Distribuindo livros no povoado São Félix. Ao fundo, o saudoso poeta e cantor Ferreirinha, violão
e voz.
Distribuindo livros no povoado São Félix. Ao fundo, o saudoso poeta e cantor Ferreirinha, violão
SANTA
LUZIA
Clerisvaldo B. Chagas, 6 de setembro de
2024
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3.102
Santa nascida em Siracusa, na Itália, é muito
forte no Nordeste brasileiro. Sua tradição pelas zonas rurais parece mais forte
ainda, onde suas novenas são celebradas com muita esperança no seu dia, 13 de
dezembro. Padroeira dos oftalmologistas e das pessoas que têm algum tipo de
deficiência visual, a presença de Santa Luzia está no cotidiano dos
agricultores que muita a veneram. Perseguida por Diocleciano para que se
convertesse aos deuses pagãos, sofreu absurdos e assegurando milagres em sua
defesa, até que finalmente se tornou mártir. Seus solhos foram arrancados e
entregue no prato ao imperador. Mas nasceram outros olhos sadios e mais belos do
que os primeiros. Finalmente sua cabeça foi ao chão aos golpes dos
perseguidores.
Na sua literatura se apresenta sempre com os
dois olhos em um prato e que essa representação se encontra nas casas de
inúmeros devotos, sertões afora. Em Santana do Ipanema, cidade sertaneja
alagoana, entre tantos santos em nomes de ruas, está o de Santa Luzia que,
segundo a população, foi promovida a bairro. Contemplamos muito os ternos de
zabumba pelas ruas de povoados e cidades de casa em casa pedindo donativos para
leilão e dinheiro para a novena de Santa Luzia. Tocadores atrás, mulher à
frente com a imagem da santa protegida por pano branco, sombrinha protetora do
Sol forte.
No meu mais recente romance do ciclo do
cangaço, “OURO DAS ABELHAS”, tem uma cena de terno de zabumba tocando em um
povoado onde iria haver novena de Santa Luzia, pela noite. A personagem
principal do romance, Mocinha, pág. 54 do Capítulo: Onça assando Batata, canta:
Santa Luzia já vem
Cheia de luz e louvor
Curar os olhos do povo
Sem escolher pecador.
E assim vamos se deliciando com as belas
história de Santa Luzia. Inclusive, muita gente devota se recusa a trabalhar no
seu dia.
É dia santo no coração.
TERNO DE ZABUMBA NA RUA ANTÕNIO TAVARES, EM
SANTANA DO IPANEMA. (FOTO: JEANE CHAGAS). ACERVO DO AUTOR. SANTA LUZIA.
ESCOLA
DO VOVÕ
Clerisvaldo B. Chagas, 5 de setembro de 2024
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3. 101
Temos certeza de que você, santanense, não
sabe, porém, podemos dizer que a escola mais antiga da cidade é a que você está
vendo abaixo. Leva o nome do primeiro juiz de Santana do Ipanema e que atuou na
década de 1920. Em questão de prédio, é a escola “Bacurau”, mas no momento
virou biblioteca de bairro. Então, a escolinha Manoel Xavier Acioly, abaixo,
assume o lugar da mais antiga que conhecemos na urbe. Vamos levar em conta que
a represa na BR-316, construída na periferia de Santana, em 1951 tenha influído
na construção da escola. A represa ao lado da BR e a ponte ali erguida, deram
origem ao Bairro Barragem que se formou em parte com os operários da obra
(cassacos). A represa, hoje assoreada, sempre foi apontada pelo povo como
barragem, o início do bairro e até hoje também, Bairro da Barragem.
Portanto, tudo levar a crer que a escolinha
tenha sido fundada no início do Bairro da Barragem, para suprir a necessidade
das famílias daquela periferia, em 1 de agosto de 1956. A escolinha acaba de
completar 68 anos de existência.... Nem temos a ideia se ela mesma sabe disso.
No caso, tínhamos apenas 10 anos de idade quando se deu o fato inaugural. Parecia
uma paisagem muito triste quando víamos aquela escola pequena e isolada lá na
beira da estrada. Foi reformada nos últimos anos e passou a ser um anexo de uma
escola do Bairro São José. Com a situação da atualidade que tem transporte para
todas as escolas do Brasil, a escolinha Manoel Xavier Acioly, também passa a
acompanhar o modernismo e recebe alunos dos sítios daquela Zona Oeste de
Santana do Ipanema.
Temos uma impressão muito forte de que a
Educação e toda população santanense, deveriam fazer uma belíssima homenagem
àquela unidade de Ensino. Inclusive, com um dia completo de lazer e inúmera
atrações, com a participação de todas as outras escolas da cidade. O bairro da
Barragem cresceu, formou do outro lado da pista um complemento moderníssimo que
dividiu o bairro no antes e depois. Por trás da parte mais antiga e original,
formou-se o bairro mais novo da cidade, denominado pelo povo de Clima Bom.
Também é servido pela “Escola Vovô”, Manoel Xavier Acioly.
Sua bênção!...
ESCOLA MANOEL XAVIER ACIOLY, em 2013. (LIVRO
230 ICONOGRÁFICO AOS 230 ANOS DE SANTANA
DO IPANEMA/B. CHAGAS).
REVENDO
A CAPELA
Clerisvaldo
B. Chagas, 4 de setembro de 2024
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3.100
A primeira capela em homenagem à Senhora
Santana, em Santana do Ipanema, remonta ao ano de 1787 (Século XVIII).
Construída pelo padre Francisco Correia nas terras do fazendeiro Martinho
Rodrigues Gaia, a capela fora inspirada pela esposa do fazendeiro Ana Tereza,
primeira devota da santa na região. Ana Tinha pedido ao padre uma imagem de
Senhora Santana e que ele trouxera da Bahia.
Nada mais justo de que a construção da capela para posterior
entronização da imagem desejada. E a
capela fora inaugurada também com a imagem do Cristo Crucificado, esculpido
pelo padre Francisco Correia, além de outras ações. Sua belíssima arquitetura
para a época, ainda hoje impressiona. Só foi reformada em 1900.
Pelo nosso conhecimento, somente no ano de
1900, a capela recebeu a sua primeira reforma. Além de um resumido registro em
livro de outro escritor, temos uma foto da capela em preto, com movimento de procissão
também. Após essa foto de 1900, vamos encontrar outra foto da igreja, em 1020,
já reformada e caiada de branco. Afora isto, somente a grande reforma do final
dos anos 40, ocasião em que foi construída a imensa torre que ainda hoje
perdura na sua forma externa. A Igreja Matriz de Senhora Santana sofreu
modificações internas, após a queda completa do seu forro ainda no final da
gestão do padre Luís Cirilo Silva. Depois sofreu mais algumas significativas
modificações na gestão do saudoso padre Delorizano. Quer dizer, não é mais
internamente a original da década de 40.
Entretanto, a parte externa, em relação a
degraus, jardins, iluminação, foi sendo modificada aos poucos, desde mesmo
antes das remodelações internas. Mas a sua arquitetura geral, baseada na capela
primeira de 1787 (Ver figura abaixo), nunca foi modificada. A Igreja Matriz de
Senhora Santana, ainda continua sendo a maior atração turística do nosso
município e o seu mais belo cartão postal. A propósito, foi dentro da nave,
logo após a entrada interna para o Salão Paroquial contíguo onde foi sepultado
o tão querido padre Luís Cirilo, o mais carismático de todos os que por ali
passaram. Após o falecimento do padre
Luís Cirilo, as andorinhas em bando que frequentavam o alto da torre da Matriz,
desapareceram e nunca mais retornaram para a alegria costumeira.
ORIGINAL CAPELA DE SENHORA SANTANA FUNDADA EM
1787. (LIVRO “230, ICONOGRÁFICO AOS 230 ANOS DE SANTANA DO IPANEMA/FOTO OU
PINTURA: MARINA FALCÃO/ACERVO DO AUTOR.
CANCÃO-DE-FOGO
Clerisvaldo B. Chagas, 3 de setembro de 2024
Escritor
Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3.099
No sertão alagoano é Cancão, em outras regiões
também é chamado: Cancão-de-fogo, gralha-cancã, Quem-quem, cancão de nuca
branca. O cancão é uma ave (Cianocorax cianopogor) típica do sertão nordestino,
mas que o desmatamento o obrigou a emigrar para o Espírito Santo, São Paulo e
Rio de Janeiro. É muito barulhento na caatinga e talvez o seu nome tenha vindo
do som aparente do seu canto. O cancão é muito inteligente e habilidoso no voo
acrobático. Qualquer coisa diferente que avista na caatinga, sai avisando a
todos os moradores, animais e humanos. O caçador experiente costuma estar
atento às manobras do cancão. O próprio
cangaceiro Virgolino Ferreira, escolado sertanejo das caatingas, sabia de todos
os avisos do bicho em questão e de todos os outros, do seu habitat. Isso o
ajudou muito nas suas lutas contra as forças volantes em todos os estados onde
atuava.
O cancão come insetos, fruta de mandacaru e
praticamente tudo, até ração de galinha, se encontrar. Faz o seu ninho nas
árvores mais altas da caatinga, forra o piso com folhas secas e choca três ovos
para enfeitar a mata com seus cancãozinhos. Na sociedade sertaneja, é costume
apelidar poetas repentistas emboladores ou violeiros com apelidos de pássaros
cantadores. E cancão já foi apelido de muitos desses vates. Uma das grandes
feras da poesia escrita, com alguns livros publicados com suas poesias sertanejas
divinais, chamava-se Cancão. O título
Cancão-de-Fogo também está em folheto de cordel, de grande sucesso no passado e
ainda no presente.
Todos os animais da caatinga merecem estudos
profundos, porém, alguns são especiais e estão enraizados na sabedoria popular
trazida da roça, dos campos das matas que muitas vezes serve de provérbio.
Entre os especiais estão a seriema, a cauã, o cancão, a rolinha, o
bem-te-vi. E por falar em rolinha,
talvez o pássaro mais querido do sertão, surgiu hoje, primeiro de setembro,
tempo úmido e nublado, um casal de rolinha caldo-de-feijão catando pedrinhas
defronte a nossa casa. É resultado do desmatamento e a adaptação dos animais no
ambiente urbano. Voltando ao assunto inicial, preste atenção na figura abaixo
do cancão, sua pose e majestade.
CANCÃO (PINTEREST).
O
MOTOR DIABÉTICO
Clerisvaldo B. Chagas, 2 de setembro de 2024
Escritor
Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3.098
A antiga Escola Cenecista Ginásio Santana era
dura nos seus propósitos do Ensino, mas o ambiente às vezes trazia fatos
divertidos. Nós, santanenses, vivemos tempos difíceis em relação à luz elétrica
da cidade. O Ginásio Santana que funcionava à noite, aqui, acolá tinha
problemas com a falta de energia e várias vezes os alunos foram mandados para
casa por falta de luz no meio das aulas ou porque a energia estava passando da
hora de chegar. Isso fez com que a direção da escola adquirisse um motor
próprio. Antes um pouco do início das aulas tinha alguém encarregado de “virar”
o motor. Virar era o termo usado que significava “botar o motor para
funcionar”. Nunca fomos lá até a casinha
do motor para verificar o ato. Mas temos a impressão que era o bedel quem
manobrava o motor. Sim, bedel era o encarregado da limpeza da escola, uma
espécie de zelador.
Os alunos da oitava série, quase sempre eram
adultos. Entre eles havia o Jorge de Leusinger, cujo pai era o senhor
Leusínger, proprietário do “Hotel Avenida”, perto do prédio dos Correios e do
outro lado da avenida. Quando criança estudando no Grupo Escolar Padre
Francisco Correia, já havia presenciado o adulto ou quase, Jorge se exibindo a
correr sobre os pilares do muro baixo da escola. E corria pulando de pilar em
pilar como se estivesse no plano. Aquilo representava uma falta de censo, pois
um passo em falso resultaria morte imediata. Ficávamos com o Credo na boca.
Pois bem, o Jorge era muito presepeiro.
Uma noite o motor do Ginásio não quis virar.
Nada dava jeito. Mandaram os alunos para casa e descobriram que o motor fora
sabotado. Mais tarde, correu o boato interno de que alguém colocara açúcar no
motor para que não houvesse aula. Tomaram conta do Ginásio Santana:
investigação doméstica, risos frouxos e gargalhadas. A culpa foi cair na cabeça
do famigerado Jorge de Leusínger. Tudo indicava que sim, porém não havia
provas. Quem sabia era cúmplice da malandragem e ficara de boca piu. E assim
passamos alguns dias sem aula, aguardando a limpeza da máquina de luz. (Jorge
não está mais no mundo dos vivos).
Quem ainda se lembra do fato, compara as
doenças que havia no passado e no presente. E todos apontaram que o motor
estava diabético.
GINÁSIO SANTANA EM 1963, EM TORNO DA DATA DO
FATO ACIMA (FOTO: DOMÍNIO PÚBLICO/ACERVO DO AUTOR).
APRESENTANDO CLERISVALDO |
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