RECORDAR
PORQUE...
Clerisvaldo B, Chagas, 27 de setembro de
2024
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica:
3.117
Meu pai ordenava cortar o cabelo. Eu não tinha
direito de escolher o corte como os outros adolescentes que faziam o chamado meia-cabeleira
a moda dos rapazes da época. Mas no meu caso a ordem era seca: “passar a
máquina zero”. E passar a máquina zero significava cortar o cabelo estilo
militar, recruta. Duas coisas me deixavam chateado. A primeira, enfrentar a
máquina manual cega do barbeiro Nézio no “prédio do meio da rua”, vizinho do
armazém de seu Marinho, depois Salão de Sinucas do José Galego, ex-jogador do
Ipanema. A máquina puxava mais o cabelo do que cortava e era uma das torturas
do momento. A segunda coisa era como arranjar namorada com aquele corte de
cabelo militar ridículo! Ah... muito demorou para a minha libertação. Mas
enfrentar dentistas era a outra tortura que apavorava adolescente e adultos.
Poucos se lembram de Nézio, personagem
santanense e primeiro barbeiro que eu conheci na cidade. Tempos depois conheci
os seus filhos Vavá Capoteiro que fazia sofá, capotas e outros objetos. Na
época de adolescência estava em moda as camionetas cobertas, uma das fontes de
trabalho para Vavá Capoteiro. E também o Dorival de Nézio que trabalhou muito
em fiscalização de obras de rua, com o saudoso prefeito Paulo Ferreira. Até aí
a máquina cega de Nézio ia sendo substituída por novas ferramentas nas
barbearias e já não fazia medo nenhum à meninada. Vários objetos de barbearia
tinham origem na Alemanha como a navalha “Solinger”, orgulho do barbeiro que a
possuía. Não lembro mais se foi por demolição do homem ou pelo tempo que a
parte do “prédio do meio da rua”, relativa a barbearia do Nézio foi tombada.
Isso muito antes do prefeito Ulisses Silva fazer desaparecer o “prédio do meio
da rua”, totalmente.
Acabo de sair da barbearia. Eita, desculpe.
Barbearia agora é palavrão. Cabelereiro Fulano, cabeleireiro Beltrano... muitos
deles recusam tirar barbas. Alegam as mais diferentes coisas, como dor nas
costas. Ah! Mosquito com tosse. E quando se fala em meia cabeleira, diz o atual
cabelereiro “Já ouvi falar”. E assim vamos acompanhando e usando a radical
mudança dos tempos. Vá seguindo a propaganda, cabra véi: “Eu sou o mesmo, mas os
meus cabelos... quanto diferença! “.
Pague logo o corte de cabelo entre 15,00 e
20,00 e vamos embora. Quem conversa muito é pai de moça.
BARBEARIA DE NÉZIO DESAPARECIDA NO “PRÉDIO DO
MEIO DA RUA”, AO LADO DO VEÍCULO. (FOTO: DOMÍNIO PÚBLICO/LIVRO 230/ACERVO DO
AUTOR).
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