terça-feira, 23 de março de 2021

 

O GUARDA, A PESTE E O CANTADOR

Clerisvaldo B. Chagas, 24 de março de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.496

 

Essa pandemia faz lembrar o combate à peste, doença transmitida pelo rato. Isso já foi após a campanha da varíola que o povo chamava de “bexiga” e matou muita gente. Havia vários guardas de peste em Santana do Ipanema. Na minha rua morava um deles, na Travessa Benedito Melo morava outro e na Avenida N. S. de Fátima também. Inclusive, estourara o escândalo em que uma criança havia sido estuprada pelo guarda da Avenida. Dirigindo-me ao Grupo Escolar Padre Francisco Correia, encontrei multidão defronte a casa do homem, ou pedindo Justiça ou querendo linchá-lo. Nunca soube no que deu. O chamado guarda de peste deixava uma bandeira na porta ou janela da casa visitada, enquanto procurava colocar medicamento nos potes e em outros depósitos d’água. Muita gente fazia como os que hoje não querem usar máscara, isto é, não deixavam o guarda colocar o remédio. Alegavam que o líquido ficava com gosto estranho.

Os dedicados funcionários saiam também pela zona rural e muitas vezes passavam dias fora de casa. Como todo combate às doenças, em alguns lugares eram bem recebidos, em outros, escorraçados.

Certa feita, o poeta repentista já mencionado aqui em outro trabalho, Joaquim Vitorino, descansava numa rede no alpendre de uma fazenda, quando chegou um daqueles guardas. Joaquim fez uma crítica amarga ao futuro concorrente de um bom almoço na casa do fazendeiro. Sapecou-lhe uma décima:

 

Aqui no meu Nordeste

Vem gente igual ao senhor

Goza mais do que doutor

Nesse negócio da peste

Andando pelo agreste

Não lhe falta o que comer

E com esse parecer

A profissão tem regalo

Comendo galinha e galo

Botando o pote a perder

 

Não se brinca com repentistas.

REDE DE DORMIR (FOTO/DIVULGAÇÃO).

 

 

 

 

 


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