quarta-feira, 11 de setembro de 2024

 

AS PEDRAS E OS SAPOS

Clerisvaldo B. Chagas, 12 de setembro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3. 106

 



Na década de 60, quando o rio Ipanema botava cheia, nós, os adolescentes, com o rio sempre às vistas, marcávamos a intensidade dessas cheias de acordo com uma pedrada margem direita do rio, logo abaixo das olarias. A pedra tinha o formato de um anfíbio, daí a denominarmos “Pedra do Sapo”.  Se a cheia não chegava até lá, era pequena; se as águas chegavam até a sua base, seria uma cheia média e, se as águas chegassem quase a cobrir a pedra do Sapo ou mesmo a cobrir, seria uma cheia respeitavelmente grande. Tudo indica que foi na década de 80, quando o mangaieiro Zé Preto – que morava nas imediações da Rua São Paulo – por motivo de promessa, ergueu um oratório no topo da pedra e fez um acesso de alvenaria. Pronto, estava acabada a nossa tradição.

Mas, tempos depois, no sítio Barriguda, às margens da AL-220, um funcionário aposentado e artista amador, tendo adquirido uma chácara por ali, notou uma pedra em forma de sapo e usou a sua imaginação: Pintou o animal aproveitando as suas formas. A pintura do artista passou a ser uma grande atração turística. Muitas paradas de viajantes para uma fotografia tirada do pé da cerca de arame farpado. Até invasor subia na pedra para exibir fotografia como troféu. Assim encontramos outros artesãos que aproveitam pedras e árvores da caatinga com formato bruto de bichos.  Pintam a forma ou terminam o trabalho da natureza ao dá acabamento. Mas somente essas pessoas dotadas percebem essas formas de imediato porque a arte já está dentro da sua cabeça. Os olhos estão aguçados.

Tempos depois do oratório com escadaria na pedra do Sapo do rio Ipanema, os vândalos destruíram quase tudo, deixando apenas a escada de alvenaria. Nem chegamos a ver o santo da devoção de Zé Preto. Quanto ao sapo do sítio Barriguda, sempre estava sendo atualizado com pintura. Não sabemos, porém, se a manutenção continuou após a morte do proprietário da chácara. Mesmo assim, o “sapo” da Barriguda foi parar em nosso livro, ainda inédito: “Repensando a Geografia de Alagoas”, fotografado em 2016. (Ver abaixo). Quem marca agora as intensidades das cheias do rio Ipanema, não é mais a pedra do Sapo, pois, a modernidade aciona o Corpo de Bombeiros, cuja sede se encontra no Bairro São José.

Ô meu Sertão curioso!

 


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