domingo, 16 de agosto de 2020

 

EU E O SENHOR DOS MUNDOS

Clerisvaldo B. Chagas, 17 de agosto de 2020

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.366

 

(ILUSTRAÇÃO: B. CHAGAS)

Ajeitei o chapéu de massa, aprumei o bornal e dei início a caminhada pela trilha. A meta era chegar ao topo do monte por veredas desconhecidas. Encontrei a primeira inclinação e subi por ela entre a vegetação de porte. Depois de muito andar subindo por aquele caminho estreito, parecia que eu estava só no meio do mundo. Eis que de repente avistei um homem alto de longos cabelos examinando os frutos de uma árvore. “Que bom! Alguém para me informar”. Fiz o cumprimento de praxe e o homem me perguntou: “Está indo para onde meu jovem?” Respondi: “Estou fazendo caminhada com destino ao topo, mas não sei se é por aqui.  Pode me indicar o caminho? Quem é o senhor?”. Eu achava que fosse um morador da serra, mas ele me respondeu: “Jesus, eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Um forte arrepio doce percorreu todo o meu corpo, da cabeça aos pés.

“Venha, dê-me sua mão”, disse ele. Dei a mão automaticamente como se tivesse hipnotizado. Não consegui mais dizer nada. Senti me descolar do chão, flutuar com ele e subir a trilha como pássaro voando baixo, sem parar, até o cume. Lá em cima ele largou minha mão e disse: “Contemple quanto é belo esse panorama que você queria ver”. Ainda sem conseguir falar, escutei sua palestra sobre outras coisas até que ele disse: “Quero que você faça um cruzeiro de madeira e o coloque exatamente aqui”. Deu-me a metragem da cruz, disse o tipo da madeira, a profundidade do buraco e a metragem que deveria ficar soterrada. Após, mandou preencher o buraco com concreto e deixar um entorno na cruz para visitantes cansados descansarem da subida.

Depois, o Senhor indagou se eu tinha dúvidas. Respondi que não. E Ele: “Você me promete?” Falei pela segunda vez: “Mestre, prometer eu não prometo, prometo apenas tentar”. Ele nada respondeu, apenas disse que quando tudo estivesse como ele pediu, voltaria para um exame. Despediu-se e sumiu da minha vista. Eu me  belisquei por todo canto para ver se era verdade tudo aquilo. Desci a serra trêmulo de medo e de ansiedade.

Providenciei tudo que ele me pediu, com um carpinteiro. Contratei pessoas para transportar o cruzeiro de madeira de lei. O braço da cruz foi pregado lá mesmo no topo. Após tudo terminado, voltei lá sozinho, uma semana depois. Quando cheguei ao topo, o mestre já estava lá, sentado e contemplando a paisagem. Ele deu-se por satisfeito e eu apenas perguntei: “Senhor, eu posso plantar um pé de rosas vermelhas no pé da cruz?” Ele disse: claro que pode, mas medindo cinco metros à direita”. Eu havia levado a muda e fiz como ele mandou. Daquele dia em diante nunca mais fui o mesmo na  minha vida.


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quinta-feira, 13 de agosto de 2020

 

A LENDA DO JABOBEU

Clerisvaldo B. Chagas, 14 de agosto de 2020

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.365

Construção de ponte, cabeça e evolução da obra. (Fotos: Livro 230/Domínio público.).


Quando a Ponte General Batista Tubino (interventor do estado de Alagoas) foi construída sobre o rio Ipanema, a margem direita do rio era despovoada. Somente mato, estradas carroçáveis e uma ou outra casinha isolada aqui e ali. Foi essa ponte que em 1969, uniu o Comércio de Santana com o outro lado da corrente aquática Graças a ela, a margem direita rapidamente foi povoada e até hoje continua em expansão. Assim como o “prédio do meio da rua” e o “sobrado do meio da rua”, foram demolidos no governo Ulisses Silva, o “Poço dos Homens” também foi golpeado a 20 metros da ponte que chegava. A aproximação do progresso espantou os banhistas e o poço ficou abandonado até a presente data.

O mais famoso poço da cidade ficou imortalizado em nosso livro “Ipanema, um Rio Macho”. Ali tomaram banho maloqueiros, vagabundos, empresários, políticos, comerciantes e muito mais. Porém, esse grande lugar de lazer do povo santanense, sempre engoliu pessoas. Lembramos que antes da ponte contamos mais de vinte banhistas afogados no poço entre o “Estreitinho” e o “Largo” que funcionavam, como divisória. Os mais velhos falavam da “lenda do Jabobeu ou Zé Belebebeu como chamavam os meninos. Segundo essa lenda, Jabobeu teria sido, talvez, o primeiro afogado do poço e, de vez em quando ele vinha puxar na perna de um dos banhistas, matando-o por afogamento também. Os pais não gostavam que seus filhos fossem tomar banho no Poço dos Homens.

A Ponte General Tubino foi construída com a murada de proteção muito baixa. O degrau estreito de pedestres continua imprensando pessoas entre a baixa murada de proteção e o forte trânsito de todas as qualidades de veículos que trafegam de uma a outra margem. Como no antigo Poço dos Homens, vez em quando pula da ponte um suicida para as rochas do rio seco. A ponte é uma espécie de Edifício Breda, escolhida para o suicídio. Nunca foi levantada a murada de proteção, nunca foi alargado o degrau dos pedestres. Como na ponte Cônego José Bulhões, casas comerciais avançam tomando conta do leito do rio provocando tragédias como a da última cheia.

Continua ativa a lenda do Jabobeu, quando não puxa a perna no Poço dos Homens, puxa tudo de uma vez da ponte general Tubino.

 


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