PERÍODO
DAS CHEIAS
Clerisvaldo B.
Chagas, 20 de agosto de 2013
Crônica Nº 1070
RIO IPANEMA, POÇO DO JUÁ. (Autor). |
Durante as trovoadas de final ou início de ano ou
nos bons tempos de invernos, o Ipanema botava cheias. Toda a cidade parava para
vê o Ipanema inchando largura no poço do Juá, cobrindo o poço dos Homens,
descendo, abarcando o espaço todo que era seu.
Passávamos horas embevecidos com aquela força
descomunal, viril e barrenta que causava espanto, medo e respeito. Passavam
baraúnas arrancadas pela cepa na força do Ipanema,
um rio Macho; vasos de flandres de guardar feijão, bois, cachorros mortos,
garranchos, móveis, cercas, tecidos... Tudo boiando aos nossos olhos irrequietos.
Poucos ousavam enfrentar a fera quando estava assim. Vez em quando aparecia um
exibicionista para atravessar a corrente sob aplausos e apreensão da torcida. A
água, não raras vezes, insistia no seu nível máximo durante horas e mesmo dias
seguido, até que começava a dar sinais de cansaço.
Os canoeiros começavam a labuta de embarcar gente em
frágeis canoas para ambas às margens pelo poço do Juá, repleto de “carneiros”, “panelas”
e “fervedouros”. Com os passageiros iam diversas mercadorias e, verdade seja
dita, nunca soube que tenha caído alguém de uma dessas bravias canoas.
Então, nós crianças, adolescentes e adultos, escolhíamos entre
os lugares, Juá, poço dos Homens e outros para as primeiras aventuras nas
cheias: banhos e mais banhos nos arriscados carneiros, panelas e fervedouros.
RIO IPANEMA, POÇO DOS HOMENS. (Autor). |
Os mais diziam: “Panema
botou cheia, levou um”... O que sempre foi verdade. Outros gritavam: “Cuidado, rapaz, que água não tem cabelo”.
Também era verdade.
Aprendi a nadar como os meninos da minha época: com
duas cabaças amarradas ao corpo, servindo de boias, na parte mais rasa do poço
dos Homens. Pulei pela primeira vez num lugar profundo e sem boia, num dia de
cheia nos carneiros do poço dos Homens, num ímpeto de desafio e doidice. Nunca
mais deixei de tomar banho no poço.
No Juá, medíamos a intensidade da cheia pela
chegada da água na cumeeira da casa mais próxima do rio. Muito mais à jusante,
a marca era através da Pedra do Sapo, próximo da hoje Rua da Praia.
Quando o rio ficava manso, toda a cidade descia
para o domingo na água. Em toda a extensão urbana, a população lotava o Ipanema
com passeios, banhos, cavalos, jogos de futebol, petecas, latidos de cachorro,
numa latomia sem fim.
Uma ou outra vez... Notícia de um afogamento
·
Págs. 31-32 do livro “Ipanema, um rio macho”,
2011, autor.
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