quinta-feira, 26 de setembro de 2024

 

RECORDAR PORQUE...

Clerisvaldo B, Chagas, 27 de setembro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.117



 

Meu pai ordenava cortar o cabelo. Eu não tinha direito de escolher o corte como os outros adolescentes que faziam o chamado meia-cabeleira a moda dos rapazes da época. Mas no meu caso a ordem era seca: “passar a máquina zero”. E passar a máquina zero significava cortar o cabelo estilo militar, recruta. Duas coisas me deixavam chateado. A primeira, enfrentar a máquina manual cega do barbeiro Nézio no “prédio do meio da rua”, vizinho do armazém de seu Marinho, depois Salão de Sinucas do José Galego, ex-jogador do Ipanema. A máquina puxava mais o cabelo do que cortava e era uma das torturas do momento. A segunda coisa era como arranjar namorada com aquele corte de cabelo militar ridículo! Ah... muito demorou para a minha libertação. Mas enfrentar dentistas era a outra tortura que apavorava adolescente e adultos.

Poucos se lembram de Nézio, personagem santanense e primeiro barbeiro que eu conheci na cidade. Tempos depois conheci os seus filhos Vavá Capoteiro que fazia sofá, capotas e outros objetos. Na época de adolescência estava em moda as camionetas cobertas, uma das fontes de trabalho para Vavá Capoteiro. E também o Dorival de Nézio que trabalhou muito em fiscalização de obras de rua, com o saudoso prefeito Paulo Ferreira. Até aí a máquina cega de Nézio ia sendo substituída por novas ferramentas nas barbearias e já não fazia medo nenhum à meninada. Vários objetos de barbearia tinham origem na Alemanha como a navalha “Solinger”, orgulho do barbeiro que a possuía. Não lembro mais se foi por demolição do homem ou pelo tempo que a parte do “prédio do meio da rua”, relativa a barbearia do Nézio foi tombada. Isso muito antes do prefeito Ulisses Silva fazer desaparecer o “prédio do meio da rua”, totalmente.

Acabo de sair da barbearia. Eita, desculpe. Barbearia agora é palavrão. Cabelereiro Fulano, cabeleireiro Beltrano... muitos deles recusam tirar barbas. Alegam as mais diferentes coisas, como dor nas costas. Ah! Mosquito com tosse. E quando se fala em meia cabeleira, diz o atual cabelereiro “Já ouvi falar”. E assim vamos acompanhando e usando a radical mudança dos tempos. Vá seguindo a propaganda, cabra véi: “Eu sou o mesmo, mas os meus cabelos... quanto diferença! “.

Pague logo o corte de cabelo entre 15,00 e 20,00 e vamos embora. Quem conversa muito é pai de moça.

BARBEARIA DE NÉZIO DESAPARECIDA NO “PRÉDIO DO MEIO DA RUA”, AO LADO DO VEÍCULO. (FOTO: DOMÍNIO PÚBLICO/LIVRO 230/ACERVO DO AUTOR).

 

 

 

 

 


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