ODE AO RIO IPANEMA
(Clerisvaldo B. Chagas-2.10.2007) Especial
Era um imenso e formidável lastro. Um paizão de 220 km coleantes entre Pernambuco e Alagoas.
Os desbravadores logo perceberam que o rio Ipanema — mesmo temporário — representava palpitações de vida. Uma veia grossa que irrigava todo o corpo sertanejo. E o pai amigo, generoso e bom, logo presenteou o semi-árido com uma cidade morena, dourada, plena de Sol e ornada de colinas, chamada Santana.
As águas vivas sobre areias, as águas serenas sob as areias, as agitações supremas de cima, as quietudes divinais de baixo, o tempero salobro da ribeira, mataram a sede da “Rainha do Sertão”. E o rio gritou bem alto: — “Façam as casas, eu dou a areia; fabriquem os tijolos, eu cedo o barro verde; definam seus tetos, eu contribuo com argila; lembrem dos alicerces, eu tenho pedras milenares; tragam os animais, usem meus pastos; provem dos meus deliciosos peixes; e... Quando estiverem cansados do trabalho dignificante, durmam sobre colchões e descansem com os travesseiros dos meus juncais.
E as espumas desciam das roupas sob lindos cânticos das lavadeiras caboclas; os dorsos robustecidos submergiam nas águas turvas; e o sopro da leve brisa amenizava o suor negro dos corpos noturnos e nus.
Grita Santana, teu nascimento! Berra Santana, tua expansão! Enfeita teus aromáticos cabelos com a flor da craibeira. Embala teu berço com o sussurro do Cruzeiro, com a lenda da caipora, com o doce murmúrio dos regatos em mês de julho.
Silêncio que esvoaça o gavião; câmara natural que filma e comanda os céus de borboletas e bem-te-vis. Olhos mágicos que perscrutam o Panema, e a flora, e a fauna, e o relevo privilegiado do lugar. Sentinela altivo das paixões, dos amores... Dos queixumes do povo santanense.
Deus fez o Ipanema, o Ipanema fez Santana. E Santana observa seu criador pelas frestas das portas, pelos rachões das janelas, pelas varandas de aroeiras... Pelo mormaço das tardes preguiçosas ou pela íris da mulata no cio.
Erga-se meu herói sertanejo, que o astro-rei traz a luz no oriente; que os matizes do azul marcham no firmamento. Ecoaram as trombetas dos pardais.
Breve, breve, minha cidade estará de pé: bênção, meu Panema. Deus
nos ilumine neste novo dia.
Para os escritores Marcello Ricardo de Almeida, Antonio Machado, Carlindo de Lira Pereira, Aleixo Leite Filho e meu amigo Gilson Farias. Aos escritores de Blumenau.
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