AS TRAGÉDIAS CONTINUAM (Clerisvaldo B. Chagas. 5.1.2010) Mais da metade das notícias de início de ano foi sobre as tragédias do Sudeste...

AS TRAGÉDIAS CONTINUAM

AS TRAGÉDIAS CONTINUAM

(Clerisvaldo B. Chagas. 5.1.2010)

Mais da metade das notícias de início de ano foi sobre as tragédias do Sudeste. Desabamentos de encostas que vitimaram dezenas de pessoas. As tragédias anunciadas não são privilégios de São Paulo, Minas Gerais ou Rio de Janeiro. Elas estão espalhadas pelos estados das cinco Grandes Regiões Brasileiras. São frutos ─ em quase sua totalidade ─ do descaso dos seus governantes que permitem construções em lugares impróprios. Quando não é a permissão oficial ou comprometida é a omissão ao acompanhamento do alargamento urbano. As maiores tragédias acontecem em encostas e em margens de rios e seus afluentes. A população pobre, não podendo comprar terrenos em áreas seguras, apelam para lugares insalubres. Um rio pode passar anos sem grandes enchentes, porém, tem seus limites marginais. A população constroi dentro desses limites e fica na esperança de que o rio ou córrego nunca venha rever o que é seu. Quanto às encostas que são declives por onde descem as águas pluviais, também levam nomes de barreiras, grotas, morros e outras denominações populares. Esses acidentes geográficos estão sempre ameaçados pelas chuvas. Bombas prestes a explodir a menor mudança do tempo. O desmatamento das encostas, hoje proibido por lei, desprotege o solo que desliza igualmente pneus carecas em pistas molhadas. Engolem o que encontram abaixo como casas, cercas e outros beneficiamentos humanos. Aliás, novos tipos de vítimas começam a aparecer no Brasil. São pessoas da classe média e rica atraídas no tempo de estio pelas belezas naturais dos lugares. Fazem como os americanos com suas mansões à beira-mar. A fúria das ondas leva tudo de roldão acabando o veraneio.
As autoridades são culpadas sim, quando consentem ou se omitem. Construções exigem planejamento, principalmente quando vão comportar uma quantidade exagerada de pessoas. Mas os “numerosos” afazeres dos dirigentes não permitem que eles se preocupem com os sinistros do amanhã. Depois dos fatos, abrigos e cobertores, algumas palavras de consolo e tudo fica definitivamente resolvido. Os lares cobertos de luto vão refazer suas vidas em cima da tristeza, do trauma, da depressão, abandonados depois a própria sorte. Afinal o que restou de vida continua; de qualquer jeito continua. Os maiorais apenas lavam as mãos como Pilatos. Logo, logo, todos esquecerão. Depois surgem outros dirigentes semelhantes e novas notícias opostas chegarão à mídia. Caso esquecido, ninguém punido. Até porque se houver punição será para os “teimosos” que construíram ali suas residências. As vítimas transformar-se-ão em culpados. Por outra rua, 2010 é ano de eleição. Tempos de festas e dinheiro a granel. Talvez chova, talvez não chova. Se não chover, adiam-se os funestos. Tem nada não. Para o ano AS TRAGÉDIAS CONTINUAM.

TUPIS E TAPUIAS (Clerisvaldo B. Chagas. 4.1.2010) Como já foi dito várias vezes, o senadinho na porta grande da loja de meu pai, teve i...

TUPIS E TAPUIAS

TUPIS E TAPUIAS

(Clerisvaldo B. Chagas. 4.1.2010)

Como já foi dito várias vezes, o senadinho na porta grande da loja de meu pai, teve importância fundamental nessas crônicas publicadas. Ali se reuniam várias pessoas em conversas de todo tipo. Eu, como adolescente, apenas gravava na cabeça para futuros escritos. Além disso, ponto estratégico entre o Largo da Matriz e o Largo da Feira, permitia observação completa do meu posto. Vem à lembrança pessoas que frequentavam o senadinho regularmente e outras, vez em quando: Entre os que ainda estão na memória: Tibúrcio Medeiros (fazendeiro), Diógenes Wanderley (funcionário), Antonio Correia, Sebastião Gonçalo (fazendeiros) Pompeu, Lucas, Enéas (boiadeiros), Domício Silva (industrial), Siloé Tavares (deputado), Ivo Wanderley (fazendeiro), Isaías Rego (comerciante e fazendeiro) e outros mais que contribuíram para o progresso de Santana e região. Entre eles surgia Álvaro Granja que mantinha uma padaria perto da ponte Gel. Batista Tubino, onde hoje funcionam o “Mercadinho Nobre” e a “Casa Guido”. Homem franzino, educado e agradável, Álvaro Granja contou aos parceiros de senado que certa feita fora visitar uma filha casada no interior do Rio Grande do Sul. Cidade pequena, pouco movimento, Granja sentou-se em um banco de praça para apreciar os transeuntes. Ao voltar a vista para o jardim, veio a vontade de colher uma flor e sentir de perto o seu perfume. Eis que um comerciante o observava do outro lado da rua e veio até ele com a seguinte pergunta: O senhor não é daqui? E como a resposta foi a esperada, o comerciante prosseguiu: Logo vi. Porque o pessoal da terra não arranca flores dos canteiros. Disse ainda o panificador que a vergonha foi tanta que procurou um buraco para se esconder.
A gente nota na maioria das cidades nordestinas o atraso de mentalidades exemplificadas nas ruas e em outros logradouros. Com ilhas de exceção, é a metralha nas ruas; praças destruídas por vândalos nos seus canteiros, bancos, estátuas; placas indicativas pichadas, aos pedaços; terrenos baldios repletos de lixo; animais à solta; criação de porcos dentro da cidade e muitas outras mazelas que permitem claramente fazer comparações. Quando nós, os nordestinos, viajamos por aí, vislumbramos nos três estados do Sul, uma cultura diferente na conservação dos bens públicos. E no Nordeste, mesmo com a força da lei em determinados projetos, o povo não respeita mesmo. Usa e destroi o patrimônio público, como ira de guerra contra o inimigo. De onde vem essa herança avassaladora sobre a propriedade coletiva? Será rescaldo dos indígenas? Dos tupis, dos tapuias? Virá da arrogância portuguesa? Da índole africana? Ou será da própria criação do indivíduo? Estamos numa fase de comunicação farta: rádio, televisão, internet, jornal, escolas, além dos diálogos constantes através das boas estradas. Todo mundo vê tudo, observa, ouve. Mas por que o vandalismo e o descaso não esbarram na educação sugerida? O exemplo do comerciante Álvaro Granja, apesar do tempo, continua bem firme e atualizado nesse Nordeste para vergonha geral. E como os índios no Brasil são ainda sacos de pancadas, os mais civilizados poderão nos acusar pela descendência: é que eles são filhos de TUPIS E DE TAPUIAS.

2010 Clerisvaldo B. Chagas. 1.1.2010) Vamos iniciando o ano de 2010, desconfiados como cachorro na igreja, porém, otimistas em relação ...

2010

2010

Clerisvaldo B. Chagas. 1.1.2010)

Vamos iniciando o ano de 2010, desconfiados como cachorro na igreja, porém, otimistas em relação ao futuro do País. Viemos passar a vista no Sertão velho de guerra, símbolo de resistência que glorifica o Nordeste. E vão passando as imagens de Antonio Conselheiro, do padre Cícero, de Lampião, das promessas, das ladainhas, das histórias de trancoso... Pela caatinga esverdeada o mandacaru ainda é o rei com sua coroa de espinhos e seu porte de atalaia nos umbrais das serranias. As cancelas quebradas e gastas, os arames no chão, o solo folheado, indicam um mundo oco e sem porteiras. As jiboias ainda caçam mocós nos pés dos lajeiros; espanta-boiada insiste nos gritos pelas várzeas dos açudes caboclos; e o matuto ainda lê os rastros nas encruzilhadas. Pelos serrotes esparsos transitam os bodes nas curvas das veredas. Rondam gaviões no céu anil, procurando caça. O preá cheira os arredores com o focinho nervoso e, o cassaco procura galinhas nos quitais abertos. Nos leitos arenosos dos riachos, rastejam os calangos; brotam as craibeiras; floresce o mussabê. Continua a luta da macambira brava pela sobrevivência. O cheiro da mandioca perfuma os arredores; a farinha torrada enche as narinas saindo dos fornos de barro vermelho. Relincha o cavalo na baixada e o jumento marca a hora sob frondosa quixabeira. Pontilhando os planos e as colinas os ipês vão manchando o crestado do mato cinza. Longe das luzes artificiais, as estrelas mostram o brilho e ensinam o caminho ao viajor. Quando o rebanho bovino marcha pela tarde continua à procura da malhada. Mas o meu Sertão velho chega em 2010, devastado em sua fauna, em sua flora, em seu coração sofrido. Continua ouvindo lorotas dos enganadores, dos maculosos, dos infames. E segue esse pedaço bravio do Brasil como guerreiro resoluto que não abre, que não vacila, que não se entrega. Sertão de granito, de terras áridas, de sonhos doces. Sertão que altifica o vaqueiro nas quebradas misteriosas, altaneiras, desumanas. Lá no alto o tempo não passa para o cruzeiro rude, para a igrejinha encardida, para as marcas nas antigas baraúnas. Flutua a poeira da tardinha montada na leve brisa. O poeta senta, afina a viola e canta a tristeza do lugar.
Como será 2010? O que dizem os arcanos, os adivinhos, os sinais dos tempos? Vamos jogando fora a roupa velha e vestindo a roupa nova da esperança como companheira inseparável na caminhada. Vamos tentando nos livrar do ódio que maltrata; da ira que destroi; do rancor que infelicita. Chega o ano novo para o velho homem, cheio de defeitos, cheio de mágoas, mas também trazendo um sentimento de fé que a Natureza oferta. Rapidamente os dias passam e os mais sábios vão entregando ao tempo as soluções dos seus problemas insolúveis. E como supervisionamos o Sertão, Deus também passa supervisionando tudo. Hora de uma renovação de dentro para fora. Momento de escrever na areia os negativos; hora de gravar na rocha as virtudes. Afinal, o Supremo nos concedeu mais uma oportunidade. Acho que merecemos UM FELIZ 2010.