segunda-feira, 7 de julho de 2025

 

ESCURO

Clerisvaldo B. Chagas, 8 de julho de 2025

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.263



 

Quando Santana do Ipanema passou à cidade, em 1921, um grupo de pessoas criou uma companhia de abastecimento de luz. No ano seguinte, 1922, a companhia começou a funcionar através de um grande motor alemão. A cidade era abastecida pela eletricidade motriz, a partir das seis horas até a meia-noite. Havia três piscadelas na energia quinze minutos antes de apagar. E o restante, era escuridão até o amanhecer. Postes de madeira pelas ruas, mostravam a dignidade de início da urbe. O motor de abastecimento começou abrigado em um prédio da Rua Barão do Rio Branco, quase na última esquina que dá para o rio Ipanema. Hoje é casa comercial. Depois foi construído um prédio exclusivo para a Companhia à Avenida Nossa Senhora de Fátima, hoje, Câmara de Vereadores, após reforma.

Havia três compartimentos. Um grande, do motor, um pequeno, de gerência, outro médio, dos tanques d’água que abasteciam o motor. No pequeno, pagávamos a conta da luz a um dos sócios, Valdemar Lins. Em 1959, o motor exauriu e nós santanenses passamos quatro anos no escuro. Sim, eu estava com treze anos lia à noite com candeeiro de flandres ou com placa de parede, também à querosene. Ferro de engomar na janela avivando as brasas de carvão, pela parte de trás; quartinha com água refrescando o conteúdo. Em noites enluaradas, histórias de Trancoso e assombrações, aprendizado dos nomes de estrelas e constelações. Em tempo mais frio, lençóis brancos e história de almas na calçada escura.

Por incrível que pareça, a cidade nunca deixou de progredir. Quando o cansaço bateu na paciência do povo foi iniciada uma campanha que tomou conta das ruas e repercutiu em Maceió, pela luz elétrica de Paulo Afonso. O governador sentiu o baque e com pouco tempo trouxe a energia que o povo reivindicava na Rádio Candeeiro, improvisada e clandestina no Tênis Clube e as procissões de lanternas, velas e candeeiros pelas avenidas escuras de Santana.  Com poucos anos depois também chegou água encanada do rio São Francisco e aposentou os mais de cem jumentos que botavam água nas residências trazidas das cacimbas do rio Ipanema seco. E essas duas lutas foram apenas o início de outras grandes. Depois eu conto.

Afinal, escuro só presta para ladrão e para... Aquilo.

MINHA RUA MADRUGADA (FOTO OBRA-DE-ARTE DE B. CHAGAS).


Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2025/07/escuro-clerisvaldo-b.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário