segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A CABEÇA DO CORONEL

A CABEÇA DO CORONEL
(Clerisvaldo B. Chagas. 31.8.2009)

Quem não já ouviu falar do Aleijadinho, o grande escultor das Minas Gerais! Certa feita uma autoridade foi procurar o exímio artista, acompanhada de um coronel chamado Zé Romão. Queria a autoridade que o escultor fizesse uma imagem grande de São Jorge para que ela saísse durante o próximo festejo religioso. O Aleijadinho prometeu realizar a encomenda. Acontece que o artista ouviu, talvez sem querer, as palavras do coronel para a autoridade: “Mas que homem feio!” O Aleijadinho guardou a frase e intimamente elaborou uma vingança. No dia da festa a charola foi bem acompanhada, mas o povo olhava desconfiado para a imagem de São Jorge. As pessoas apontavam para o andor com aquele santo diferente da tradição. Ora, o Aleijadinho — na sua vindita — havia confeccionado um São Jorge com a cara do ajudante de ordens da autoridade. Isso fez alguém criar e espalhar a seguinte quadrinha:

“Aquele que ali vem
Com ares de santarrão
Não é São Jorge nem nada
É o Coronel Zé Romão”

Ao invés de rezar o povo ria às gargalhadas. Foi assim que o célebre escultor mineiro realizou sua vingança de quem o chamou “feio”.
Vivemos nesse início de século no Brasil, não uma onda de violência, mas um verdadeiro mar de atos impensados. Não se fala somente sobre o Rio de Janeiro. Em Maceió mesmo, os assaltos acontecem nos bancos, nos sinais de trânsito, em mercadinhos, em farmácias, em consultórios médicos e até mesmo em ponto de ônibus e nas calçadas. À brutalidade se junta o álcool, a maconha, o crack. Não se pode mais nem apelar para a consciência degenerada do bandido. Ela — a consciência já combalida — vem acompanhada pelas drogas que não permitem esperança alguma à cabeça do usuário. Sem necessidade, por motivo fútil, amontoam-se as vítimas inocentes nos assaltos fatais pelo País.
Em se tratando de vingança, os sentimentos revanchistas são calculados e frios. Sobre a política deteriorada, os jornais também vão publicando rastros vermelhos invisíveis dos que se digladiam. Todos sentem ódio de alguma coisa nesse mundo de expiação. E para o que não tem condições de fazer vingança pior (o que é um erro), segue mais ou menos o traçado do escultor das Minas Gerais. Afinal o mundo está repleto de gente feia como nós e inconvenientes como Zé Romão. O jeito mesmo, para não estragar muito, é implantar num pedestal de justiça criatividade semelhante à CABEÇA DO CORONEL.

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