RASO DA CATARINA Clerisvaldo B. Chagas, 31 de maio de 2011.           Entre os apreciadores da Natureza, têm os que dão preferência as pai...

RASO DA CATARINA

RASO DA CATARINA
Clerisvaldo B. Chagas, 31 de maio de 2011.

          Entre os apreciadores da Natureza, têm os que dão preferência as paisagens de outros países. Pessoas que gastam pequenas fortunas em busca de belas regiões em todas as partes do mundo, até porque Deus espalhou sua magia por todos os recantos da Terra. Uma região bastante desolada pode ser o caos para alguns, mas pode também encerrar beleza se olhado com olhos diferentes. O intercâmbio turístico demonstra que o interessante pode estar na Ásia, na América do Sul, Europa, América do Norte ou outro lugar qualquer. O advento da fotografia, aperfeiçoada constantemente, proporcionou a humanidade uma descoberta diferente do seu único planeta. Lembramos que a Europa, algumas dezenas de anos após a descoberta das Américas, deslumbrava-se com as paisagens tropicais extraídas dos renomados pincéis dos seus artistas famosos e viajantes. Muitas cenas do cotidiano exibiam como pano de fundo mata tropical, uma cachoeira, baía, lagoa, dando um toque do novo, do exótico, deixando um pouco de inveja ao apreciador de longe. Enquanto empresários do nosso Nordeste preferem navegar pelo Danúbio, Reno ou Mississipi encontramos barões de empresas, deslizando pelas águas do “Velho Chico”, absorvendo ainda o mundo selvagem dos tabuleiros de caatinga. Uns descobrem lá fora, outros descobrem aqui dentro os magníficos cenários das serras e rios sertanejos. Espalhados por todo o Nordeste, desde o litoral do Maranhão até o sertão da Bahia as variadíssimas descobertas empolgam nativos que ficam extasiados com o que temos a oferecer.
          Entre tantas belezas naturais que orgulham a região, é destaque o quase deserto Raso da Catarina, antes desprezado como lugar inóspito e distante da civilização. Citado por vários livros que falam sobre o Cangaço, o Raso da Catarina foi sendo estudado e hoje representa uma poderosa reserva ecológica criada em 1983, sob administração do IBAMA. Trata-se de uma imensa região entre os rios São Francisco e o Vaza-Barris, dueto de dezenas de combates entre volantes e cangaço; entre o rezador Antonio Conselheiro e o Exército, gerando cerca de 30.000 vítimas da estupidez humana, entre 1893 e 1897. O Raso da Catarina, hoje visto como parque ecológico e reserva dos índios Pankararés, é considerada uma das mais bonitas reservas do Brasil. Foi esconderijo de Lampião sob a cobertura dos índios que, aliás, forneceram cangaceiros e cangaceiras que se tornaram célebres e ferozes no bando de Lampião, como o desumano Gato, por exemplo. Lampião foi dali desalojado, surpreendido na caverna do Chico por um contingente de Pernambuco, graças ao exímio rastejador Antonio Cassiano. Nessa ocasião Maria Bonita foi ferida e carregada às costas por Lampião. Seu cachorro foi baleado e a tropa faminta o devorou ainda vivo. Delimitada pelos municípios de Paulo Afonso, Jeremoabo, Canudos e Macururé (terra do famoso queijo que leva seu nome) o local é apreciado por turistas, curiosos, historiadores, estudantes e mais. Assim como é dever do santanense conhecer as serras deslumbrantes do município, esse dever é estendido ao nordestino que não pode deixar de apreciar ao vivo, O RASO DA CATARINA.

• Raso: região plana intercalada de riachos e ravinas. Catarina: mulher de lide-rança que habitava a localidade.

UMA TONELADA Clerisvaldo B. Chagas, 30 de maio de 2011.           Com os constantes aperfeiçoamentos na arte de destruir os semelhantes, o...

UMA TONELADA

UMA TONELADA
Clerisvaldo B. Chagas, 30 de maio de 2011.

          Com os constantes aperfeiçoamentos na arte de destruir os semelhantes, os cientistas bélicos vão expondo ao mundo os novos trabalhos de pesquisas. Para isso é preciso provocar algum tipo de guerra por aí para poder testar a eficácia dos seus inventos. Não é somente a bomba atômica que é perigosa. Aliás, agora, ela é mesmo a mais arrasadora, pois algumas da mesma família poderão destruir o planeta completamente em questões de horas ou minutos. Dessa têm muitas nos arsenais das nações belicosas. É o homem eternamente desconfiado do próprio homem. A desconfiança ou a ambição permanente fizeram surgir esses brinquedos de uma forma ingênua. Se uma pessoa adquire uma espingarda contra outra pessoa julga está segura. Mas acontece que essa outra pessoa, compra um rifle. A primeira adquire uma metralhadora e assim sucessivamente. Foi dessa maneira também com as nações na sede de estarem sempre em vantagem contra as outras. O aperfeiçoamento das ameaças levou os dois principais antagonistas, Estados Unidos e União Soviética, ao topo de um possível confronto, cujo vencedor não seria ninguém. E se falam na besta do fim do mundo, a impressão que se tem é que a besta é o próprio homem que procura destruir a sua espécie.
          Como os países que brigam no espaço aéreo da Líbia não querem invadi-la por terra, tornam mais difícil uma solução rápida e nem por isso causadora de menor sofrimento ao povo líbio. Estão somente soltando foguete para espantar o animal, porém com medo de pegar a onça à unha. Daí o Reino Unido achar pouco as bombas comuns que joga na cidade do ditador e parte para outra solução. Mandar uma bomba inventada desde os tempos das cavernas esconderijos de Bin Laden. Aquele tipo de bomba que causa muita destruição física, não dando chance nenhuma ao lugar de abrigo, pois penetra por todos os interiores. São as tais bombas “bunker-busting” (destruidora de edificações) que pesam uma tonelada cada uma e podem ser lançadas a partir dos aviões britânicos. Segundo os fabricantes de boas ideias, isso seria um recado bem claro ao senhor Kadhafi que é hora do homem deixar o poder, como se ele fosse mudo, surdo, cego e doido. Dizem que essas bombinhas já estão em bases italianas de onde partirão nos aviões britânicos rumo ao norte africano.
          Como os festejos juninos aproximam-se, no Brasil, talvez a ONU queira comemorar soltando essas bombas às costas de Kadhafi, homem difícil de morrer. O Reino Unido e outros países da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) querem intensificar o negócio para encerrar de vez o assunto desgastante. E enquanto não descem a terra para pegar o sujeito na marra, nós aqui no Brasil vamos só apreciando o desenrolar do conflito pela televisão. Algumas pessoas acham, porém, que será um desperdício jogar bomba “bunker-busting” na cabeça de Kadhafi, pois em antros de tantos safados que fazem miséria com o povo brasileiro, ela poderia dar conta sem culpa da consciência. Lógico que isso é apenas uma metáfora, mas tem muito escravocrata moderno que só abandonaria o relho de couro cru, se fosse tratado à base de UMA TONELADA.



OS TRÊS POTES DE LABAREDA Clerisvaldo B. Chagas, 27 de maio de 2011 .           Dia e noite trabalhando sobre o cangaço, ordenando uma peq...

OS TRÊS POTES DE LABAREDA

OS TRÊS POTES DE LABAREDA
Clerisvaldo B. Chagas, 27 de maio de 2011.

          Dia e noite trabalhando sobre o cangaço, ordenando uma pequena e grande enciclopédia, temos a impressão de que em um mês e meio, aproximadamente, daremos por concluído o trabalho. Estamos na ordem inédita do assunto, ano a ano, mês a mês e quando possível dia a dia, desde o nascimento de Virgulino até o destino dos dois últimos cangaceiros, em 1941, Moreno e sua mulher Durvalina. Vamos selecionando os grandes momentos filosóficos, aliás, essas tiradas, quando da parte de Lampião, estão em nossa peça teatral para adultos, nunca publicada, “Sebo nas canelas, Lampião vem aí”. Falemos hoje sobre falta de respeito.
          Na época em que Virgulino perambulava entre Bahia e Sergipe, a partir de agosto de 1928, aconteceu um dos casos interessantes. O bando estava reunido no terreiro de uma casa, onde foi promovido um improvisado arrasta-pé. Em uma sombra de árvore, próximo ao forrobodó, descansavam três potes com água fria para quem quisesse beber. O baile estava animado, quando Lampião resolveu amarrar com um pano as bocas dos três depósitos de barro, por causa da poeira que levantava das alpercatas. Ordenou aos cabras que sempre cobrissem os potes após beber água. O cangaceiro Ângelo Roque, um dos grandes do bando, não participava dessa dança, tendo ficado deitado perto dos potes com sua mulher. Como acontece com uma porta fechada que muitos passam e não deixam como estava antes, assim os que bebiam água deixavam os potes descobertos. Lampião, vendo desfeito seu trabalho, gritou para todo mundo ouvir que não estavam fazendo como ele mandara. E advertiu asperamente a Ângelo Roque que estava perto, deitado, descansando com a mulher e “não estava vendo aquilo?”. Labareda não respondeu. Momentos depois se levantou e, com o coice da arma longa, destruiu os três potes, voltando ao colo da mulher. Daí a pouco chega Zé Baiano para beber água e vê a bagaceira. Pergunta quem fez aquilo. O autor responde que foi ele “por quê?” Zé Baiano não responde e vai dizer ao chefe. Lampião se desloca com muita raiva até Ângelo Roque. O cabra levante-se e aguarda. O chefe diz: “Então você não me respeita mais?” Labareda, homem de personalidade firme, diferente de todos os outros do bando, responde: “Por que você também não me respeita”. Lampião mira o cabra por um momento e arma o fuzil contra ele, recebendo resposta semelhante. Ficam assim tentando atirar um no outro, até que chega Virgínio, cunhado de Lampião, apelidado Moderno, e pede para acabar com aquilo, pois já basta os “macacos” (soldados) por todos os lugares. Ambos se acalmam e o impasse tem fim.
          Digitando, ordenando, conferindo, armazenando dados, aos poucos vamos livrando o rosto da pilha de papéis velhos. Não deixamos de encontrar situações atualizadíssimas do cotidiano. Quer ser respeitado? Respeite primeiro. Então surge a situação do funcionalismo público de Alagoas mantido em cativeiro moral e econômico, ridicularizado pela gargalhada do senhor de engenho Teotônio Vilela Filho. Como um governador pode ser respeitado se primeiro não respeita? O confronto entre servidores e governo representa nitidamente o passado cangaceiro dos TRÊS POTES DE LABAREDA.