domingo, 29 de janeiro de 2023

 

LAMPIÃO E O BALANÇO

Clerisvaldo B. Chagas, 30 de janeiro de 2023

Escrito Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.834

 



Entre os 437,875 km2 do território de Santana do Ipanema, estão os sítios rurais “Queimadas do Rio”, “Serrote dos Brás” e “Tapera do Padre”. Queimadas do Rio, também popularmente simplificado para “As Queimadas”, está localizado a cerca de 4 quilômetros da sede. Seu acesso acontece pela AL-220, logo após um trecho do riacho João Gomes.  Entre a rodovia e o sítio, é preciso passar uma baixada que costuma formar lagoa em período de muita chuva, interditando a passagem. Subiu a rampa, estaremos nas Queimadas, uma área mais alta, muito agradável e usada para chácaras por pessoas de classe média. Nos tempos mais difíceis de estudos, muita gente rompia a distância para a cidade, a pé, em busca das escolas. Assim, inúmeras criaturas das Queimadas conseguiram se formar e trabalhar em empresas importantes do estado de Alagoas.

O seu nome tem origem num incêndio muito grande nas roças e caatinga que só foi parar ao atingir o rio Ipanema, vários quilômetros abaixo. Já o serrote do Brás, representa um monte, uma serra pequena habitada pela família que lhe empresta o nome. E ainda, entre outros sítios da vizinhança, vamos encontrar nas margens do Ipanema o sítio Tapera do Padre. Não sabemos se a Tapera (casa pobre) fora moradia de alguém que se formara padre ou eram terras que pertenciam a um sacerdote. O cenário também é agradável e completamente diferente do terreno mais alto das Queimadas. É incrível como a paisagem muda rapidamente de um sítio a outro no Sertão.

 Voltando ao sítio Tapera do Padre, quando Lampião, em 1926, invadiu a zona rural de Santana do Ipanema e entrou na, então, vila de Olho d’Água das Flores, passou na Tapera do Padre. Segundo um cangaceiro preso, entrevistado em Recife, Lampião submeteu a torturas um cidadão do lugar e o colocou num balanço, balançando-o até fazê-lo cair e morrer da queda e de tudo. Se não fosse aquela declaração cangaceira de referência muito rápida ao episódio do bandido maior, não teria sido registrado. Não temos tanta certeza, mas tudo indica que o entrevistado fora o cangaceiro santanense Gato Bravo (antes, conhecido por Josias Mole). Foi ele quem guiou Lampião nessa empreitada até a vila de Olho d’Água.

Se você curtir, tem mais. Se não curtir, a tendência é ir rareando esses trabalhos até desaparecer.


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quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

 

SEU CARA DA PESTE

Clerisvaldo B. Chagas, 26/27 de janeiro de 2023

Escritor Símbolo de Sertão Alagoano

Crônica: 2.832

 



O senhor Cirilo, foi o último tropeiro de Santana do Ipanema. Ele, com sua tropa de burros, levava mercadoria para a zona da Mata e de lá trazia produtos para o Sertão. Para a Mata ia o queijo, o feijão, a farinha, a carne de sol e mais. Da Mata chegava o mel de abelha, o mel de engenho, o açúcar, o tecido, a aguardente... A rapadura. Quando seu Cirilo – que morava na esquina de um beco que dava para o rio Ipanema, na Rua Prof. Enéas – chegava de viagem, desarreava a burrama e a soltava para pastar no leito seco do rio. Seu filho, vulgo Lelé, ainda rapazinho, acompanhava o pai naquelas idas e vindas inter-regionais. O senhor Cirilo faleceu e, Lelé, continuou solteiro, foi envelhecendo e passou a ajudar no bar do seu sobrinho Erasmo na Rua e Bairro São Pedro, em torno dos anos 60-70.

Já de cabelos brancos e ainda solteirão, Lelé gostava de uma cachacinha e, quando bebia tirava direto por alguns dias. Nunca perguntamos ao Lelé onde ele estudara, mas ainda era bom de memória na Geografia que naquele tempo era na base da decoreba. Quando o nosso querido amigo de todos bebia, gostava de chamar as pessoas de “cara da peste”. Era sempre testado, quando sóbrio, pelos clientes do bar, sobre pontos geográficos do Brasil e do mundo. Enquanto guardava o dinheiro do cliente num miolo de um rádio velho e que ainda funcionava, respondia o que lhe fora perguntado. Adaptara uma tampa de madeira nesse rádio que era seu orgulho e que pegava, segundo ele, a Rádio Nacional, a Rádio Sociedade da Bahia, a BBC de Londres e outras muitos distantes do País.

Pois bem, Certa feita, um sujeito encontrou Lelé na Rua Antônio Tavares, tão bêbado que estava se segurando às paredes  para não cair. “É agora que eu quero saber se Lelé entende mesmo de Geografia”, pensou o cidadão. Dirigiu-se até o antigo tropeiro e indagou incrédulo: “Lelé, qual é o maior lago do mundo?”. O filho de seu Cirilo ainda fez uns volteios para se manter de pé, foi lá, veio cá, tornou a se segurar às paredes, olhou para o rosto do inquiridor e respondeu cobrando o preço: “não é o lago “Baiká”, na Sibéria, com 636 km 2, SEU CARA DA PESTE!”.

Arre!

Imortalizamos o ex-tropeiro.

CRÉDITO: PROGRAMA ENTREVERO CULTURAL ´PEC

 

 


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