terça-feira, 27 de dezembro de 2022

 

NO TEMPO DA CACHAÇA

Clerisvaldo B. Chagas, 28 de dezembro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.821


Vamos escrevendo para uma cidade sem memória e uma juventude que não encontra a história do município. Com essa conversa atual de rota da cachaça, em Alagoas, lembramos mais uma vez que tivemos uma cidade fabril, inclusive com fabriquetas de aguardente. O senhor João Aquino tinha uma fábrica de refrigerante, “Guaraná Globo”. O senhor Júlio Pezunho tinha uma fábrica de colchões, o senhor Antônio tinha uma fábrica de vinagre. No bairro Floresta havia uma fábrica de cordas. Três fábricas de calçados, uma fábrica de bolos e duas fábricas de carne-de-sol. Quanto ao fabrico da aguardente, em Santana do Ipanema, servia bem para abastecer o mercado local. Quanto a qualidade, nunca ouvimos falar sobre se o líquido era bom ou ruim.

Na esquina da Travessa Antônio Tavares para a Rua Nova, casa comprida de Manoel ou José Lopez, dizia o povo que se produzia cachaça.  No comércio, muito mais abaixo da igrejinha de São Sebastião, o irmão do padre Bulhões, Antônio Bulhões mantinha uma fábrica de cachaça e fazia as entregas no caçuás em lombo de jumento. Por trás da atual Loja Maçônica, “Amor à Verdade”, havia a destilaria do senhor Sinval, morador da rua Nova, jovem ainda, bigode a Castro Alves e que gostava de recitar poesias do poeta Zé da Luz. Algumas dessa fabriquetas de aguardente também produziam vinagre. Ainda não vivíamos o auge de marcas de aguardentes famosas e fabricada em larga escala pelo estado vizinho de Pernambuco, mas já se falava numa tal de “Azuladinha das Alagoas”.

Quanto a fruta jurubeba, produz uma bebida também chamada jurubeba e está incluída nas bebidas alcoólicas do estado. Embora houvesse muitas plantas nativas jurubeba na região de Santana do Ipanema, a bebida era importada e de cunho popular. E nas margens da rodovia Palmeira dos Índios – Arapiraca, via Igaci, proliferava a planta jurubeba ao longo de toda rodovia. Surgiu uma fábrica no distrito Canafístula, Palmeira dos índios, cujo depósito de madeira era tão alto que parecia uma louvação à bebida. Tempos depois fomos visitá-la, mas a fábrica de jurubeba havia cerrado suas portas.

Atualmente se fala muito em rota da cachaça na região agrestina, porém, Santana do Ipanema não possui mais nenhuma fábrica de aguardente.

Entretanto, com fábrica ou sem fábrica, com destilaria ou sem, os bebinhos da Terra de Senhora Santana continuam sem trégua na rota da cachaça.

DESTILARIA

 

 

 


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segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

 

CUTIA, PACA, CUTIA

Clerisvaldo B. Chagas, 27 de dezembro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

                                                         Crônica: 2.820




                                                       

Em solo sertanejo, geralmente uma confusão longa é iniciada com o ditado ainda em voga: “gente vai ver cu de cutia assoviar!”.  Ditado bastante antigo, citado até por pessoas que nunca viram uma cutia na vida, importando apenas o sentido em que a ira avisa que haverá bastante desassossego. Mas quem diabo inventou tão feio jargão?  E se o lugar tão sensível da cutia é capaz de assoviar, só quem conhece de perto o animal é capaz de saber. A paca é menor do que a cutia, são ambos roedores, ariscos e selvagens. Também não é do nosso tempo a existência desses bichos nas matas de Santana do Ipanema, bem como a ausência da Capivara. Isso faz lembrar a declaração de um amigo vigilante de escola que dizia criar duas pacas no quintal, na margem direita do rio Ipanema.

 

Mas o que chama atenção mesmo é o criatório de pacas e cutias numa fazenda em Minas Gerais. Com autorização do IBAMA, o criatório único com os dois bichos tem toda a assistência de profissionais que ajudam a desenvolver o empreendimento. Assim deveria ser com o mocó, o preá, a ema e veado galheiro, entre outros porque a extinção dos bichos selvagens caminha a passos largos. Todos querem experimentar o sabor de carne exótica, além de ajudar na preservação da espécie em criatório. Até as mulheres sensuais eram comparadas: “redondinha que nem uma paca! E quem quer criar clandestinamente, é um olho no quintal e um olho na Lei. A multa é pesada de tirar a calça pela cabeça além de possível prisão em flagrante.

Dia nublado e frio esse de Natal, em Santana do Ipanema, fomos quebrar a monotonia tentando fotografar os arredores. E nas ladeiras do Bairro São José em direção ao rio, o costume rural de criar aves à solta ainda permanece. Nos terrenos baldios, nos monturos, passeiam descontraídos os galináceos: pintos, galinhas, galos e até mesmo o guiné.  Vez em quando quem deseja leva uma galinha, mas esse criatório tradicional persiste indiferente ao furto. É ali mesmo sob a folhagem rasteira e o lixo caseiro jogado que os bichos reproduzem, crescem e se divertem. Vamos fotografando ainda, a beleza verde dos montes mais distantes, cercando as cercas de arame farpado que nada cercam. Mas dessas andanças em busca de coisa interessantes, nem notícia de capivara, cutia e paca.

 Dia monótono e profundamente triste. Até mesmo lúgubre.

PACA E CUTIA (PACA DE LATERAL BORDADA)

 

 


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