domingo, 6 de julho de 2008

Um Gênio na Feira


UM GÊNIO NA FEIRA
(Clerisvaldo B. Chagas-3.5.2008)

Alguém já disse que o governo deveria sustentar os artistas populares que viveriam para produzir o belo. Caso isso fosse concretizado, com certeza estaria na lista o cego pedinte das feiras nordestinas, Zequinha Quelé.
Criatura do Sertão alagoano, morador do sítio Travessão, Zequinha apresentava-se com o seu guia nas feiras de Santana do Ipanema e dos municípios circunvizinhos. Branco, simpático, cabelos curtos e lisos, o poeta-repentista mostrava-se bem vestido. A tiracolo usava embornal de mescla e em uma das mãos conduzia frenético ganzá de flandres. Angariava esmolas circulando pelas feiras, apoiado no ombro do guia. A outra mão agitava o objeto regulador musical da cachoeira de estrofes que jamais parava o jorro espetacular. Mandava o cliente para o céu ou lhe oferecia gratuita e vergonhosa reprimenda. Pedia versejando, agradecia versejando, perdoava ou não versejando. Às vezes o poeta agitava a mão de apoio perto da face, dando suporte ao ritmo do ganzá.
Zequinha Quelé, vate e gênio do povo, não teve a sorte de um Chico Nunes de Palmeiras dos Índios, pesquisado pelo ator Mário Lago.
Zequinha era poeta da segunda metade do século XX. A última notícia foi a de que estaria morando no município de Monteirópolis; mas isso há uns dois anos, aproximadamente.
Em São Paulo, encontrei-me com um cidadão — emigrante de Santana há três décadas — que me perguntou se Zequinha Quelé ainda era vivo. Em seguida narrou-me um fato que jamais lhe saíra da memória: O cego vinha pedindo na feira; pedindo e cantando; cantando e pedindo em alta velocidade. De repente alguém respondeu aos seus apelos: “— perdoe ceguinho, não tenho agora”. Quelé, imediatamente passando adiante, foi alertando ao desavisado no seu ritmo cachoeira:

“A bacia do perdoe
Deixei lá no Travessão
Sou homem não sou menino
Todo ser é assassino
Só meu padre Ciço, não”

A pesquisa está aberta. Da minha parte, foi o mínimo e o máximo que pude fazer pelo gênio esquecido; personagem marcante das feiras do meu estado.

· Especial para a ACALA e para o escritor Antonio Machado
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http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2008/07/um-genio-na-feira.html

Um comentário:

  1. Olá Prof. Clerisvaldo !

    Fui aluno seu, no Instituto Sagrado Família...Gostaria de saber como faço para adquirir seus livros.

    Um grande abraço!

    Carlos Malta

    carlfla@hotmail.com

    Maceió-Al

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