terça-feira, 6 de julho de 2010

CRÔNICA FEITA

CRÔNICA FEITA
(Clerisvaldo B. Chagas. 7.7.2010)
O amigo gosta de mudanças? Quero dizer, apartamento novo, entregue na obra. Você nem imagina o requifife que aparece! O bicho é como automóvel que se recebe pelado. Se há reclamação, tem sempre um sujeito maneiroso que procura justificar os erros; mistura de ambulante e rábula. É preciso fazer os armários, trocar a pia, rejuntar o esquecido. Aí você se lembra de ligar o gás encanado, solicitar serviço de telefonia, da Internet. As providências crescem, ficam do tamanho do serrote do Cruzeiro, um monte da minha terra. Ninguém aparece. De repente o sufoco danado. Chega tudo de uma vez. Ali, dois marceneiros batem, furam, serram. A zoada constante da furadeira estressa até os santos. Outra furadeira responde à primeira; é o homem trocando a pia. Bate, fura, serra; serra, fura, bate. Olhe, o sujeito do rejunte chegou. Puxa os móveis, inicia o trabalho. Toca a campainha. São dois gesseiros. Vão tapar os buracos que não servem para nada. O celular chama. No outro lado da linha, perguntam se o rapaz da TELEMAR chegou. Os gesseiros vem dizer que só faltam acabamento e pintura. Chamam à porta. É um fuleiro qualquer entregando propaganda de TV. Seis homens de uma vez mexendo no apartamento. Você nada pode fazer. Um precisa um pouco de cimento, outro quer uma broca de parede. O primeiro faz coisa errada, dá duro para consertar. Ao se virar para a conferência, o homem do rejunte vem dizer que terminou o serviço faz um cumprimento e vai embora. Ainda bem. Agora ficam somente cinco. Os gesseiros também vão embora. Você calibra a paciência para três. As furadeiras, entretanto, valem por mil. A parada para o almoço é um ufa bem suspirado, uma sentada providencial, um choro que não vem. Fica apenas o chato telefone pegando carga: bip, bip, bip... Ah, Maceió!
Em mais alguns dias seguidos, recomeçam as ladainhas. O indivíduo da ALGÁS demora a um chamado. Novos telefonemas, apertos do patrão e, o camarada no instante chega desconfiado. Lá vem novo lamento. O eletricista quebra o suporte da luminária e quando você põe a mão à cabeça, chega um curioso querendo espiar tudo. Mas é cada uma! E o telefone, meu amigo! Telefone só com o “habite-se” da prefeitura. Enquanto o “habite-se” não sai, nem telefone nem Internet. Olhe a novidade, gente! Maior velocidade na Internet, o dobro da que tem agora. Mas como, criatura!? (Diria o Carlos Sampaio do SINTEAL). Cadê a autorização da prefeitura? Paciência, Seu Mané. Aqui é diferente. Às vezes querem fazer Roma num dia só. Ô diabo! Que maçada o marceneiro dá. Atende mil pessoas de uma vez só e reduz as horas que trabalha no seu serviço. Não senhor, puxar os cabelos não adianta, Zé. Não sei. Pois bem, quem não tiver paciência não conte os passos da preguiça. E como já foi dito e exemplificado, faça a experiência. Foi diante de tanto ruge-ruge que o amigo aconselhou e riu: você não é cronista? Faça uma crônica. Onde se vai arranjar tempo, não sei, mas está aí a CRÔNICA FEITA.




Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2010/07/cronica-feita.html

O BAR DA CÍCERA

O BAR DA CÍCERA
(Clerisvaldo B. Chagas. 6.7.2010)

Em nossas brincadeiras em Santana do Ipanema, tínhamos os nossos lugares prediletos. O bar do Erasmo, no início da Rua São Pedro, era um deles. Os frequentadores dividiam-se entre profissionais autônimos e funcionários do governo. Cerveja sempre gelada, mas o tira-gosto vinha das casas de alguns desses frequentadores que moravam próximos. O Erasmo colocava bastante pimenta e poucos provavam dos pratos que chegavam. Lembro de pessoas interessantes que buscavam aquele bar como os professores Marques (Filosofia), Eli (Matemática) e José Maria (História). Entretanto, o nosso refúgio predileto era o bar do Biu, à Rua Delmiro Gouveia. Depois o Benedito Pacífico ampliou o estabelecimento, mudando de categoria com o sugestivo título: “Biu’s Bar e Restaurante”. Ali frequentamos por mais de vinte anos porque o Biu atendia com gentileza, era um local aconchegante e tranquilo. Nas paredes havia quadros com paisagens de países estrangeiros, principalmente os de quatro estações. Ao fundo, o belíssimo quadro panorâmico natural do rio Ipanema. Durante as cheias, águas por cima das pedras do poço das Mulheres. Na estiagem, o bucólico cenário típico nordestino. Areia, pedras e mato. Um jumento pastando, uma vaca amarrada, um menino caçando passarinho. Nada pagava o cenário tristonho do rio. Foi dali do Biu’s Bar e Restaurante que partiu a primeira excursão a pé até a foz do Ipanema. Com a falta do Benedito, o seu filho Jairo assumiu definitivamente o negócio que hoje funciona como bar e salão de festa, muito solicitado, por sinal.
Certo dia, porém, eu e o Zé Maria, resolvemos girar por outros lugares de Santana e fomos parar na Rua São Pedro. O ponto escolhido foi a bodega da Cícera que também funcionava como bar. Pois bem, quando chegamos por ali, ouvimos logo a música “Feiticeira” que estava fazendo sucesso. Pedimos cerveja, puxamos conversa vendo a satisfação da dona com a nossa presença. O amigo Zé Maria foi logo dizendo que a música era muito bonita. Com isso, a Cícera encheu-se de satisfação e esqueceu o CD que rodou até ninguém não mais aguentar. Pagamos a conta e fomos embora com a cabeça cheia de cerveja e os ouvidos zoando com a “Feiticeira”. Em outros lugares comentamos que o bar da Cícera só tocava aquela música, por isso não iríamos mais ali. Ora, ninguém pode dizer daquela bebida não beberei. Uns quinze ou vinte depois retornamos, sem sentir, à mesma bodega. A Cícera aproveitou à hora, colocou os cotovelos no balcão, segurou o queixo e indagou contundente: ”Zé Maria, me diga uma coisa. É verdade que você e Clerisvaldo andaram dizendo por aí que meu bar só tocava “Feiticeira”? Confesso que na hora não encontrei saída. Mas o professor Zé Maria Amorim, improvisou bonito igual ao Nêgo Zé Lima. Disse bem sério diante do rosto interrogador: “É verdade, Cícera, a gente comentou mesmo, mas se você não colocar agora a música “Feiticeira”, a gente vai embora nesse momento e nunca mais vem aqui”. A mulher abriu-se num sorriso largo, e haja cerveja com tira-gosto de “Feiticeira” até umas horas. Depois dessa, cabra velho, não me lembro de ter posto os pés novamente no BAR DA CÍCERA.

Link para essa postagem
http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2010/07/o-bar-da-cicera.html