terça-feira, 24 de julho de 2012

A GARGALHADA DE LAMPIÃO


A GARGALHADA DE LAMPIÃO
Clerisvaldo B. Chagas, 25 de julho de 2012.
Crônica Nº 827


Capa de livro apontado no rodapé.
O que é que faz um indivíduo procurar o perigo quando estiver ameaçado por ele?  Foi o que aconteceu com o cidadão João Barroso no sertão alagoano, na segunda metade da década de 20. A passagem de Lampião por vários municípios, em 1926, provocou uma reação entre civis e um sargento, tendo se formado um grupo para perseguir o bandido. Com a inutilidade da ação, o grupo foi desfeito e tudo voltou à antiga rotina. Mas, certo dia João Barroso foi alertado pelo parente Adriano, que Virgolino estava babando para pegar alguns daqueles alistados para persegui-lo, inclusive, o próprio Barroso. Alertava Adriano que o bom mesmo era que João Barroso fosse embora do sertão que a coisa não estava boa para o seu lado. A qualquer momento, dizia Adriano, a fera poderia aparecer, surpreendê-lo e lhe tirar o couro das costas. O sertanejo marcado ficou muito pensativo, até porque Adriano era seguro coiteiro de Lampião e lhe contara vários detalhes do que sabia. Barroso não demorou a encontrar a solução. Fugir não fugiria. Pediu para que Adriano desse um jeito de jogá-lo dentro do bando para ele ficar como coiteiro também, naturalmente trocando o seu nome. “Não pode com eles, junte-se a eles”, deve ter pensado o homem advertido.
          Foi uma loucura para Adriano aceitar a ideia, mas assim foi feito. De repente João Barroso estava fazendo muito bem o papel de coiteiro de Lampião. A eficiência era tanta que passou a comprar víveres para o bando e até foi sondando pelo bandido para entrar nos negócios de armas. Pulou fora com toda diplomacia, alegando que não tinha cacife para tal negócio. Imaginava Barroso que arranjar armas para Lampião era ajudar o cangaceiro a matar gente. O maioral não falou mais no assunto. Certa feita, ao chegar à noite ao acampamento do bandido com víveres encomendados, Barroso deparou-se com uma cena em que uma mulher dava parte de um cabra que molestara a filha da mulher. Lampião tomou as providências, ocasião em que o cabra dizia não pertencer ao bando dele e sim ao de Corisco. Lampião, enraivecido com a resposta, disse muitas coisas pesadas ao comandado, depois ordenou que o cangaceiro Cobra Verde, fuzilasse o cangaceiro de Corisco.
          Barroso ficou chocado com o que viu, porém continuou na estratégia pela sua sobrevivência, driblando a espionagem das volantes. Adriano foi morto pela polícia. Certo dia aconteceu uma boa ocasião, para João Barroso dizer a verdade ao chefe do bando. Esperto como era, pegou o chefão de bom humor. Virgolino abriu a bocarra com a esperteza dos dois parentes e João Barroso viu o que pouca gente via: o encaixe no momento certo da intensa GARGALHADA DE LAMPIÃO.
·         Crônica baseada nas paginas 75-88, de “O cangaceiro Lampião e o IV mandamento” de Valdemar de Souza Lima.

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segunda-feira, 23 de julho de 2012

LAMPIÃO NO ROMANCE


LAMPIÃO NO ROMANCE
Clerisvaldo B. Chagas, 24 de julho de 2012.
Crônica Nº 826

Romance do ciclo do cangaço.
Lampião chegou de surpresa à fazenda de um amigo. Ali foi recebido como um governador dos mais amados pelo povo. Com um pequeno grupo de homens famintos e cansados, resolvera esperar pelos outros grupos que também convergiam para aquele ponto. O fazendeiro abateu um novilho; mandou buscar em Santana o melhor vinho que havia e distribuiu redes brancas à vontade. Os cangaceiros espalharam-se pelo alpendre da casa e pelas sombras das árvores do terreiro. Quando chegaram todos os grupos, já estava anoitecendo. O boi foi transformado em saboroso churrasco sobre um braseiro de angico e aroeira. Os cabras alegres, sob a força poderosa do vinho, improvisaram um conjunto, esquecendo o cansaço no encanto rústico do xaxado.
A lua espiou na boca do “grutilhão” e subiu majestosa, prateando a caatinga entorpecida. Mandacarus e facheiros recortavam-se à luz dos astros, como entes ciclópicos de vários braços. No alpendre baixo da casa, as sombras vindas da fogueira, contorciam-se à semelhança de fantasmas sem nomes, assustando os vivos. Era uma das mil faces do reino encantado do sertão. Parecia que os seres noturnos paravam para escutar as cantigas dos homens rudes e brutos.

Lampião quando chegou
Quilariando a candeia
O tenente correu tanto
Que ficou de carça cheia...

Foi nessa euforia toda, nesse desabafo sertanejo, que Virgolino tomou conhecimento da situação dos romeiros. Estava distante deles apenas meia légua. Comentou o caso com Maria Bonita, que lhe deu algumas sugestões. Olhou para a brincadeira dos seus homens e não desejou importuná-los.

O rife de Lampião
É feito só de metá
O sordado diz de longe
Que a peste é quem vai lá...

Logo pela manhã, o rei do cangaço chamou um dos seus homens:
─ Cobra Nova!
─ Às suas orde, capitão.
─ Quero que você me vá à fazenda do major Saturnino ─ disse à medida que limpava os óculos com um lenço vermelho ─ Tá me entendendo?
─ É pra já, capitão ─ respondeu o cabra, seco igual a bambu. (...)

·         (Páginas 103-104, do romance “Defunto Perfumado”, do autor. 1982. Edição esgotada).








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