FOGUEIRA E GENTE Clerisvaldo B. Chagas-23.6.2008) Aroeira, angico, estalos, faíscas. Estalos, faísca...

FOGUEIRA E GENTE


FOGUEIRA E GENTE
Clerisvaldo B. Chagas-23.6.2008)

Aroeira, angico, estalos, faíscas. Estalos, faíscas; estalos, faíscas; estalos, faíscas. Fogo preto, amarelo, fogo vermelho, fogo fogo. É um silêncio longo numa rua longa, numa madrugada longa. Lenhas tortas, lenhas retas, lenhas linheiras na fogueira cambaleante, embriagada, saudosa, compassiva, chorosa. É um coração grande, um esvair fumaça, um esvair de sangue. Uma calma que acalma, que toca, que chora, que desanima.
Passa o gari, cai à garoa, pula o graveto. Desce do céu lágrimas de arame sobre os paus da fogueira esmaecida. Brasas espalhadas, vacilantes, enlutadas. Neves de cinzas nas cristas retintas em despedidas. Soluços mudos numa noite negra, numa rua escura. Doce morte dourada sob as brancas cinzas, sobre as brancas pedras, sobre escalarte chão. O vento é fraco no inverno triste, de um junho triste de um São João tristonho. E a fumarola enrosca-se, expande-se, esvoaça, envulta-se no espaço longo, carregando os sonhos, transportando o tédio, refletindo a vida. Dilata-se a
quentura, refletem-se o calor, o porvir... A juventude. Os restos, o bagaço, o cisco, escondem-se na madeira grande que também é fraca, que também é frágil, que também é cinza.
A fogueira espelha no seu peito (no peito dele). A alma reflete na fogueira, nas achas retorcidas, que se vão. É ativada como o calor... Das catingueiras. Contorce-se com as lamboradas das labaredas coleantes. Despede-se com as longitudes das chamas desiguais. Conforma-se qual brasa arremessada, solitária, na agonia dos estertores... Acovarda-se como a lenha seca, e deita, e chora, e esmaece e tomba... Como a cinza mole na madeira dura.
Cerram-se as portas e o povo dorme e a rua agoniza. E a fogueira morre, e as trevas comem o mundo, o tudo, o nada.
A alma do poeta segue montada na fumaça morna, no corcel branco noturno, rumo aos céus, rumo às estrelas, rumo a outros rumos de uma rosa, dos ventos, sem fim! Sem fim... Sem... Fim...
Alma de poeta não morre no sem nada, nas esferas, no sangue eterno do Senhor. Poeta é pedaço do coração de Deus. Tridimensional... Infinitamente infinito.

FORNECENDO HISTÓRIA (Clerisvaldo B. Chagas-23.6.2008) Vi muitas coisas acontecendo quando era redato...

FORNECENDO HISTÓRIA


FORNECENDO HISTÓRIA
(Clerisvaldo B. Chagas-23.6.2008)

Vi muitas coisas acontecendo quando era redator do Jornal do Sertão, encarte do Jornal de Alagoas. Produzido na Rua Nova, nos três andares de um prédio logo no início da rua, o Jornal do Sertão era forte combatente. Forneci os apelidos para uma churrascaria chamando-a Defuntão (por está localizada defronte ao cemitério); e para um estádio municipal, Florestão, por está sendo construído na localidade Floresta do outro lado do rio Ipanema. Denunciamos e apelidamos também um bando de assaltantes que agiam na região do alto sertão como Lampião II e lutamos incessantemente pela nova adutora Pão de Açúcar/Santana do Ipanema, afora tantas e tantas outras reportagens de peso.
Lembro-me que certo dia, o repórter Edvan Silva deixou a redação em disparada por causa da primeira notícia de AIDS em Santana do Ipanema. Era tabu falar-se no assunto. Corria o boato que certo cidadão viera de São Paulo com esta doença e havia ido até uma barbearia para fazer a barba e cortar o cabelo. Ao saber de quem se tratava, logo após terminar a sua tarefa, o barbeiro teria jogado a navalha de marca famosa no lixo e tomado rapidamente outras providências. Lembro-me como hoje do retorno de Edvan ao local de trabalho, papel e caneta na mão, suor farto pela testa morena e ansiedade sem par visando um furo de reportagem. Era o ano de 1986. Agíamos com bastante independência.
Em 1926, quando Lampião invadiu a vila de Olho d’Água das Flores, causando muita revolta e sofrimentos, os jornais de Alagoas calaram. Segundo o saudoso escritor palmeirense Valdemar de Souza Lima (Lampião e o IV mandamento) uma linha sequer foi escrita a respeito do assunto. Ora, a Imprensa alagoana da época ou foi omissa no seu sagrado compromisso de bem informar ou tinha um conchavo com o governo do momento ou ainda possuía um medo triste do famoso Costa Rego.
Parte da imprensa alagoana de hoje ainda não saiu da condição de provinciana e fora alguns dos motivos acima, não sabemos outros poréns. O que sabemos é que se prefere ficar falando de bandido pé de chinelo, de meio quilo de maconha, do buraco da rua ou de receita de bolo. Essas são “fontes inesgotáveis de notícias”, para uma Imprensa que talvez não queira o respeito dos seus leitores. Inúmeros fatos de suma importância e repercussão internacional acontecendo em nosso estado e quando se liga a televisão, parceiro da imprensa, a esposa, o genro, o amigo, o povo logo diz: lá vem m... É de doer até em cabeça de prego. Uma VERGONHA! Imprensa grande que se faz pequenininha, minguada, sumida, esquelética, zumbi. Imprensa covarde como o general que deserta da guerra; como o médico que não examina; Como o boi que não produz; como o juiz medroso no julgar.
O Sertão está precisando de gente para trabalhar na roça; de preferência de mãos finas, de caneta ouro, de terno inglês, de porte Mister. Pelo menos o homem da enxada queimado pelo Sol, temperado pelo sereno, vislumbrado pela fé, sabe de cor e salteado o seu dever de produzir.

PRESENÇA DO PASSADO   (Clerisvaldo B. Chagas-22.6.2008) Fui pioneiro solitário do estudo Santana-Ar...

PRESENÇA DO PASSADO


PRESENÇA DO PASSADO 
(Clerisvaldo B. Chagas-22.6.2008)

Fui pioneiro solitário do estudo Santana-Arapiraca; primeiramente através dos ônibus da Companhia de Transportes Progresso via Palmeira dos Índios, depois pelo mesmo transporte via Batalha e suas fazendas nas estradas de barro da época. Por Palmeira, baldeando com o transporte particular de colegas palmeirenses. Por Batalha, num longo trajeto sem fim que parecia não chegar nunca. No último ano, finalmente, acompanhando de automóvel a construção do asfalto Arapiraca—Olho d’Água das Flores; passo a passo, cenário a cenário, seguindo o nascimento do pretume na AL 220. Três anos de lutas e sacrifícios que se encaixam num romance bem contado.
Fui pioneiro também no estudo Santana-Arcoverde, Pernambuco. Inicialmente num esforço automobilístico via Águas Belas-Iati-Tupanatinga. Em seguida, por desvios esquisitos, extravagantes, desérticos de caatinga brava. Já no final da luta, seguindo através do único ônibus para aquelas bandas da Companhia Jotude fazendo linha Pão de Açúcar, Alagoas-Recife. As viagens de retorno sempre foram viagens de contramão com absoluta falta de transportes como ainda hoje.  Nada mudou. O retorno era um esforço inusitado para tomar o ônibus único para Alagoas de uma da madrugada que fazia linha Recife—Penedo via Garanhuns. Teria que chegar na “Suiça Brasileira” antes da meia-noite para tentar uma vaga (era proibido pegar passageiro) no ônibus da Jotude e saltar em Palmeira dos Índios, amanhecer num hotel e retornar a Santana pelos ônibus da Progresso.
Foi lá em Arcoverde, cursando a Plena de Geografia que tive a felicidade de conhecer o professor e escritor Aleixo Leite Filho. Baixinho, calvo, gozador e intelectual, Aleixo me fez abrir caminho para outros santanenses que ali foram aos estudos após minha saída. Meu nome passou a ser referência em todos os lugares da faculdade, abrindo portas para eles.
Travei uma sólida amizade com Aleixo que afirmava não gostar de Arcoverde. Amava a sua terra Caruaru onde morava e mora. Lá pesquisava, lecionava e escrevia. Li e possuo alguns livros de Aleixo como “A Cartilha do Cantador”, “Mangação do Pajeú” e “No Bico dos Gaviões”. Esqueci de dizer que Aleixo Leite é apaixonado pelas coisas do Sertão e Agreste, sobretudo por cantoria de viola. Certa feita aquele ilustre escritor escreveu longo artigo tecendo elogios a um dos meus romances “Defunto Perfumado”, através de conceituado jornal de Caruaru.
Após longo tempo sem contato, eis que recebo um belo livro de 40 crônicas escolhidas do meu amigo e professor. Trata-se de “Presença do Passado” quando o autor demonstra seus conhecimentos e habilidades numa variação enorme de temas interessantes. Li com muito gosto o seu presente, mas não pude responder de imediato.
Caruaru, além de projeção nacional com a feira gigante, com os bonecos do mestre Vitalino, com a festa do maior São João do mundo, na certa também deve ter ficado orgulhosa com mais um livro na sociedade fruto de um homem que ama e honra a sua terra.
Parabéns Aleixo Leite Filho. A jornada é longa e sua cabeça é uma indústria. Mas o mote é meu, feito na hora: A “Presença do Passado” é o presente/quando Aleixo resolve usar a pena. Salve!