terça-feira, 28 de setembro de 2010

O FORRÓ DE LAMPIÃO

O FORRÓ DE LAMPIÃO
(Clerisvaldo B. Chagas, 29 de setembro de 2010)
     Quem não lembra o saudoso humorista Barnabé? Em uma das suas memoráveis piadas, ele fala que um fazendeiro mandou vários capangas, um a um, acabar com um forró a certa distância da fazenda, que estava perturbando o seu sono. Todos que iam não retornavam. Até que o último foi lá, demorou, mas voltou dizendo que o tocador sanfoneiro era o famoso Lampião. Quem diabo teria coragem de acabar o forró, senão aderir a ele.
     A primeira vez que se ouviu falar em voto no Brasil, foi em 1532. O fato aconteceu na vila de São Vicente, litoral paulista, onde a votação tinha o objetivo de eleger o Conselho Municipal. Após a Independência, 1822, o Brasil precisava se arrumar como império independente perante outras nações. Tornava-se, portanto, necessário elaborar sua constituição. Os sabidos imaginaram como excluir do processo, os pobres e os portugueses. Foi dentro dessa astuciosa manobra que foi criada a Constituição que recebeu nome popular de Constituição da Mandioca. Por ela só poderia votar quem tivesse uma renda equivalente a 150 alqueires de farinha de mandioca. Esse tipo de votação, apenas assegurava o poder nas mãos da aristocracia. O período colonial e imperial foi marcado por muitas fraudes e gritantes escândalos eleitorais. Já no período republicano, o voto para presidente teve início com a Constituição Republicana de 1891. Assim foi eleito para dirigir o país, Prudente de Morais. Relatam-se inúmeros casos de fraudes e votos de cabresto na chamada República Velha, vulgo dado ao período da história do Brasil que vai do final do império a 1930. Aliás, o voto secreto e o voto feminino foram permitidos somente na década de 30.
     Atualmente todos votam: mulheres, jovens, adultos, analfabetos, pobres e ricos. Continuam, entretanto, os defeitos que partem do próprio eleitor e candidato e não mais exclusivamente das leis. No geral, o rico vota em troca de favores; o pobre em troca de dinheiro e o médio por pedidos e amizade. Acima deles paira o viciado PhD na psicologia do voto. Como a área da conscientização é mais lenta do que o bicho preguiça, permanece a loteria do eleito bom ou ruim. O que esperar para breve, então, se grande parte da populaça quer apito? É com o domínio desse conhecimento que eles permanecem no poder, pois, dificilmente um novato de boas intenções consegue ultrapassar a barreira da malandragem. A parte consciente dos eleitores se sente feliz quando um desses campeões consegue o impossível. A decepção, entretanto, logo emerge porque aquele que representava a esperança foi contaminado e passa a fazer parte do bloco dos sujos. Incorpora-se ao ditado dos maus que dizem que “água limpa não cria peixe”. Infelizmente é assim que funciona.
     Bem que o cabra corajoso foi para acabar a festa, mas a zoada, meu amigo, era O FORRÓ DE LAMPIÃO.


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segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O PORQUINHO

O PORQUINHO
(28 de setembro de 2010)
     Em Santana do Ipanema, morou a família Panta, cuja pessoa mais conhecida era o Zé Panta. Moreno alto, forte, humorista de situações, o Zé trabalhava no DNER, órgão federal, hoje, com o nome DNIT. Muitas passagens divertidas já foram contadas a respeito desse exímio tocador de violão. As irmãs que moravam no Bairro São José, vendiam flores naturais do próprio jardim. A casa em que moravam foi demolida recentemente, onde surgiu a construção de nova residência. A última vez que ouvi falar do aposentado e violonista foi que o homem continuava morando em Maceió. Contou-me certa feita seu amigo de repartição Ermídio, que um engenheiro residente fizera boas amizades com os funcionários, em Santana. Depois o engenheiro foi morar na capital, deixando somente boas lembranças na “Rainha do Sertão”. Zé Panta, porém, indo a Maceió, lembrou de levar um presente para o ex-chefe. Preparou um bacorinho vivo e bateu à porta do engenheiro. Conversa animada vai, conversa animada vem, porquinho debaixo do braço. O engenheiro disse que não levasse a mal, mas não dava para aceitar o presente ofertado com tanta gentileza, porque ele estava vendo, morava em apartamento. Centros, fotos, cortinas, jarros... Enquanto isso, bacorinho estressado, grunhindo, querendo correr. Panta não se deu por vencido, despediu-se do amigo, desejou boa sorte e na hora de saída jogou o porquinho dentro do apartamento arrumado, dando o fora com passos de sete léguas.
     É notório que as religiões pregam “fazer o bem sem olhar a quem”. Não se pode dizer que é fácil realizar essa máxima porque a maioria dá com a mão direita para receber com a esquerda. Mas existem pessoas ─ e não são poucas ─ que trazem no sangue o prazer de servir. Conheci muitas dessas criaturas iluminadas que nada pediam em troca e ainda abençoavam de coração ao beneficiado com o “vá com Deus” de quem tem amor e só amor dentro do peito. Mas tem uns que servem, chicoteiam, desconfiam e tornam-se carrascos. Fazem lembrar o que estava na prisão por não poder pagar. Pede misericórdia é e atendido. Uma vez solto, vai cobrar do seu devedor que ainda não pode lhe quitar a dívida e ameaça-lhe bater e matar. Quer misericórdia, mas não oferece misericórdia. Outros querem só o benefício, mas nunca agradecem por causa da amnésia ignóbil que os guiam. Jesus curou quantos cegos? Quantos vieram agradecer? Muitos calam até diante de um elogio, de uma flor oferecida, de um copo d’água diante de tanta sede. Esgalhados faveleiros que não dão sombra nem encosto, deselegantes com pomares generosos. Dizia um político alagoano: “O pior defeito do homem é ser ingrato”. Por outro lado, muito mais virtude tem o que serve e logo em seguida esquece que serviu. Agradecer, por menor que seja o ato cortês, é bom e Deus gosta. Mesmo que seja um agradecimento embaraçoso como o de Zé Panta e seu PORQUINHO.


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