terça-feira, 7 de junho de 2016

OS OSSOS DO SANTO



OS OSSOS DO SANTO
Clerisvaldo B. Chagas, 08 de junho de 2016
Crônica Nº 1.528
SANTO ANTÔNIO
Em Santana do Ipanema, médio Sertão alagoano, teve início às festividades alusivas a Santo Antônio. Santo Antônio passou a ser o padroeiro do Bairro Floresta, zona sul da cidade. Seu povoamento segundo o livro o Boi, a Bota e a Batina, História Completa de Santana do Ipanema”, da nossa autoria foi proporcionado pelos imigrantes da zona rural. Suas terras ainda estavam desvalorizadas, por serem periferia e se situarem na margem do rio Ipanema, oposta ao comércio. Nem ponte havia!
Recentemente o Bairro Floresta foi escolhido para a construção do Hospital Regional que recebeu o título de Dr. Clodolfo Rodrigues.
Defronte o hospital está sendo construída também, a UFAL cujas obras por muito tempo estavam estagnadas. É de se notar, todavia, que após a edificação do gigante da colina, benefício algum foi realizado no Bairro. Sequer o alargamento do acesso aquele lugar foi cogitado. O hospital atende mais de 30 municípios, mas o acesso é estreito e ainda à base de paralelepípedos. Malgrado seu grande potencial para o turismo, nada, nada... Nada. No alto da colina, sítio do hospital, avista-se o centro num belíssimo cenário que também abrange a Reserva Ecológica Tocaia, o rio Ipanema e parte de várias elevações que circundam a cidade como a serra Aguda, Camonga, Macacos e outros mirantes naturais.
O abandono ao bairro Floresta atravessa décadas de administrações do município. A pobreza e o descaso são chocantes nos conjuntos habitacionais como o Cajarana, por trás do prédio hospitalar. Durante a noite, o bairro vira zona de risco.
Pois bem, Santo Antônio tornou-se protetor do Bairro e estar sendo louvado com novena, palestras e foguetórios. Santo Antônio é um santo muito prestigiado pelo céu. Além disso, é muito querido no Nordeste brasileiro e dado a milagres aos que a ele recorrem. Mas Santo Antônio sozinho não pode fazer muita coisa pelos seus protegidos.
Diante das circunstâncias, do abandono e do desprezo administrativo de eras, é bom pensar. Ofertaram tanto filé ao Bairro Monumento e jogaram os ossos a Santo Antônio, isto é, ao Bairro da Floresta.
O pobre no mundo continua servindo de cachimbo
Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2016/06/os-ossos-do-santo.html

segunda-feira, 6 de junho de 2016

O CORONEL VIU



O CORONEL VIU
Clerisvaldo B. Chagas, 7 de junho de 2016
Crônica. Conto Nº 1.527
(Para a sensibilidade do escritor Fábio Campos)

Ninguém sabe a quem tinha puxado o coronel Petró. Os pais eram muitos religiosos, exemplos de vida. Moravam em outro lugar e não cansavam de rogar pelo filho. Mas Petró era um desastre. Bastante perverso, o infeliz. Quando se aborrecia com alguém, das duas uma: ou o cabra entrava na macaca ou na boca do rifle 44. Havia um medo geral do coronel, na região. Mas, debaixo da canga, pescoço abaixado, os habitantes não reagiam.
Certa feita, durante a hora da sesta, o coronel dormitava dentro de casa e os capangas no alpendre. Petró foi acordado por uma suave sacudidela na rede. Viu diante de si, uma jovem muito bonita, toda trajada de branco. Assustou-se e indagou:
Quem é você?
Boa tarde, coronel. Eu sou mensageira do Pai Maior. Ele é muito poderoso e mora longe daqui, já ouviu falar?
Nunca, nunca! E o que ele quer comigo indagou arrogante.
A sua fama chegou até lá, coronel. Pai Maior resolveu enviar para o senhor, quatro presentinhos. Eu os trago nesta sesta de palha.
Mas que diabo está acontecendo?! Mostre-me isso.
A moça abriu a pequena sesta e mostrou uma caixeta azul que parecia uma caixinha de aliança, muito brilhante, e disse:
Aqui tem uma essência rara chamada Sabedoria. Este é o primeiro presente que o senhor pode usar, se quiser. E se não quiser usá-la, também não precisa usar os outros presentes.
O coronel pegou a caixeta, ficou fascinado pelo brilho e, a revirava sem saber que material era aquele e sem saber como abri-la.
A moça pegou, então, na sesta, a segunda caixeta, semelhante à primeira, mas de cor verde. Disse:
Esta aqui, coronel, contém uma essência importantíssima; chama-se Tolerância. O senhor só deve usá-la se sentir os primeiros efeitos da primeira.
Petró abriu a boca, incrédulo, mas não emitiu som nenhum.
Então, a moça, da mesma maneira, apresentou outra caixeta gêmea, amarelada e falou:
─ Quando o senhor estiver bastante acostumado com as duas anteriores, pode usar esta terceira essência que se chama: Perdão. E aqui está o último presente, essa caixinha vermelha que contém a penúltima essência da terra. É a mais importante de todas e se chama Amor.
O coronel Petró reagiu e conseguiu indagar:
─ Como posso abri-las se não vejo trancas? Como usar essas essências, moça.
Ela respondeu docemente:
─ O senhor pode abri-las através do pensamento. O modo de usar já vem gravado dentro e o senhor, se quiser, logo descobrirá.
Missão cumprida, até outro dia, coronel.
─ Mas a senhorita já vai? Não quer me dizer seu nome?
A moça deu às costas, começou a sair de dentro de casa e, já no final do alpendre, voltou-se para o coronel, estupefato, e disse:
─ Eu me chamo Misericórdia. Sou a última irmã da minha família.
O coronel Petró viu aquela alva figura se afastando pelas suas terras até desaparecer completamente na porteira da fazenda.

Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2016/06/o-coronel-viu.html