NO TEMPO DA PROGRESSO (Clerisvaldo B. Chagas. 14.12.2009) Para os jovens estudantes de Santana do Ipanema    Relembrando daqui de Macei...

NO TEMPO DA PROGRESSO

NO TEMPO DA PROGRESSO
(Clerisvaldo B. Chagas. 14.12.2009)
Para os jovens estudantes de Santana do Ipanema

   Relembrando daqui de Maceió os tempos de estudante, chegam à cabeça partes da história do Sertão e de Alagoas. Sertão de estradas de terra, de asfalto buraqueira. Na capital batia a saudade do interior e os pensamentos galopavam para Santana do Ipanema. Um filho que nunca renegou suas origens. Quando surgia uma oportunidade: a saída da rodoviária velha do Bairro Poço; o cheiro repulsivo do carbono; os lanches invariáveis do balcão; os olhares ansiosos dos quase passageiros marcavam o estudioso. Mas a vontade pétrea de retornar à casa paterna cobria tudo. E lá vai o ônibus da empresa Progresso demorando a rodar. A marcha de alavanca comprida “dando croques”; a paciência diplomada do motorista. Ah! O carro parece não sair de Maceió na sua lentidão. A ladeira de Satuba, sempre marcada como verdadeiro início da viagem, não quer chegar. Quatro horas, quatro horas e meia Maceió/Sertão. Pensamentos febris nas ruas de Santana, nos becos de Santana, nas matas de Santana. Eita viagem longa, meu Deus! Somente após o antigo povoado Bola, hoje Estrela de Alagoas, a alegria começava a fluir. Era para nós outro marco a primeira descida ao Sertão. Rio Traipu, fazenda Mair Amaral, entrada para a cidade Minador... E lá se ia o ônibus da Progresso. Passa Minador do Lúcio (Minadorzinho), chega a Cacimbinhas; desce todos para a churrascaria do Josias, perto do antigo e solitário posto de gasolina. Adicione tempo. Finalmente o transporte segue com sua zoada característica, para aqui, para acolá; nova marcha, nova força. Já estamos no Sertão, quase em casa, mas ainda restam a pedra do Padre Cícero, a cidade de Dois Riachos e duas ladeironas para o povoado Areias Brancas. Agora sim, faltam 12 km para a chegada a “Rainha do Sertão”. Ponte sobre o riacho Gravatá, o cenário da última curva para o serrote Gonçalinho, poço Escondidinho no rio Ipanema. A empresa Progresso acaba de completar mais uma parte na história dos transportes em Alagoas.
Mesmo agora em viagens de automóveis, conservamos as mesmas ansiedades, os mesmos marcos como a ladeira de Satuba, o rio Traipu, a pedra do Padre Cícero. Crônica amarga e doce não fácil de fazer, essa NO TEMPO DA PROGRESSO.

FECHANDO A SEMANA (Clerisvaldo B. Chagas. 11.12.2009) Para amenizar o final dos dias úteis, marcados pelas tragédias dos jornais, encerremos...

FECHANDO A SEMANA

FECHANDO A SEMANA
(Clerisvaldo B. Chagas. 11.12.2009)

Para amenizar o final dos dias úteis, marcados pelas tragédias dos jornais, encerremos com poesias. Vamos contar dois casos acontecidos em sextilhas (estrofes de seis versos com sete sílabas). O primeiro tem uma terminação chula, porém, o importante é a criatividade, a rima incomum e a métrica perfeita.
O cantador violeiro-repentista gosta muito de cantar às belezas naturais: o Sol, a Lua, as montanhas, rios lagos, lagoas, inverno, verão... Entre os repentistas se destacam aqueles que são mais específicos em determinados gêneros. Fulano é bom em martelo agalopado, beltrano é ótimo em temas, cicrano é mais lírico e assim em diante. Quando se canta em sextilhas (estrofes básicas de seis versos) o cantador tem que iniciar a sua estrofe rimando com a última palavra da estrofe do companheiro para evitar balaio (jogar verso decorado no meio do improviso como quem passa “rabo de porco” no jogo de dominó).
Pois bem, segundo o saudoso vereador Zé Bodinho e o Cecéu mecânico, uma dupla se digladiava em algum lugar do Nordeste. Um dos cantadores descrevia as maravilhas físicas do mundo e fez uma estrofe mais ou menos assim:

Admiro o céu azul
Que parece uma esplanada
Sem ter cola no espaço
A nuvem fica parada
Admiro a chuva fina
No bojo da madrugada

O outro cantador, afeito mais às coisas do sertão, aproveitou a deixa e disse:

“Eu admiro isso nada
Admiro é o teiú
Que corre dentro do mato
Descalço pelado nu
Com tanta velocidade
Não pega um toco no c...”

É pena não sabermos o nome do autor. O segundo caso foi contado pelo repentista e apresentador da TV Diário, amigo Geraldo Amâncio, defronte a Matriz de Senhora Santa Ana. Não falou sobre o autor da façanha. Um cantador cantava sozinho em uma tolda na feira. Elogiava os transeuntes. Alguns paravam com o elogio e depositavam sempre uma nota de real, não passavam disso. Acontece que o poeta avistou uma dona muito bonita e elegante que se aproximava. Rapidamente indagou ao barraqueiro quem era ela. O homem respondeu que se tratava de uma rapariga, a dona do cabaré local. Ao passar pela tolda, a mulher recebeu um inspirador elogio do poeta. Vaidosa, voltou-se, abriu a bolsa e depositou no prato duas notas de 10 reais. Ora, para quem só estava recebendo de um, o repentista ficou eufórico e agradeceu:



“Muito obrigado dona
Pela paga verdadeira
Mal empregado esse nome
Que lhe dão mulher solteira
Raparigas são as pestes
Que andam lisas na feira”.

(OBS. Leitor assíduo: mande suas impressões sobre os nossos trabalhos através de E-mail ou pelo mural (pombo-correio) do Site Santana Oxente. Não ficará sem resposta, inclusive crônicas dedicadas quando caírem no seu perfil). Até segunda.
Esta crônica saiu adiantada. Correu na frente dizendo: Não me pega, seu besta!




O GLOSADOR E A GLOSA (Clerisvaldo B. Chagas. 10.12.2009) Para os que apreciam o mundo dos sonhos. Continuando para o leigo uma explanação so...

O GLOSADOR E A GLOSA

O GLOSADOR E A GLOSA
(Clerisvaldo B. Chagas. 10.12.2009)
Para os que apreciam o mundo dos sonhos.

Continuando para o leigo uma explanação sobre poesia popular, temos a glosa e o glosador. Geralmente o glosador é um poeta que não canta; um apologista que tenta; um violeiro repentista sem a viola. O glosador improvisa versos falando normalmente. A maioria dos casos com glosadores acontece em pé de balcão, em caminhadas com amigos, ou em rodas de repentistas em repouso. A glosa é uma composição poética que antes se repetia o tema ou mote feito nos últimos quatro versos (também chamados linhas ou pés) hoje em desuso. Ficaram, então, somente dois pés (os dois últimos) ou um pé só (o último da estrofe). A glosa de um só verso também é coisa rara. O mais comum é a glosa em décima de dois versos. O saudoso poeta Zezinho da Divisão (fronteira Santana/Carneiros) era mestre em glosa de um pé só. Exemplo: “Só vai arrochando tudo”. Um exemplo completo foi quando deram o tema em um pé só a determinado poeta: “Sua mãe foi fêmea minha”. Esse mote foi criado por um sujeito que não gostava de glosador e queria desmoralizá-lo. Recebeu como resposta mais ou menos o seguinte:

“Sua avó velha safada
Seu avô um beberrão
O seu pai foi um cornão
Sua tia depravada
Sua prima era falada
Sua irmã uma galinha
Seu irmão foi mariquinha
Com sua traseira gasta
Você mesmo é pederasta
Sua mãe foi fêmea minha.”

Outra glosa com o tema: "tudo é desgosto na vida".

O homem faz plantação
A chuva às vezes não tem
E quando essa chuva vem
Não dá preço o algodão
Mas se viceja o feijão
Vem a lagarta comprida
Se a safra não for perdida
Só querem comprar fiado
Pobre só vive lascado
Tudo é desgosto na vida.

Muita atenção porque como na cantoria, a exigência também é na rima correta (amor com temor; Sé com José). Rimar Ceará com ferrar, é crime na poesia dos repentistas. Outra coisa é o número exato de sílabas. São medíocres os versos que tem uma sílaba a mais ou a menos. Ferem os ouvidos. Algumas publicações gráficas na cidade estão nesse nível, mas não ousamos criticar ninguém. Apenas a minha leitura não passa da segunda estrofe.
O poeta Rafael Paraibano da Costa, professor de Zé de Almeida, era ótimo e tranquilo no assunto de glosar. É gostoso ouvir O GLOSADOR E A GLOSA.