segunda-feira, 25 de agosto de 2014

O ESGOTO DE DADINHO



O ESGOTO DE DADINHO
Clerisvaldo B. Chagas, 26 de agosto de 2014
Crônica Nº 1.247

Antônio Ermírio de Morais desencarnou, deixando um respeitável legado de dignidade e admiração a sua pessoa, pelo povo brasileiro. Infelizmente temos que contar nos dedos homens que são exemplos de honradez nessa época minada e apodrecida. As decepções são enormes com mentirosos, corruptos aves de rapina que arrastam as garras no patrimônio do país.
Penso no riquíssimo e humilde Ermírio, penso no período infantil da hoje Rua Teresa de Jesus, em Santana do Ipanema. Já me referi aos personagens Zé Alma e seu irmão Dadinho. O pai ganhava a vida como sapateiro ao lado dos fundos do casarão de Júlio Pisunha, onde se fabricava colchões de juncos. José, tão alvo, tão magro, cabelos louros, quase brancos, batendo sola em cima do joelho fino. Não tive como não apelidá-lo de Zé Alma. Seu irmão mais novo era forte, bochechudo, baixo e ativo para ganhar seu dinheirinho nas imediações. Dadinho era vulgo antigo.
Havia uma bueira (talvez ainda esteja lá) e que se iniciava na Rua Nova, a três metros do bar que funcionou décadas em Santana com o nome “Bar do Erasmo”. 150 ou 200 metros adiante, sua saída situava-se vizinha à casa dos pais de Zé Alma.
Pois bem, Dadinho, rapazinho esperto, ganhava boas gorjetas para mergulhar no túnel nojento e só despontar na saída, além da rua de baixo. Hora muito boa aquela de apanhar a verba prometida.
Mas como era (ficávamos a indagar) que uma pessoa enfrentava um esgoto contínuo, sem suspiro algum, que poderia conter fezes, urina, ratazanas, cobras, sapos, jias, lagartas, objetos cortantes e tantas coisas mais. Era um duvidar medonho que o rapaz cumpriria o trato feito diante de tantas testemunhas. Mas Dadinho sempre surpreendia, rompendo do outro lado, limpinho, feliz e ansioso para estirar a mão às notas dos pagantes.
Volto ao início do raciocínio. A bondade democrática do país faz-nos ver de volta caras em que a vergonha já deveria ter comido há muito. Como são poucos os valorosos! Como são muitos os que se adaptaram ao ESGOTO DE DADINHO.






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