LAMPIÃO E O CABRA
ASSINALADO
Clerisvaldo B. Chagas, 16 de julho de 2012.
Crônica Nº 820
Para o saudoso escritor Raul Pereira Monteiro, santanense, mas radicado em Campina Grande, “Deus faz, o vento espalha e o diabo junta”, conforme o ditado popular. Falando salteado e sem datas, aquele autor de vários livros, diz do constrangimento a que foi submetido o seu avô diante da indesejável e maléfica presença de Lampião e Corisco à sua fazenda; crônica: “provérbio que se cumpre”, “Espinhos na estrada”, págs. 93-96, editora Caravela, 1999. Vivendo toda a sua vida na fazenda, situada no povoado Capelinha, então, pertencente ao município de Santana do Ipanema, Alagoas, seu avô recebeu uma estranha visita. Homem de bom caráter, filantropo e amável, escutou a conversa do fugitivo da Justiça que chegara ali com sua esposa. Confessando sua condição de réu e acrescentando desejos de reabilitar-se e viver vida decente e pacífica, o sujeito ganhou a confiança do proprietário e passou a trabalhar na fazenda. Tempos depois, o empregado despachava a consorte para as margens do rio São Francisco, alegando que a sogra passava mal e precisava dos cuidados da filha. Passaram-se alguns dias e o indivíduo falou que a sogra havia morrido e que seu espólio precisava de interessados. Partiu.
Mais a frente, o
fazendeiro recebeu aviso de um portador apressado e nervoso que Lampião se
dirigia àquela fazenda. A família pegou alguns objetos como esteiras, lençóis,
e ainda víveres e água e partiu para um esconderijo do outro lado do rio
Ipanema, pedaço de caatinga com mais de seis quilômetros quadrados. “E antes que anoitecesse, escolhemos o chão
mais macio e coberto de vegetação que nos amparasse muito bem das vistas
curiosas e sedentas do grupo latrocida”. Ao amanhecer, desse tempo de
verão, pensando em regressar, a família foi surpreendida por tiros próximos, pelas
presenças de dois cangaceiros e o ex-empregado, fugitivo da Justiça. “Fui obrigado”. A família foi agarrada,
extorquida e maltratada, até pagar um resgate (solicitado por empréstimo na
cidade através de um portador). Desgostoso com tudo, o fazendeiro mudou-se com
os seus para a cidade, mas continuou visitando a fazenda em fins de semana por
causa de alguns bichos de estimação. Não se tinha certeza se o ex-empregado
havia ingressado no bando.
Um dia,
no
final de julho de 1938, com a família já residindo em Santana do Ipanema, chegam
às onze cabeças dos bandidos mortos em Angicos.
Estávamos mirando
curiosamente as cabeças já muito intumescidas e olhos esbugalhados e vermelhos,
quando uma delas nos chamou a atenção, pela semelhança com o rosto do homem que
conosco morara na fazenda. Um sinal perto do nariz e uma pequena mossa na
orelha esquerda convenceram-nos de que o bando de Lampião o atraíra, inclusive,
para a morte agoniada na gruta Angico, sob o fogo cerrado de uma volante
policial alagoana.
Monteiro, então, desabafa:
Para mim "os semelhantes se atraem”, e por isso o nosso ex-morador fora ao lado do “Rei do Cangaço”, para cumprir a sua maldita vocação nos palcos infernais das caatingas nordestinas, como serpentes e feras bravias. Mas para o povo, de modo geral, foi o diabo que juntou o que Deus fizera e o vento espalhara.
Para mim "os semelhantes se atraem”, e por isso o nosso ex-morador fora ao lado do “Rei do Cangaço”, para cumprir a sua maldita vocação nos palcos infernais das caatingas nordestinas, como serpentes e feras bravias. Mas para o povo, de modo geral, foi o diabo que juntou o que Deus fizera e o vento espalhara.
Acho que Monteiro não disse o nome do avô pela vergonha e humilhação sofridas e, o nome do cangaceiro não saiu, possivelmente por que nem isso ele merecia. Fora Lampião, Maria Bonita, Enedina e Luiz Pedro, restaram Quinta-feira, Mergulhão, Alecrim, Moeda, Elétrico, Colchete e Marcela. Quem seria de LAMPIÃO O CABRA ASSINALADO?.
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