quinta-feira, 17 de novembro de 2011

ENTRAR NA CATINGUEIRA

 CANGAÇO E VOLANTES
Entrar na catingueira
Clerisvaldo B. Chagas, 17 de novembro de 2011

Pela fama do cangaço que escorria pelos jornais da época e pela boca do povo, foi surgindo o mito Lampião. Só ultimamente os pesquisadores começaram a valorizar as ações dos verdadeiros heróis esquecidos das caatingas. Homens brutos como os cangaceiros, conhecedores da geografia, da fauna e da flora regional. Muitos ganhavam pouco e passavam meses para receber o soldo; compravam seus próprios uniformes e amedrontavam tanto quanto os bandidos. Enfrentando as adversidades da natureza e sociais, esses perseguidores de cangaceiros, muitas vezes passavam semanas dentro do mato, sujeito às cobras, às formigas, às onças, lutando contra sede, fome e emboscadas que ceifaram a vida de tantos defensores da sociedade. Antes havia apenas poucos soldados nos destacamentos de algumas cidades interioranas. Depois surgiram as chamadas “forças volantes” com a exclusividade de combater o cangaço. Várias forças volantes foram criadas nas áreas de atuações de cangaceiros como Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba, Alagoas, Bahia, Sergipe e Pernambuco. Inúmeros comandantes dessas forças ficaram famosos e somente nos últimos anos, exaltados por escritores, talvez cansados de apresentarem somente Lampião.
Brilharam na campanha muitos guerreiros do governo até mais valentes do que Virgolino e por ele mesmo, admirados e respeitados. É o caso de homens da estirpe de um Manoel Neto, de um José Rufino, dos irmãos Flor e outros dignos no Sertão do título de “Homem Macho”. As volantes também tinham momentos de felicidades, tristezas e situações inusitadas. Certa feita, ocasião de seca e fome mexia com os nervos das tropas do tenente João Bezerra da Silva. Viajando a pé, em coluna, Bezerra foi atraído por uma discussão travada entre dois volantes. “Filho de uma puta para lá, filho de uma égua para cá; sustente o que disse!” e o apelo imediato às armas. O tenente ordenou a entrega dos fuzis, pelos dois valentões. Em seguida, sem pronunciar uma só palavra, pegou o facão, entrou no mato e saiu com dois bons cacetes de catingueira, arbusto Família: Leguminosae (Caesalpinia pyramidalis). Entregou a cada soldado briguento, um desses pedaços de pau e disse: “Pronto, podem se matarem! Menos com fuzil”. Como diria a minha avó: foi o santo remédio! Os dois enjoaram de vez a arenga besta que poderia terminar em baixa. A partir daquele momento, quando dois desinformados queriam arengar, os mais experientes diziam: “Tão esquecidos dos dois cacetes seus fios da peste! Querem entrar na catingueira?”
 Não sei dizer os nomes dos soldados do tenente João Bezerra. Talvez um se chamasse Adair. O outro pode ter sido Lupi. Mas que momento tão bom para ENTRAR NA CATINGUEIRA!





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terça-feira, 15 de novembro de 2011

FALTANDO TIRA-GOSTO

FALTANDO TIRA-GOSTO
Clerisvaldo B. Chagas, 16 de novembro de 2011

Gostei e ri bastante com a reportagem de Juliana Sayuri, com o título “Bebendo história”. Juliana fala sobre um arqueólogo que, rastreando bebidas milenares conseguiu recriar, pelo menos cinco tipos de cervejas. Olhando direitinho, o mestre cervejeiro, Patrick McGovern, teve uma paciência tão grande quanto à do personagem bíblico, Jó. Duas décadas rodando o mundo em busca das suas convicções, mostra que o homem é persistente mesmo e amante da “lourinha suada” que, para ele, transformou-se em “garota” de várias cores. McGovern saiu recuperando receitas em suas investidas, usando as técnicas de escavações e o aprendizado em análise de vestígios de bebidas. Quer dizer, coisa muito mais elevada de que o faro finíssimo dos melhores detetives. Diz a citada reportagem que foi recuperada receita de até nove mil anos. O mel é sempre um dos ingredientes da “geladinha” que deve ser uma delícia, degustada na varanda de casa, sob as árvores da fazenda ou mesmo naquela roda bebança de amigos. Diz ainda Juliana, que o arqueólogo Patrick McGovern é diretor científico do Laboratório Arqueológico Biomolecular do Museu da Universidade da Pensilvânia. E que o cidadão teria firmado acordo com a cervejaria Dogfish para criar a linha Ancient, só de cervejas milenares.
Ô! Meus velhos amigos sertanejos! Quanto vale uma garrafa dessa cerveja dos tempos do antigo Egito? Você pagaria quanto por um cervejão desses? Que sacrifício do senhor Patrick, para degustar suas fórmulas! A mais antiga seria a de 7.000 anos a. C., achada em uma vila chinesa. Malte, arroz, mel e uva, 10% de álcool, combinação doce à azeda de nome “Chateau Jiahu”. Mas tem também a “Theobroma”, do Peru à base de cacau; a “Ta Henket” e a “Midas Touch”. Sei não! Mas para quem gosta de uma birita aos domingos, acho que esse pesquisador seria muito aplaudido no Brasil, onde a disputa pela “pólvora amarela” não cansa nunca. Bebe-se na rua, em casa, nos bares, nas praças, na pescaria, no aniversário e até em nascimento de menino e velório de padre velho. E esse costume de beber tudo que se encontra pela frente, imagine! Vem da antiguidade, irmão! Agora pense nos diversos apelidos da branca e da loura nas bodegas da Índia, do Egito, da China... E os imortais degustando de taça em taça, de copo em copo, até chegar ao sacrificado Brasil de Cabral!
Geografia, Arqueologia, Geologia, todas agradam a minha vocação natural com certeza, mas ainda não tinha pensando nessa ramificação “bebedoresca” do eminente arqueólogo da Pensilvânia. Sinto não poder chegar a seu escudeiro assistente, quando poderia criar a ramificação arqueológica dos petiscos. Quais seriam os salgadinhos usados pelos nossos antepassados? Amendoim, ovo de codorna, torreiro? De qualquer maneira uma excelente cerveja mumificada de 7.000 anos, já está de bom tamanho! Vamos aplaudir o homem, mesmo com a danada geladinha FALTANDO TIRA-GOSTO.





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