terça-feira, 8 de outubro de 2019

NA GRANDEZA DA SIMPLICIDADE


NA GRANDEZA DA SIMPLICIDADE
Clerisvaldo B. Chagas, 8 de outubro de 2019
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.195
CARRO DE CARNEIRO. (FOTO: PREFEITURA/DIVULGAÇÃO).

Caminhando pelas trilhas sertanejas, não nos escapam as margaridas do campo, as folhas orvalhadas, a saudação maviosa dos pássaros selvagens ou os rastros identificativos da fauna. Longe dos palácios, dos ouros incrustados, da ambição desumana, descobre-se e bebe-se à vontade a simplicidade da Natura na mão do Criador. Surge a reflexão da nossa jornada e o sinal verde para os passos do caminhante. Muitas vezes o homem humilde também faz parte da moldura de quem enxerga, porque a soberba não identifica o singelo que orna a existência.
E de repente surge na estrada um artesanato vivo. Carrinho de carneiro, cópia fiel do carro de boi. Conduzindo pequena carga, as duas parelhas são conduzidas pelo carreiro com o mesmo traje adulto e seus acessórios. No carrinho está a obra prima do artesão: mesa, eixo, fueiros, chedas, cabeçalho... E os carneiros com os mesmos arreios dos bovinos. Trela, sininho, correia e muito brilho. Ali está o cambão, ligando a parelha da frente à do coice. No último fueiro vai o azeite para a cantoria do eixo, dentro do chifre pendurado. À frente o condutor – chapéu de couro de bode, facão de arrasto e vara de ferrão – parece uma criança feliz ao conduzir o seu briquedo. A vontade de quem vê a cena é de colocar carneiros e carrinho no colo e embalar.
Mas aquele carrinho de carneiros não é fato isolado. Você encontra vários na região de Olivença, São José da Tapera e Poço das Trincheiras, onde existe até festival no sítio Saco do Ramalho. Também existem carro de bode e até de jumento. Durante a Festa do Carro de Boi, no alto sertão de Inhapi, os carros mirins fazem questão de acompanhar o desfile dos grandes até aquela cidade para o magnífico Encontro dos Carreiros. Uma promoção rural entre sindicato e prefeitura com repercussão nacional. Você poderá apreciar carro de carneiro com até oito parelhas e vibrar com o tradicionalismo e as coisas mais simples do sertão.
Ô mundo véi de meu Deus!
Ô Nordeste nosso mundo!




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segunda-feira, 7 de outubro de 2019

NÃO TRABALHA QUEM NÃO QUER


NÃO TRABALHA QUEM NÃO QUER
Clerisvaldo B. Chagas, 7 de outubro de 2019
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.194
EM CACHOEIRINHA. (FOTO: G1).

Foi retornando de Garanhuns que eu conheci a cidade de Cachoerinha. Fiquei sabendo que ali era a Terra dos Arreios. Demorei muito pouco na urbe, mas em Santana do Ipanema, um fabricante me disse que vendia seus produtos naquele lugar. Dizia mais: “Produto ruim não chega a Cachoeirinha. Ali é a Capital dos Arreios do Brasil, professor. Vem gente até de Goiás comprar arreios de couro os mais diversos, em Pernambuco. Outra coisa, meu mestre, todo o mundo trabalha e ninguém vê um só vagabundo na cidade. Caso o senhor veja alguém pedindo esmola, é gente de fora, de passagem”. Fiquei satisfeito porque o santanense fornecia para um mercado exigente e quando soube que ali não havia desempregado.
De outra feita, tive a mesma sensação de boa notícia na região do baixo São Francisco. Com uma turma de alunos fomos conhecer o ciclo do peixe no vale do Marituba, Alagoas. Depois passamos para o lado sergipano, em visita a Propriá. Foi um excelente achado, quando nós sertanejos conhecemos outro cenário. Região natural chamada até de pantanal alagoano, água de irrigação à vontade e o trabalho de criação com seu ciclo completo, até a venda. Tudo nos impressionou, inclusive os peixes reprodutores, touros da água entre doze e treze quilos. Força descomunal. Foi ali que ouvi a repetição da frase do santanense fabricante de arreios, saudoso José Henrique. Disse-me um dos trabalhadores: “Aqui, professor, só não trabalha quem não quer”.
Viagem proveitosa cheia de novos conhecimentos, mas para nós, a vitória da região sobre o desemprego soava mais forte de que tudo. E quem conhece compara. Por que em algumas cidades não falta emprego e em outras o desemprego é lei? Vemos nas periferias de cidades sertanejas, particularmente, uma pobreza que faz dó. Na zona rural o pobre ainda cria um porco, uma cabra, meia dúzia de galinhas... Mas o pobre citadino nem possui o animal nem o lugar de criação. Se houvesse interesse dos gestores, nas quatro zonas da cidade seriam criados empreendimentos para absorver a mão de obra local. Todos empregados não haveria miséria. E por falta de um real ganho no trabalho, deixa-se de comprar uma cocada. Deus não quer a miséria, mas a responsabilidade dos DONOS dos municípios.



 

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