hora. Quando um jogador ficava alegre por iniciar ganhando, o parceiro dizia em voz baixa, resmungando: “Não existe Senhor do Bom Começo, somente Senhor do Bonfim”. Quando um dos jogadores queria fazer várias jogadas ao mesmo tempo incestando bolas e perdia uma dela, o parceiro dizia para a plateia: “Quem quer muito traz de casa”.  E ainda quando o adversário tinha muita sorte, mesmo na adversidade, o outro jogador retrucava: “Jumento carregado de açúcar, até o c... É doce”.  Em qualquer ambiente onde estejamos, seja no pior ou no melhor, aprendemos lições, chulas ou clássicas que nos servem de orientações na vida.

Mas também havia pessoas amadoras excelentes na sinuca, a quem chamávamos de ratos: Lembro de alguns deles: Tamanquinho, Remi, Tonho Bié e Carlos Soares. Surgiu um rapaz pequeno de estatura que também era rato profissional chamado Tonheiro. Havia outros profissionais como Desulica, Branda e Vardo. Mas que pena, não lembro o nome do grande adversário de Dézio, cujo nome é parecido com Maurício. Frequentei o lugar onde nunca presenciei nem uma briga, nenhuma confusão, mas quando me bateu o desejo de jogar apostando com os profissionais, senti a hora de me afastar para sempre de casa de jogo. Seguia os caminhos do meu pai Manezinho Chagas.

Ao Senhor, toda honra e toda glória!

CENTRO DE SANTANA (FOTO: B. CHAGAS)



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segunda-feira, 28 de outubro de 2024

 

ROCHEIRA

Clerisvaldo B. Chagas, 29 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.137

 



O Nome “Rocheira”, vi pela primeira e única vez numa antiga visita a Penedo, Alagoas.  O local alto e rochoso é muito bonito e faz parte da belíssima história penedense, com ênfase para as lutas dos nossos brasileiros da região contra os invasores holandeses. Foi pena, na época de a visita não haver nenhum guia turístico ou pessoa especializada para contar o significado da Rocheira nos anais do seu passado. Foi ali na Rocheira onde pela primeira e também única vez, comi carne de jacaré em um daqueles restaurantes. Gostosa, mas oleosa e nunca mais provocativa para uma segunda tentativa. Mas não é só a Rocheira que atrai o turista brasileiro. Outras atrações estão espalhadas pelo primeiro núcleo habitacional de Alagoas.

E se estou falando disso agora, é por causa da louvável tentativa da prefeitura de bem iluminar o local para os passeios turísticos noturnos e o roubo imediato de luminárias ali deixadas, conforme site noticiosos. Meu amigo, minha amiga, hoje ninguém quer trabalhar e se apega a esse vício infame em roubar que não tem castigo que conserte peste de ladrão. Até estava comentando quando as prefeituras tinham vigias permanentes dos logradouros públicos. Mas, de algumas décadas para cá, é no máximo, uma tal de câmera que não dá em nada. Os vândalos continuam levando armas de vigias que raramente aparecem. E assim tudo isso faz lembrar o cantador repentista:

 

Tamo na segundo etapa

Do tempo do realismo

Vai chegando o comunismo

Desse aí ninguém, escapa

Atiraram até no Papa

Mas eu Delfim Neto não

Que falta faz Lampião

Pratirar em cabra ruim

Se não der fim a Delfim

Delfim dá fim a Nação.

 

Mesmo assim entre assaltos, descuidos e mortes, a humanidade continua fazendo turismo, tentando conhecer o mundo, independente dos perigos de cada dia. E Penedo, nas Alagoas, com jacaré, sem jacaré, com Rocheira, sem Rocheira, ainda é uma excelente opção

ROCHEIRA (FOTO: ASSESSORIA/DIVULGAÇÃO).

 

 

 

 

 


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domingo, 27 de outubro de 2024

 

POETAS ESQUECIDOS

Clerisvaldo B. Chagas, 28 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.136

 

Sim, conheci ambos os poetas. Zequinha gostava de vestir uma roupa de mescla (azulão). Era cego e sempre aparecia nas feiras dos sábados com o seu guia. Usava um ganzá de flandres para cantar os seus versos que quase sempre eram de pedir. O homem era uma cachoeira de rima e morava no sítio rural Travessão.  Cantava na feira e pedia, pedia e cantava de uma vez só pelo meio da multidão. Mão no ganzá, outra abanando perto do olho. Dele ficou esta estrofe quando um cidadão disse: “Perdoe Ceguinho”:

 

A bacia do perdoe

Deixei lá no Travessão

Só homem não sou menino

Todo ser é assassino

Só meu padre Ciço não.

 

Já Zezinho da Divisão (sítio rural na divisa Santana Carneiros) se dizia galego buchudo. Poeta também fecundo, gostava de tomar umas e cantar putaria quando se via apertado num duelo. Assim foi convidado para cantar com Zé de Almeida na casa de um cidadão, no Bairro Camoxinga, em Santana do Ipanema. A cantoria estava quente quando pediram um tema: “Mais sou melhor do que tu”. Zé de Almeida disse:

 

 

Sou um tipo sem futuro

Desses que não valem nada

Sou igual a uma levada

Lugar que só tem monturo

Sou um recanto de muro

Onde só tem cururu.

Sou igualmente um tatu

Dentro dum buraco fundo

Sou a desgraça do mundo

Mas sou melhor do que tu

 

Zezinho já estava cheio da cana e muito vermelho. Vendo tantos aplausos para o parceiro, disse:

 

Já perdi a cerimonha

Só ando cambaleando

Tem gente até me chamando

De fumador de maconha

Juntei-me com u’a sem-vergonha

Levei ponta pra chuchu

Foi corno em Caruaru

Fui viado em Maribondo

Mesmo soltando o redondo

Mas sou melhor do que tu.

 

O dono da casa expulsou os dois.

Nunca tivemos registro de nenhuma homenagem feita aos dois fantásticos poetas.

 

 

 


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quinta-feira, 24 de outubro de 2024

 

SERRA DAS PIAS

Clerisvaldo B. Chagas, 25 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.135

 



Estar aí estampada nos jornais o tombamento de uma carreta na serra das Pias, em Palmeira dos índios. E não é para meter medo em ninguém, mas subir, principalmente, descer a serra das Pias como passageiro pode ser um tormento de apreensão que tem fim apenas quando se vence o declive. Já tivemos muitos receios em nossas viagens de ônibus, rumo a Arco Verde, para encerrarmos os nossos estudos. Muitas vezes descemos a serra das Pias pelas madrugadas, com motoristas de ônibus da Empresa Jotude, pé em baixo, meu amigo. Como diz o sertanejo, “coração no pé da goela”, perante tamanha danação, imprudência e falta de tudo. Muitos inocentes viam dormindo, mas quem estava cordado... Só Deus sabe a apreensão.

A serra das Pias faz parte de uma cadeia de montanhas que formam os contrafortes do planalto da Borborema, particularmente do Planalto de Garanhuns.  Sua rodovia liga a cidade de Palmeira dos Índios, imediatamente a cidade de Bom Conselho. No geral, liga o Sul do Brasil ao Recife. Por ali transitam inúmeras cargas dos mais diferentes produtos em caminhões e carretas. Quando dentro do estado Arapiraca – Palmeira, os veículos ganham tempo transitando via Igaci e que agora será duplicada. Portanto, a serra das Pias é importantíssima via de integração nacional, não se nega, porém, precisa muito de modernização que ofereça muito mais segurança para os usuários comuns e para os imprudentes. Interessante é o sopé da serra no entroncamento de Palmeira. Forma-se um aglomerado de postos de gasolina, churrascarias e lanchonetes que em dados momentos é tanto veículo que até parece uma festa.

Que pena, uma das mais perigosas serras do Brasil, ainda continuar praticamente como foi construída. Nada de duplicação, nada de ponto de escape nas curvas assassinas e engordamento de estatística de acidentes como esse agora do tombamento de uma carreta e seu paradeiro nas águas de um açude, onde submergiu a cabina. Subir e desce a serra das Pias em carro grande é fazer brincadeira de roleta-russa. O cabra não se conforma com o aclive funério e acelera feito doido querendo ser o finado Ailton Sena.

Ali vivi meus sustos.

Não quero retornar.

 

 

 

 

                                                                                          


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quarta-feira, 23 de outubro de 2024

 

OCEANOS

Clerisvaldo B. Chagas, 24 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.134




 

Vamos pular do Sertão para os oceanos, cabra véi, onde o vaqueiro troca os bois pelo navio. Podemos classificar o relevo dos oceanos da seguinte maneira:

Plataforma Continental, Talude Continental, Bacia ou Planície Abissal, Cordilheiras Oceânicas Ilhas Oceânicas e Fossas Oceânicas.

·       Plataforma Continental – Planície oceânica que vai do continente entre 70 a 1000 km mar adentro. Possui em torno de 200 metros de profundidade.

·       Talude Continental – Declividade após a Plataforma Continental que vai em torno de 3.000 a 5.000 metros de profundidade.

·       Planície ou bacia Abissal – bacia sedimentar com mais de 5.000 metros de profundidade e que vai até as encostas das Cordilheiras Oceânicas.

·       Cordilheiras Oceânicas ou Dorsais Oceânicas -  Elevações ao longo dos oceanos cujo comprimento total vai até 84.000 Km e uma largura com cerca de 1.000 Km.

·        Ilhas Oceânicas – que se formam no piso do oceano e terminam na superfície.

·       Fossas oceânicas – Depressões alongadas e estreitas com grandes inclinações a partir de áreas de placas tectônicas.

Essa classificação às vezes muda palavras ou frases, porém, a essência é esta.

E se por uma parte parece fantástico, por outro também assusta. Mas não era o que pensava o professor Silvio Bulhões, filho de Corisco e Dadá que já fora marinheiro. Queria após a vida, suas cinzas no mar. Admirava muito sua grandeza e queria juntar-se a ela.

As grandes riquezas minerais estão na Plataforma Continental, como o petróleo, por exemplo, lugar de grandes ambições mundiais pelo seu conteúdo.

Quem tiver seus navios que vá navegar.

Prefiro o cavalo furando nossas caatingas nordestinas.

 


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terça-feira, 22 de outubro de 2024

 

MODESTO E FORTE

Clerisvaldo B. Chagas, 23 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.133

 



Na época em que se construía a estrada de rodagem, Maceió Delmiro Gouveia, surgiu o povoado Dois Riachos já com um planejamento futuro de cidade. Ali à margem direita do riacho Dois Riachos, afluente do rio Ipanema, pela margem esquerda, cresceu e se desenvolveu aquele núcleo baseado na Agricultura e na pecuária. Foi por muito tempo lugar de apoio aos visitantes em busca de negócios nas cidades maiores da região. Logo cedo já possuía um típico hotel sertanejo da época que oferecia conforto e uma boa culinária regional. Hoje a cidade de Dois Riachos é bastante famosa pela feira de gado que acontece às quartas, às margens da BR-316. É a melhor feira de gado de Alagoas frequentada por compradores, vendedores curiosos de todas as cidades alagoanas, de Sergipe, de Pernambuco que não abrem mão daquela feira fantástica.

Dois Riachos ainda possui a maior romaria do padre Cícero do estado de Alagoas e que acontece sempre no dia 20 de julho, dia de morte do Santo do Nordeste. A grande romaria acontece no lugar a cerca de 2 km, da feira de gado, à margem da BR-316, entre Dois Riachos e Cacimbinhas, na “Pedra do Padre Cícero”, denominação popular. Ali, por motivo de promessa, foi erguido um oratório no cimo de um bloco rochoso, em homenagem ao homem do Juazeiro.  É lá onde lançaremos o livro para os romeiros em julho de 2025, “Padre Cícero, 100 milagres Nordestinos – Inéditos”, completamente gratuito. Voltando às atrações do município que também ficou conhecido como “Terra da Marta”, temos os atrativos para quem nem quer saber de religião, nem de compra e venda de boi.

O Açude do hoje Povoado Pai Mané, representa um lazer de pesca, culinária e beleza paisagística. O acesso é asfaltado e fica a um pulo da BR-316. Fora isso, em tempos de cheias, temos a atração do próprio riacho Dois Riachos que corta a cidade ao meio, pois a outra margem, a esquerda cresceu bastante em direção à Pedra do Padre Cícero. É bastante larga a calha do riacho e, as cheias quando volumosas, são atrações vistas da antiga ponte que foi substituída e saiu de cena da BR, mas hoje serve dentro da cidade. Sua população é de apenas em torno 10.000 habitantes e tem como padroeiro o Mártir São Sebastião. Cidade excelente para quem procura descanso ou gosta de pesquisar de tudo.

Estaremos na próxima semana visitando o núcleo.

PEDRA DO PADRE CÍCERO (FOTO B. CHAGAS)

 


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segunda-feira, 21 de outubro de 2024

 

O MINGAU DO GRUPO

Clerisvaldo B. Chagas, 22 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.132

 



Para a criançada de Santana do Ipanema, o Grupo Escolar Padre Francisco Correia, no Bairro Monumento, ainda era o melhor lugar fechado da cidade tanto para estudar quanto para se divertir. Era muito bom quando dona Prisciliana, já de certa idade, tocava a sineta para o recreio. Saíamos todos para o enorme pátio ao lado, piso de terra cercado de muretas baixas. Antes da saída para o pátio recebíamos o lanche da escola que, na época, era apenas uma caneca de plástico rígido de mingau. Sim, o mingau tinha uma cor marrom bem clarinha, cheiro bom, mas enjoativo. Às vezes bebíamos. Outras vezes, após o primeiro gole, derramávamos o líquido sobre a areia do terreno. Aquilo devia ser bastante nutritivo, mas era enjoativo, talvez pelo excesso de açúcar.

Isso, aproximadamente em torno de 1954. Dona Prisciliana era ainda da turma fundadora do Grupo e naquela função: apenas bater a sineta, puxando num cordão, para o recreio e para o final das aulas. Viera da fundação desde o ano de 1938. Foi ali onde fui vacinado contra a “Influenza”, pela primeira vez. Era uma equipe volante da Saúde e lembro bem apenas de um dos membros da equipe, o senhor José Chagas. A vacina era aplicada no braço com uma pena de escrever, tipo daquelas que se usava molhando a ponta de metal num tinteiro. O vacinador arranhava aquele troço na pele da gente e que deixava para sempre a cicatriz. As bancas compridas de madeira e ferro, cabiam dois alunos. Se não estiver enganado o recreio durava meia hora. A diversão para os meninos era brincar de pega, ximbra ou pinhão.

Não estudei no Grupo com minha mãe, que era um doce de pessoa, mas gostava muito da professora Maria de Lourdes Queiroz. O grupo finalmente foi reformado no início do Século XXI. Por ali passaram muitos alunos importantes que iriam se destacar dentro e fora de Alagoas em todas as áreas, inclusive um futuro governador. O Grupo Escolar Padre Francisco Correia, estar aniversariando com suas 86 velinhas, este ano. A mesma idade do prédio do Ginásio Santana, joias da coroa santanense.

Orgulho em ser Nordestino, alagoano sertanejo.

GRUPO POUCOS DIAS APÓS REFORMA. (FOTO: B. CHAGAS/LIVRO 230).

 

 

 


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domingo, 20 de outubro de 2024

 

PADRE BULHÕES/CADEIA VELHA

Clerisvaldo B. Chagas, 21 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3. 131



 

Vimos anteriormente que Santana do Ipanema era o maior município de Alagoas, até, aproximadamente, 1950. Pertenciam a ela as terras do atual município de Carneiros, com os sítios rurais, “Mundo Novo” e “Bom Consolo”, entre outros. Pois bem, certa feita, quando o padre Bulhões estava na Igreja, em Santana, observou do altar que um matuto entrara na igreja com um cigarro apagado no bico e de chapéu que não tirou da cabeça. Ficou observando de lá o movimento do povo que chegava para a missa do sábado dia de feira. Viu quando o matuto se aproximou de um dos altares onde havia uma vela acesa e tentava acender o seu “boró” (cigarro de fumo de rolo). Aproximou-se do matuto e indagou primeiro: “De onde é o amigo? “Do Mundo Novo”, respondeu o agricultor. O padre coçou a cabeça e rebateu: “Só sendo do Mundo Novo, porque no mundo velho de meu Deus, ninguém acende braço de Judas em vela de altar... “. (Cigarro de fumo de corda, também é chamado por aqui de “braço de Judas’.

Por outro lado, no tempo da chamada “Cadeia Velha”, na Rua Antônio Tavares, chegara a Santana uma guarnição sob o comando de um sargento brabo e ficara aquartelada na dita Cadeia Velha. Certo dia, ao passar por ali um cidadão tangendo uns burros, estalava o relho como rotina do seu ttrabalho. O sargento tomou o relho do condutor e, nervoso, disse que detestava estalos de relho e chegou a ameaçar com uma surra o cidadão. Ora! Logo cedo do outro dia, surgiu defronte à Cadeia Velha, um proprietário rural, estalando um relho diante da porta, passando para lá e para cá diversas vezes, propositadamente. Gritava na rua: “Cadê o sargento brabo daqui para vim tomar meu relho e me dá uma pisa! E se triscar num só cabelo do meu padrinho fulano, a desgraça tá feita! Eu sou Brasiliano do Bom Consolo, venha tomar meu relho agora, seu fio da peste!

Foi assim que Bom Consolo e Mundo Novo conseguiram registros na história de Santana do Ipanema. Atualmente, procurando o nome de uma comunidade rural dos Carneiros, descobri no mapa os nomes dos sítios citados acima: Mundo Novo e Bom Consolo. Aproveitei para contar os fatos aos meus queridos leitores. Entretanto, estou procurando onde ficam as comunidades Lagoa do Rancho e Santa Luzia, você sabe?

 

 

 

 


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quinta-feira, 17 de outubro de 2024

 

HISTÓRIA DO SERTÃO

Clerisvaldo B. Chagas, 18 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.130



 

Você sabia? O município de Santana do Ipanema, era então, o maior de Alagoas. Começou a sua redução territorial a partir de 17.9.1949, quando cedeu terras, para a Emancipação Política do lugar “Sertãozinho”, que passou a ser chamado de Major Isidoro. Mesmo assim lembro ainda criança que na década de 50, no povoado olhodaguense do “Pedrão”, minha tia Delídia ainda chamava a nova cidade de “Sertãozinho”. Em 2.12.1953 -  meu aniversário - Mais uma vez Santana do Ipanema perde território e, desta feita para a vila de Olho d’Água das Flores. Era a vila altamente agrícola e merecia mesmo ter vida própria. Cinco anos depois Santana perdia mais terras, encolhia com a Emancipação do povoado Capim, em 24.4.1958, cujo lugar passou a ser chamado de Olivença.

Ainda no mesmo ano de 58, Santana perde mais terras e desta feita para o antigo Olho d’Água da Cruz, Poço das Trincheiras que se emancipou em 15.71958 com o mesmo nome de Poço das Trincheiras. Neste ano de 1958, foram três emancipações, pois Santana ainda teve que perder parte de sua extensão também para o povoado Cova de Defunto em 15.7.58. Perdemos, então, dois povoados no mesmo mês e no mesmo ano. Cova de Defunto passou a ser denominada de Maravilha. Quatro anos depois, novamente podaram Santana do Ipanema com a Emancipação de Olho d’Água do Chicão em 27.3.62 e que recebeu o nome de Ouro Branco. Não senhor, não parou por aqui.

No dia 11.7.62, mesmo ano acima, perdemos também o povoado Carneiros cuja emancipação conservou o mesmo título de povoado, Carneiros. Os ávidos políticos por prestígio, votos e poder de prefeito, continuaram formando novos municípios, em Alagoas. Assim, foi emancipado o antigo lugar “Usina”, Riacho Grande para se transformar em Senador Rui Palmeira na data 13.5.1982. Foi o último até agora que resolveu caminhar sozinho.

 


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quarta-feira, 16 de outubro de 2024

 

CURRIÃO/BURINHANHÉM/TANGERINO

Clerisvaldo B. Chagas, 17 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.129



 

Você sabe o que é um currião? Você imagina o que seja um burinhanhém? Ê cabra velho, só o autêntico sertanejo ou um grande apreciador do Sertão anota no papel ou na cabeça os diversos nomes, frases e costumes do nosso semiárido alagoano. E por falar em frases, “Mês miou, mês findou”, diz o homem-raiz da zona rural. Mas o mês não é gato e nem vai miar, porém, traduzindo o babado, o mês meou, isto é, chegou ao dia 15 e parece passar rápido o tempo do dia 15 até o fim do mês. Mas, voltemos às palavras do título desta crônica, que fala do exímio trabalho do artesão nordestino do couro.  Currião é o relho do carreiro, condutor do carro de boi. É feito de várias peças de couro cru que se tornam uma só e com cabo de madeira. Serve para o carreiro açoitar os bois de carro. É conduzido no ombro do carreiro, pendurado ao longo das suas costas.

O burinhanhém também é obra do artesanato do couro. É um relho de couro cru, usado pelos tropeiros – condutores de tropas de burros – e que em nosso Sertão eram mais conhecidos como almocreves. O burinhanhém é um relho maior do que o do carreiro e possui um cabo de madeira longo e roliço que vai afinando até a extremidade. Mas vamos a outra palavra do mundo mágico sertanejo: Tangerino. Não, não é o macho da fruta tangerina. É um tangedor de gado bovino. Geralmente o boiadeiro comprava uma boiada e, o tangerino ia levá-la ao seu destino tangendo-a pelas estradas, a pé ou montado em burro ou cavalo. Currião, burinhanhém e tangerino fazem parte, portanto do nosso dicionário alagoano e nordestino.

E se o Sertão é um planeta mágico, possui outros mundos mágicos dentro do próprio fantástico. O mundo dos vaqueiros, o mundo dos carreiros, o mundo dos repentistas, o mundo dos boiadeiros, dos tangedores e outros mais particularizados no global sertanejo que, quando um de nós pesquisadores, penetra em no deles, não consegue mais sair, impregnado de tanta paixão pelo aprendizado. Nesse momento mesmo seria uma reportagem e tanta registrar os passos do homem da roça com as dificuldades da transição entre estações mais fáceis e as mais difíceis. O aprendizado é um tesouro infinito para quem sabe procurá-lo com respeito, admiração e amor.

Orgulho em ser nordestino, sertanejo alagoano!!!

BRUINHANHÉM.

 

 

 

 


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terça-feira, 15 de outubro de 2024

 

O MURRO DO HOMEM

Clerisvaldo B. Chagas, 16 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3. 128

 



Vou contar de novo. Cícero de Otacílio era marchante igual ao seu pai Otacílio, em Santana do Ipanema.  Otacílio era ex-volante, participara da morte de Lampião e Maria Bonita, na fazenda Angicos, Sergipe em 1938. E falava entre outras coisas como morrera o cangaceiro Elétrico. Otacílio em Santana, como ia dizendo, era marchante e, o matadouro da cidade levava o nome dele como homenagem ao destemido policial. Pois bem, entre os seus filhos um deles também virou marchante. Era forte, no Mercado de Carne, transportava nas costas um boi inteiro. Dizem que certa vez o homem matara um boi com um murro. O marchante Cícero de Otacílio faleceu vítima de acidente de trânsito no lugar Largo do Maracanã ponto mais perigoso de Santana.

Difícil é contabilizar o número de acidentes do Largo do Maracanã, lugar central do Bairro Camoxinga, ponto divergente e convergente de 5 ruas e a BR-316.

Mas, voltemos à vida do homem. Forte, alegra, comunicativo e simpático, Cícero se dava bem com todo mundo. Cícero passou a namorar com uma senhorita da Rua Nova, minha ex-colega de Ginásio Santana, Socorro. Foi quando chegou um sujeito de Maceió e, passeando pelo Comércio, viu passar a senhorita e ficou impressionado. Então, indagou ao seu hospedeiro amigo: “Rapaz, quem é aquela moça tão bonita? Estou interessado nela”. O amigo, respondeu com toda naturalidade: “Aquela senhorita é a noiva de um rapaz aqui da cidade que mata um boi de um murro”. O assunto morreu ali. O sujeito frouxo desocupou o Comércio de Santana e embarcou de volta a Maceió, no primeiro pinga-pinga que apareceu.

E você, cabra véi!

Enfrentaria um homem que mata um boi de um murro?

MATADOURO PÚBLICO

 


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segunda-feira, 14 de outubro de 2024

 

FERREIRINHA

Clerisvaldo B. Chagas, 15 de outubro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.127

 




Poeta, compositor, cantor sertanejo, pescador e garrafeiro, Senhor das Plantas, Ferreirinha iniciara sua carreira cantando sertanejo com seu parceiro Ferreira, fazendo a dupla Ferreira e Ferreirinha. Cantava sempre no coral da Matriz de São Cristóvão e tornou-se nosso companheiro da “Associação Guardiões do Ipanema” – AGRIPA. A foto abaixo representa uma incursão nossa pelo rio Ipanema, trajeto comércio – Cachoeiras, ocasião em que Ferreirinha descrevia várias plantas medicinais no trecho. Era mestre no conhecimento de plantas e usos imediatos. Até livreto editara sobre o tema. Gostava de pescar (inclusive surge pescando de anzol no rio Ipanema no livro inédito “Repensando a Geografia de Alagoas”. Ele nunca viu.

Ferreirinha também era exímio cozinheiro e sempre era contratado para cozinhar para grande quantidade de homens. Infelizmente, em uma noite calma, o nosso poeta santanense, sentara à porta de casa para gozar a brisa da rua, quando passou um malandro das imediações. Pediu-lhe um cigarro. Ferreirinha respondeu que não fumava. O bandido seguiu adiante alguns passos e voltou de repente esfaqueando o cantor. Ferreirinha foi socorrido por familiares, enfrentou maratonas de hospitais, porém nunca sarou completamente e o ferimento nos intestinos virou um câncer. Com o escritor Marcello Fausto estivemos em sua residência para uma visita e ouvimos seu dedilhar numa viola muito boa e que o poeta gostava muito.

Para mim, era o maior de todos os guardiões do nosso grupo. Infelizmente ou felizmente, não sabemos o dia de amanhã. E Ferreirinha, morador da CONHB nova, curtindo aragem do bairro mais alto da cidade, teve sua integridade física atacada por um marginal do Bairro Lajeiro Grande. Monitorou o bandido por uns tempos com seus familiares, mas o destino não permitiu que o poeta sujasse suas mãos. Tempos depois, outros marginais ou a polícia fez o que muitos queriam fazer com o agressor.

No momento, revendo algumas fotos de Ferreirinha, bateu a vontade de homenageá-lo com uma crônica sentida.

Onde você estiver, meu poeta...

Receba um forte abraço do companheiro da AGRIPA.

ARISELMO E FERREIRINHA (DE BERMUDA) E FERREIRINHA SOZINHO NA ANTIGA ESCOLA HELENA BRAGA, SEDE DA AGRIPA.  FOTO: ARQUIVO DO AUTOR.

 

 

 


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