quinta-feira, 3 de agosto de 2023

 

GAMÃO

Clerisvaldo B. Chagas, 3 de agosto de 2023

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.939



 

O senhor Cariolando Amaral, dono de farmácia por muitos anos em Santana do Ipanema, era muito sério, porém grande folião em nossos carnavais. Usava uma permanente gravata borboleta que não era dispensada em nenhum momento do dia. Aliás, era a única figura da cidade, que conservava esse hábito antigo de elegância. Sempre estava entre o balcão da farmácia e a calçada, jogando gamão com seus parceiros cativos.  Quando foi construída a primeira pracinha de Santana, no largo, hoje, prof. Enéas, “Seu Carola”, como era conhecido, doou os três bancos de cimento sem encosto e, segundo testemunhas, para representarem suas três filhas pequenas, na Pracinha João Pessoa. Mas Seu Carola também se tornou delegado civil por um bom tempo e atuava na sua farmácia, primeiramente no “prédio do meio da rua”.

O que chamava atenção naquele estabelecimento comercial, era o busto de um negro forte, careca e lustroso, envergando uma barra de aço, propaganda de um remédio. Quando demoliram o prédio do meio da rua, ficou no solo da farmácia e na rua, um verdadeiro mar de bainhas de facas espalhadas. Com o tabuleiro de gamão em cima das pernas suas e do seu adversário, o jogo era constante. Copo de couro para misturar e jogar os bozós (dados) e as pedras de marcação que eram sementes de mulungu, grandes, vermelhas e belas, atraiam os olhares dos “perus”. E como crianças ou adolescentes, tentávamos adivinhar de onde vinham aquelas sementes tão bonitas.  Mas eram sementes dos tantos mulungus que havia na região periférica da cidade.

Dizemos sem certeza que a farmácia de Seu Carola se chamava “Farmácia Amaral”. Era o tempo em que as pessoas compravam muito maná e Seu Carola vendia bastante esse produto. A farmácia, com a demolição do prédio do meio da rua, passou a funcionar em um dos compartimentos comerciais do casarão da esquina, onde funcionou no primeiro andar, o “Hotel Central”, de Maria Sabão.  As partidas de gamão passaram a ser na sombra que fazia à tarde, na parte da escadaria do hotel. E como se dizia como forma de desprezo: “Gamão é jogo de velho...” Será que o gamão tinha o poder de driblar as mazelas da vida?

Ah, só se perguntasse ao negrão que torava aço na farmácia Amaral de Seu Carola!.

MULUNGU (FOTO: TEREZINHA TAVARES)

 


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terça-feira, 1 de agosto de 2023

 

FERVENDO

Clerisvaldo B. Chagas, 2 de agosto de 2023

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.938

 



       Há muito o mundo vem sabendo que se deve cuidar da natureza. De alerta em alertas nacionais e internacionais, prevaleceu em resposta o famigerado ouvido de mercador. A ambição humana não tem limites e, a procura pelo mais fácil, mais prático, mais barato, deu no que deu, primeiramente no Hemisfério Norte. As ondas de calor só podem ser comparadas a um castigo rigoroso da mão Natureza, pelos ataques contantes e insanos às coisas que Deus deixou no mundo para tornar mais agradável a permanência dos seus filhos na esfera carnal. O Globo bota as mãos à cabeça, faz conferência e mais conferências, aponta os erros alheios, depois as mãos no bolso. Assim, os incêndios, as enchentes, os deslizamentos, o vulcanismo, as invasões marítimas, as altas absurdas e proféticas da temperatura e tantas outras são catástrofes anunciadas que puxam com força as orelhas da humanidade.

        Terminamos o mês de julho no Sertão, dentro do previsto pelos profetas das chuvas, homens do campo que baseiam seus experimentos no comportamento das plantas, dos animais, dos astros, através de décadas e décadas seguidas. E esse mês que acaba de dá adeus, é normalmente o mais chuvoso dos nosso Sertão, mas foi agora de chuvas excessivamente moderadas, variando muito mais entre tempo nublado e sol entre nuvens. Não deixa mesmo assim, de ter sido um mês bom para a lavoura, porém, de armazenamento de água para o restante do ano, deixou muito a desejar. É claro que todo sertanejo, direta ou indiretamente depende das chuvas, agradecem a Deus por tudo, mas carregam uma interrogação permanente sobre o tempo.

       O El Niño foi anunciado, lá atrás, mas pelo visto, não foi levado muito a sério, pelos comandantes das nações, apesar dos seus efeitos assinados e carimbados quando sempre ressurgiu. Vai ser mais uma tacada grande no clima da Terra, independente das coisas que estão acontecendo com notícias diárias e assombrosas dos jornais. E, particularmente em nosso torrão, este mês de agosto vai acontecer como um grande revelador do que virá daqui para o fim do ano. O frio sim, esse não negou sua tradição no mês passado, indiferente às cores variantes do céu: chumbo, cinza, azul e marfim... O certo mesmo é que nada será como antes com o clima e suas influências. Ainda duvida, Tomé?

SANTANA AO AMANHECER (FOTO: GLEMILDA).

        

 


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