segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

 

CUTIA, PACA, CUTIA

Clerisvaldo B. Chagas, 27 de dezembro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

                                                         Crônica: 2.820




                                                       

Em solo sertanejo, geralmente uma confusão longa é iniciada com o ditado ainda em voga: “gente vai ver cu de cutia assoviar!”.  Ditado bastante antigo, citado até por pessoas que nunca viram uma cutia na vida, importando apenas o sentido em que a ira avisa que haverá bastante desassossego. Mas quem diabo inventou tão feio jargão?  E se o lugar tão sensível da cutia é capaz de assoviar, só quem conhece de perto o animal é capaz de saber. A paca é menor do que a cutia, são ambos roedores, ariscos e selvagens. Também não é do nosso tempo a existência desses bichos nas matas de Santana do Ipanema, bem como a ausência da Capivara. Isso faz lembrar a declaração de um amigo vigilante de escola que dizia criar duas pacas no quintal, na margem direita do rio Ipanema.

 

Mas o que chama atenção mesmo é o criatório de pacas e cutias numa fazenda em Minas Gerais. Com autorização do IBAMA, o criatório único com os dois bichos tem toda a assistência de profissionais que ajudam a desenvolver o empreendimento. Assim deveria ser com o mocó, o preá, a ema e veado galheiro, entre outros porque a extinção dos bichos selvagens caminha a passos largos. Todos querem experimentar o sabor de carne exótica, além de ajudar na preservação da espécie em criatório. Até as mulheres sensuais eram comparadas: “redondinha que nem uma paca! E quem quer criar clandestinamente, é um olho no quintal e um olho na Lei. A multa é pesada de tirar a calça pela cabeça além de possível prisão em flagrante.

Dia nublado e frio esse de Natal, em Santana do Ipanema, fomos quebrar a monotonia tentando fotografar os arredores. E nas ladeiras do Bairro São José em direção ao rio, o costume rural de criar aves à solta ainda permanece. Nos terrenos baldios, nos monturos, passeiam descontraídos os galináceos: pintos, galinhas, galos e até mesmo o guiné.  Vez em quando quem deseja leva uma galinha, mas esse criatório tradicional persiste indiferente ao furto. É ali mesmo sob a folhagem rasteira e o lixo caseiro jogado que os bichos reproduzem, crescem e se divertem. Vamos fotografando ainda, a beleza verde dos montes mais distantes, cercando as cercas de arame farpado que nada cercam. Mas dessas andanças em busca de coisa interessantes, nem notícia de capivara, cutia e paca.

 Dia monótono e profundamente triste. Até mesmo lúgubre.

PACA E CUTIA (PACA DE LATERAL BORDADA)

 

 


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domingo, 25 de dezembro de 2022

 

MERGULHÃO

Clerisvaldo B. Chagas, 26 de dezembro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.819

 



Chamando-nos atenção na internet, o mergulhão, pato selvagem, também faz lembrar as coisas do cangaço quando havia um cangaceiro chamado Mergulhão. Em nossa juventude pelas caatingas de Santana do Ipanema, víamos chegar aves selvagens nos barreiros e logo estavam deslizando nas águas em meio às chamadas, orelhas-de-burro. Mas nada de lembranças do pato selvagem Mergulhão. Tudo que aparecia era a chamada galinha-d’água ou marreca, que deve ser a mesma coisa. Ave simpática e pequena e que não sabemos se tinham o hábito do mergulho. Tem também o pássaro Martim e que muita gente o chama de Martin-pescador. Mergulha nos açudes a barreiros em busca de caçar o peixe da alimentação. Em Santana existe um sítio rural de nome Martins, porém, ainda não sabemos a origem do nome.

O pato selvagem mergulhão (Mergus octosetaceus) é parente de cisnes e marrecas e aprecia o habitat úmido do Cerrado, gosta de rios de planaltos e corredeiras. É uma ave elegante, bela, mas que atualmente se encontra em processo de extinção. Quando afirmamos acima nunca a ter encontrado na caatinga santanense, não quer dizer que a ave não tenha existido por aqui. Mesmo sendo típica de outros biomas, sempre surgem por essas bandas, inúmeras espécies de arribação. Chegam de repente e desaparecem como chegaram. E agora com o intenso desmatamento em todos os biomas, são sem conta as espécies nunca mais vistas como no passado. O pato selvagem também complementava o cardápio difícil do sertanejo. E agora como tudo é crime, é crime também se avistar um pato mergulhão onde quer que seja.

De qualquer maneira é muito gratificante, para o homem rural, acordar cedo e no abrir da porta, encontrar bando de pássaros diferentes fazendo algazarra nos arvoredos próximos. Assim também se enche de alegria a alma do caboclo ao deparar-se no açude, no barreiro, casais selvagens de marrecas, de paturis... De mergulhões. Na simplicidade dos campos toda singeleza enriquece a mente e volta o velho jargão dos humildes: “não tem dinheiro que pague”.

O tempo nesta véspera de Natal está nublado, frio e chovido, o que faz levar os pensamentos para sítios, fazendas, caatingas e povoados.

E mesmo levando em conta a extinção da espécie, quem não deseja um naco de pato assado na Ceia de Natal?!

Nem precisa ser do Mergulhão.

PATO MERGULHÃO (WIKIPÉDIA).


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