quinta-feira, 22 de agosto de 2013

PERÍODO DAS SECAS



PERÍODO DAS SECAS
Clerisvaldo B. Chagas, 22 de agosto de 2013.
Crônica Nº 1072

RIO IPANEMA COM ÁGUA. 1982. (Luiz Euclides).
Quando as águas fortes iam embora, restavam os poços, as cacimbas, a areia, as ilhas, as moitas, as pedras... O rio era um paizão! Entretanto, nós nos voltávamos mais para os poços. No meu caso, o poço dos Homens. Ali tomavam banho adultos misturados com adolescentes. Muitos adultos nadavam nus sob os olhares desconfiados dos meninos. As pedras do “estreitinho” ficavam repletas. Outros preferiam o “largo” para as apostas de tirar terra no fundo do poço, trocar “sapatadas”, fazer exibimento. (...)
Aos domingos, o poço, como todos os outros lugares do Ipanema, ficava lotado.
No poço surgiam tipos esquisitos como “Gorila”, feio como o próprio e desengonçado como um chimpanzé. Em terra dava saltos mortais seguidos. Na água enfileirava sapatadas sem mostrar a cabeça na superfície, um verdadeiro espetáculo. Gorila era irmão de Nicinha, menina-moça que nadava como uma piaba; ambos moravam ali pertinho do poço.
Sempre apareciam lavadeiras no largo, fazendo ouvidos de mercador para as piadas mais grosseiras dos homens. Lavadeira parecia não enxergar os nus.
No inverno eu ficava espiando as andorinhas que voavam sobre o poço, roçando o peito macio nas águas turvas. Elas vinham aos bandos. Rodeavam, sentavam na torre da Matriz de Senhora Santa Ana e passeavam pelos arredores. Eu ficava escutando melancolicamente o cantor da minha rua, Cícero de Mariquinha, quando aparecia por ali cantando com sua voz maviosa “A Pérola e o Rubi” (...)
Quando as águas iam ficando verde, poucos iam ao poço, mas eu ia, motivo às vezes, de surras de cinturão por parte de Manoel Celestino das Chagas, meu pai, ou de Helena Braga das Chagas, minha mãe. Porém, nada em Santana era como o Ipanema, nada!... Outro divertimento eram as caçadas às rolinhas pelas areias grossas do rio ou o jogo de futebol nas ilhas mais compactas. (...)
RIO IPANEMA, SECO. 1983. (Autor).
Ao se aproximar o Carnaval, íamos roubar argila de telha na olaria do senhor Eduardo Rita, para fazermos máscaras e sairmos de caretas aos bandos nas ruas de Santana. Preferíamos o barro do senhor Eduardo porque ele fazia telha. E barro de telha teria que ser melhor do que o barro de fazer tijolo. Não íamos às outras olarias conhecidas nossas como a de José Cirilo e a de Pedro Cristino (Seu Piduca). (...)
Enfim, todos os grandes homens da cidade, com raríssimas exceções, tomaram banho no Panema. Ditado dos mais velhos: “Quem bebe da água do Panema não esquece Santana”. (...)
·        *  Extraído do livro “Ipanema um rio macho”, págs. 33-34, 2011. (Autor).




Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2013/08/periodo-das-secas.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário