segunda-feira, 8 de agosto de 2016

SEU OSÉAS, TEM PUXA?

SEU OSÉAS: TEM PUXA?
Clerisvaldo B. Chagas, 08 de agosto de 2016
Crônica 1.557

Foto: (Cozinnhanatureb)
Da feira não gostava, mas amava os seus produtos. Afinal, quem do sertão nordestino rejeita um “tijolo” de jaca, de raiz de imbuzeiro, uma broa macia ou o quebra-queixo com amendoim e castanha? Pode também ser um bolo de mandioca ou a malvada morosilha. Mas lá no Ginásio Santana não havia nada disso, somente na feira do sábado, camarada. Perto do Ginásio havia sim, a bodega de Seu Oséas na esquina do Bairro Monumento. E entre uma licença ou outra do Curso de Admissão, vamos nós à esquina do homem que vendia puxa. A puxa nada mais era de que um doce comprido, torcido e enrolado em papel manteiga. Por um lado parecia um macarrão, cuja espessura não chegava a um dedo mínimo. Não era doce demais e ligava nos dentes que era uma beleza. E assim, na falta das guloseimas da feira, a bodega fazia a felicidade da meninada.
Tem puxa, seu Oséas?
Ora, após tanto tempo fui descobrir numa banca em Maceió, a tal da puxa santanense. Estava lá, bem no cantinho do tabuleiro, para minha incredulidade. Rodeei a banca, rodeei a mulher e, com vergonha de estar enganado apontei com o dedo perguntando o que era aquilo. A lembrança trazia a voz suave do homem da bodega, a marca de uma meia lua na face e um bigode caprichado.
Na banca, era o mesmo o produto suspeito, igual nomenclatura, mas não sei afirmar sobre o sabor. De repente me vi indagando ao bodegueiro educado de Santana:
- Seu Oséas, tem puxa?
A sua resposta lembro claramente. Mas havia seu sogro que às vezes despachava também. Agastado, nervoso, puxando uma perna, talvez não desse resposta igual ao titular. Como vivia sempre a remoer a situação do país, imagino uma resposta nunca dita, mas...
- Seu Artur, tem puxa!
- Puxa mesmo, acabou, mas tem ladrão feito à peste!



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domingo, 7 de agosto de 2016

MÊS DE AGOSTO


MÊS DE AGOSTO
Clerisvaldo B. Chagas, 08 de agosto de 2016
Crônica 1.556
À memória de meu pai

Ilustração (aquietrenosblog.)
Agosto vai furando o tempo com sinuosidades e superstições.  Mês dos cachorros doidos, da pesca ruim, das tragédias políticas e dos desgostos. Cada um com suas convicções guardadas repletas de experiência. No Sertão, vão-se as últimas “tamboeiras” de um inverno triste, cansado, extenuado. Um verde pálido que refresca os olhos, mas destempera a alma. Na capital, nuvens passageiras que derramam valsas nas manhãs indecisas. E os sonhos persistem entre edifícios, vielas e colinas. Montados nas selas de agosto, poetas correm no prado entre turquesas e esmeraldas. E os ares de mar se alevantam e se bandeiam rumo aos agrestes, às matas, aos sertões. Perscrutando os rumos, carcarás sobrevoam os quipás, alastrados, facheiros e mandacarus. Rumo norte, rumo sul, folhas secas cabriolam, sopradas, empurradas, degustadas pela brisa vespertina. Na bucólica paisagem sertaneja, risca os ares o som irritante e vitorioso de gemidos. Gemidos de cocões arrochados de carro de boi.
Na folhagem escura do juazeiro, soluça a fogo-pagou. Ergue-se o mocó em duas patas farejando os arredores. E pelas quebradas... Ah! Pelas quebradas balança as galhas das faveleiras com o aboio tristonho do vaqueiro. Calam-se aves e pássaros a ouvir os lamentos do encourado. O céu muda constantemente os cenários sobre vales e serranias. Pasta feliz o gado na beira do açude indiferente às previsões do mês. No final do cercado, lá no final do cercado, na matinha de angico e catingueira murmura um riacho cristalino louvando à fonte.
A mão de Deus também afaga com a mesma meiguice, meu pai, o mês em que nascestes e dele sentia orgulho. É o próprio homem quem estigmatiza o dia, o mês, o ano.

Parabéns Manoel Celestino das Chagas, estejas onde estiverdes, pois a outra dimensão também deve ter o seu mês de agosto.  

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