segunda-feira, 23 de julho de 2012

LAMPIÃO NO ROMANCE


LAMPIÃO NO ROMANCE
Clerisvaldo B. Chagas, 24 de julho de 2012.
Crônica Nº 826

Romance do ciclo do cangaço.
Lampião chegou de surpresa à fazenda de um amigo. Ali foi recebido como um governador dos mais amados pelo povo. Com um pequeno grupo de homens famintos e cansados, resolvera esperar pelos outros grupos que também convergiam para aquele ponto. O fazendeiro abateu um novilho; mandou buscar em Santana o melhor vinho que havia e distribuiu redes brancas à vontade. Os cangaceiros espalharam-se pelo alpendre da casa e pelas sombras das árvores do terreiro. Quando chegaram todos os grupos, já estava anoitecendo. O boi foi transformado em saboroso churrasco sobre um braseiro de angico e aroeira. Os cabras alegres, sob a força poderosa do vinho, improvisaram um conjunto, esquecendo o cansaço no encanto rústico do xaxado.
A lua espiou na boca do “grutilhão” e subiu majestosa, prateando a caatinga entorpecida. Mandacarus e facheiros recortavam-se à luz dos astros, como entes ciclópicos de vários braços. No alpendre baixo da casa, as sombras vindas da fogueira, contorciam-se à semelhança de fantasmas sem nomes, assustando os vivos. Era uma das mil faces do reino encantado do sertão. Parecia que os seres noturnos paravam para escutar as cantigas dos homens rudes e brutos.

Lampião quando chegou
Quilariando a candeia
O tenente correu tanto
Que ficou de carça cheia...

Foi nessa euforia toda, nesse desabafo sertanejo, que Virgolino tomou conhecimento da situação dos romeiros. Estava distante deles apenas meia légua. Comentou o caso com Maria Bonita, que lhe deu algumas sugestões. Olhou para a brincadeira dos seus homens e não desejou importuná-los.

O rife de Lampião
É feito só de metá
O sordado diz de longe
Que a peste é quem vai lá...

Logo pela manhã, o rei do cangaço chamou um dos seus homens:
─ Cobra Nova!
─ Às suas orde, capitão.
─ Quero que você me vá à fazenda do major Saturnino ─ disse à medida que limpava os óculos com um lenço vermelho ─ Tá me entendendo?
─ É pra já, capitão ─ respondeu o cabra, seco igual a bambu. (...)

·         (Páginas 103-104, do romance “Defunto Perfumado”, do autor. 1982. Edição esgotada).








Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2012/07/lampiao-no-romance.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário