CASCO DO BOI Clerisvaldo B. Chagas, 19 de janeiro de 2012 Crônica nº 700                    Houve uma época na minha adolescência, em que o...

CASCO DO BOI

CASCO DO BOI
Clerisvaldo B. Chagas, 19 de janeiro de 2012
Crônica nº 700
        
          Houve uma época na minha adolescência, em que o município de Santana entrou na moda de corrida de cavalo. Improvisavam-se os mais diferentes espaços públicos na cidade e no campo para as movimentações paralelas: disparadas de animais por um lado, desfiles de maços de cédulas por outro. Interessante às apresentações das mais diferentes raças e origens dos quadrúpedes. Cavalos gordos, magros, bonitos, feiosos, cheios, esqueléticos de variadas cores e tonalidades, desfilavam sem pejo dos seus donos, antes das corridas, como verdadeiros campeões. Essa moda parece-me, foi encerrada no plano do lugar Barroso, onde está situado hoje o cemitério São José. A multidão, sem proteção alguma, aguardava o embate ao longo da pista, quando um dos cavalos bateu e matou o cidadão chamado Jacinto Vilela. O santanense perdeu o gosto pelo esporte sem estrutura. Tempos depois foram as brigas de touros ocorridas nas fazendas que deslocavam a populaça para o novo e perigoso lazer dos nossos finais de semana. Mais dinheiro circulando na rudeza pesadas da força bruta.
          Quando ambas as modas acima foram embora, chegou o novel gosto pela vaquejada urbana, transformada em corrida de mourão, mas com nome “vaquejada” mesmo, como se os lances de habilidades campesinas, acontecessem à semelhança das mangas e fazendas das caatingas. Apesar do gosto rural e urbano do povo que habita essa cidade, Santana nunca conseguiu “amarrar” um calendário desse esporte no município. Os acontecimentos são esporádicos, espaçosos, em variados lugares. Ocorre ao contrário em municípios vizinhos que asseguram esses eventos regularmente, tendo com exemplos, Dois Riachos, Olho d’Água das Flores, Cacimbinhas e Major Isidoro. É bom saber que o miolo das festas, envolvem negócios como gado diversos, cavalos, artesanato, queijos, leite, manteiga, iogurte e máquinas agrícolas. Claro que a vaquejada é uma festa bruta, onde não pode faltar cerveja e cachaça e, quase sempre armas brancas escondidas sob couros e tecidos. Os prêmios estão ficando cada vez mais valorizados, onde vaqueiros conseguem a proeza de viver ganhando automóveis nos circuitos nordestinos.
          No auge da vaquejada em Santana, o conhecido médico filho da terra, Dr. Dalmário Gaia, investiu em terreno no Bairro Camoxinga, com essa finalidade. Passada a euforia, o excelente terreno foi loteado e deu origem a inúmeras ruas e avenidas com suas casas de luxo. Recentemente todo esse trecho foi pavimentado, dando aspecto mais nobre à região. A juventude talvez não saiba que as imediações da casa de comércio José Balbino, Centro Bíblico, Creche, Ginásio de Esporte, vieram de fato da vaquejada, do verdadeiro ritmo idolatrado do CASCO DO BOI.


O TREM     Clerisvaldo B. Chagas, 18 de janeiro de 2012           Lá pelo final dos anos cinquenta, aproximadamente, vários jovens desta...

O TREM

O TREM   
Clerisvaldo B. Chagas, 18 de janeiro de 2012

          Lá pelo final dos anos cinquenta, aproximadamente, vários jovens destacavam-se na sociedade santanense, alguns carregando seus respectivos apelidos. Como eu tinha apenas dez ou doze anos, mantinha uma distância enorme dessa plêiade que não exibia alguém menor de dezessete. Caso de apelido, todos conhecem. Uns são indiferentes, outros partem para matar. Lembro que dois jovens estudantes do Ginásio Santana, entraram em conflito na Praça da Bandeira, quando o apelidado não gostou e foi buscar um punhal para atacar o jovem Hugo de José Maximiliano. Quase acontece uma desgraça. O apelido, porém, nunca saiu das costas desse cidadão que é hoje empresário e bastante conhecido em Santana. Entre outros, também existe um comerciante que entrou na brincadeira que se exaspera e pode cometer loucura se você chamá-lo pelo vulgo. Porém, o palhaço de um circo que esteve na cidade, muito talentoso, parodiou um “frevo”, com os apelidos dos rapazes. Os frevos estavam em voga, na época e não paravam de tocar nos serviços de alto falantes, como uma praga. Alguém deu para o palhaço o apelido dos rapazes (alguns frequentadores dos cabarés da cidade, onde faziam farra com as prostitutas, inclusive formando o famoso trenzinho).
          Durante uma das noites, o circo estava lotado, quando chegou à vez do palhaço cantor. Esse jogou a bomba que para muitos é proibitiva até hoje. Numa perfeição incrível com a letra original do frevo, cantou e o circo quase veio abaixo:


“Zé Pinto
Cadê Agilson,
Chama logo o maquinista
Vamos à estação;
Josa é a máquina
Genival é o condutor
Henaldo é o foguista
Guarda-freio é Zé Yoyô;
Com a luz apagada
A turma agarrada
Passa a brincar de trem;
Zé Torreiro entra afobado
Trazendo João Badalo
Agarrado no seu pão;
Vamos, vamos, minha gente
Que o Porronca já chegou
Bolinha está acolá
Djalma a gaguejar
Que o trem já vai parar”.

 É pena não recordar o nome do frevo. Esse assunto já foi abordado por outro escritor, inclusive participante da música. Estou lembrando o assunto, mas sei que ainda hoje tem personagem aí que pode correr atrás do saudosista como vaca braba do sertão. Fui. Cansei de esperar O TREM.












ERA UM LUXO DA PESTE!                Clerisvaldo B. Chagas, 17 de janeiro de 2012   Para muita gente o navio Costa Concordia nem existe,...

ERA UM LUXO DA PESTE!

ERA UM LUXO DA PESTE!
              Clerisvaldo B. Chagas, 17 de janeiro de 2012

 Para muita gente o navio Costa Concordia nem existe, pelo seu alto luxo e toda engenharia proibitiva desafiadores dos simples mortais. O seu tombo em águas italianas vai lembrando grandes tragédias de outras famosas embarcações nos mares do Norte ou mesmo em rios que sustentavam o alto luxo e o orgulho ao mesmo tempo, desafiadores qual torre de babel, a zombar de um Deus inexistente. A vaidade humana, ao bater o olho diante de tão sofisticada máquina de navegar, rende-se ao capricho, duvidando sim senhor que ali não seja um céu verdadeiro e particular onde mora o sentimento felicidade. Se falarmos na capacidade de abrigar pessoas, o Concordia tinha capacidade para 3.780 passageiros juntamente com uma tripulação de mais de mil membros. Além disso, havia quatro piscinas, quadras de tênis, futebol, basquete, vôlei e academia de ginástica. Cinco restaurantes e treze bares matavam a fome e podiam sustentar o vício de quem quer que fosse durante a temporada no cruzeiro. Quanto aos camarotes, havia apenas mil e quinhentos deles, centenas com varanda para o deleite dos privilegiados mortais.
         Custa também a acreditar que uma “belezura” dessa tenha sido entregue a um irresponsável como foi amplamente divulgado após as primeiras impressões. Diante do que vai sendo mostrado, esse comandante parece carregar todos os pecados de um amador, de um bêbado, um débil mental, um receptor de loucura repentina, ou um planejador de mortes coletivas. As ações insanas do comandante são mais fantásticas do que a própria estrutura do navio. Falam em seis pessoas mortas e 69 desaparecidas até agora, numa noite de grande prazer que virou pesadelo profundo bruscamente. O rei dos mares, diante do orgulho de tantos que trabalharam para fazê-lo existir, vai ao fundo do mar com um simples bico de pedra que lhe rasga as entranhas. De fato a bruxa está solta para os lados elitistas da Europa.
          Agora vem o segundo ato com a ameaça ecológica pelos arredores. O óleo pesado do navio ameaça a ilha de Giglio, com seus moradores entre 500 e 5.000 pessoas em temperadas. Além disso, falam que ali existe um santuário de baleias que não precisa de petróleo nenhum para mover seus animais. Retirar os destroços do navio do imprensado onde ele se meteu, está gerando preocupação e nervosismo em todas as partes interessadas.
        Conversando com um visitante a minha casa, este fazia comparação entre o mundo quase irreal do navio e uma pessoa riquíssima à custa do alheio, cujo mundo desaba de repente. Até o visitante pareceu absorto, quando deixou escapar baixinho, a frase derradeira: ERA UM LUXO DA PESTE!