domingo, 4 de novembro de 2018

CARRITO, EVILÁSIO E PEDRO AGRA


CARRITO, EVILÁSIO E PEDRO AGRA
Clerisvaldo B. Chagas, 5 de novembro de 2018bom
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 1.999
 
IGREJINHA DAS TOCAIAS. (FOTO: LIVRO 230).
É bom e altamente produtivo pesquisar os mais velhos. Foi assim que ouvi Carlos Gabriel, o Seu Carrito, bodegueiro bem de vida da Rua Antônio Tavares, em Santana do Ipanema. Bigode, chapéu, magro elegante e de fala mansa, Seu Carrito gostava de contar fatos locais. Tinha vocação, sem saber, para historiador. Na Semana Santa o bodegueiro promovia festejos como pau-de-sebo e casa-de-urtiga. Chegava gente de bairros distantes para apreciá-los. Foi seu Carrito quem me ajudou sem perceber a contar a história em crônicas soltas e livros da igrejinha do Bairro São Pedro. Igreja esta Iniciada em 1915 e somente concluída em 1937, através do comerciante Tertuliano Nepomuceno.
Evilásio Brito, moreno, forte, dono de fabriqueta de calçados, comerciante, gostava muito de contar casos de valentia. Amigo de meu pai, narrava em voz baixa, olhando para os lados. Quase sempre o tema girava em torno de aventuras da região de Pão de Açúcar.  Foi através das suas narrativas que pude resgatar a história da Igrejinha das Tocaias, episódio santanense do tempo do cativeiro. A narrativa foi feita em cordel e, recentemente, saiu à segunda edição, por sinal, bem aproveitada pelas escolas da cidade. De memória privilegiada, gostava de transmitir as importantes observações de Pedro Agra.
 Pedro Agra, comerciante, alto, forte, também possuía memória invejável. Não tive oportunidade de aproximação. Mas o homem descrevia bem as primeiras famílias santanenses e todo caldeamento possível.  Havia outras pessoas que contavam bem a história da região, mas o comerciante Pedro Agra pelo seu conhecimento e lucidez parecia o mais importante de todos. Deu uma fortíssima contribuição aos irmãos Floro e  Darci Araújo, no livro: Santana Conta Sua História, informando famílias e gerações do nosso povo. Foi o responsável pela história da Igrejinha das Tocais, passada ao, então, Evilásio Brito e colhida por nós.
Estamos apenas tentando não deixar morrer na vida santanense, os nomes valorosos que ajudaram a cultura da terra.


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quinta-feira, 1 de novembro de 2018

ALUMIANDO A VIDA


ALUMIANDO A VIDA
Clerisvaldo B. Chagas, 2 de novembro de 2018
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 1.998
CANDEEiRO. (FOTO: ANALISE AGORA).

Dona Zifina cortava flandres. Fazia candeeiro. Seu Tô, com chapéu raro de Polícia Montada, retelhava casas; Salvino consertava sombrinhas; Silvino manejava o serrote: roc-roc; Pé-Espaiado era ferreiro; Zé Gancho trabalhava o Zinco; Otávio Magro vendia carne-de-sol e Dona Maria Néris rezava o ofício de Nossa Senhora. Manezinho Quiliu, vindo de Olivença, mexia com bicas; Gérson batia sola; Maria Lula vasculhava casa; Zé Preto negociava bugigangas; Seu Né cubava terras; Flora vendia esteiras; Seu Antônio e Seu Quinca eram alfaiates e, finalmente, Zé Limeira fazia malas. Não éramos uma Grécia, mas bem que a Rua Antônio Tavares e arredores funcionavam como tal.
Josefina, dona Zifina, de voz metálica e artesã dos flandres, confeccionava candeeiro, canecos, aros de óculos: Rats, rats, rats, trabalhava a tesoura pesadona nos dedos ágeis da avó de Oscar Silva, futuro escritor. E numa terra que passou quatro anos no escuro, o candeeiro, a placa, a candeia, eram bênçãos divinas nas noites tremendamente escuras do Sertão. Santana do Ipanema precisava do Ferreiro, era ali pertinho. O sapateiro, o barbeiro, o menino de recado... Tudo estava ao alcance de um grito forte de sertanejo. E assim deslizava o tempo tão devagar quanto o carro de boi de Lero Carreiro. E quando o vento forte fazia redemoinho, a meninada encintava o vento: “Rapadura! Rapadura!”.
Durante as noites de lua, gente nas calçadas enroladas em lençóis, contando histórias de Trancoso, de almas penadas, fazendo adivinhações, identificando as estrelas. O ferro em brasa nas janelas, levando as cinzas do carvão. Candeeiro aceso na força do querosene, do gasóleo. Aqui, acolá, a passagem tardia de um malandro de jogo; um sopro forte no ferro de engomar; Uma golada d’água da quartinha com tampa de pano bordado, na janela tomando fresca.
Benditas mãos que confeccionavam as candeias de latas e nos tiravam do escuro.

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