REVIVENDO O CANGAÇO
(Clerisvaldo B. Chagas. 3.2.2010)
Entre o povoado Candunda e a região da ribeira do Capiá, alto Sertão de Alagoas, viveu um cidadão de sobrenome Rodrigues. Homem rico, respeitado e misterioso, dependia da agropecuária. Lampião passava pelas imediações de vez em quando, mas, usando seus dons ofertados por Deus, Rodrigues tornava-se invisível aos olhos do “Rei do Cangaço”. Não concordava com as tropelias do bandoleiro. Certa feita, Lampião acampou ali por perto e mandou chamá-lo. Dessa vez o fazendeiro resolveu comparecer e apresentou-se ao chamado do bandido. O capitão afastou-se com o visitante ficando sob árvore frondosa nas proximidades. Disse que tinha conhecimento dos dotes de Rodrigues e queria apenas que ele copiasse uma reza forte das muitas que sabia. O fazendeiro alegou não saber escrever. Pediu para que Virgulino anotasse que ele iria ditando. Assim foi feito. Naturalmente Rodrigues não deve ter ensinado o pulo do gato. Lampião pediu também consentimento para levar o filho do fazendeiro, conhecido por Rodriguinho. O pai alegou que a decisão era do filho. E assim Rodriguinho partiu com Lampião, passando certo tempo no cangaço. Sua especialidade era atirar de longe nos bodes da caatinga, quebrando duas patas com um tiro só. Aquilo entusiasmava o capitão. Cansado das maluquices do cangaço, entretanto, Rodriguinho desertou. Lampião – que não perdoava desertores – andou algumas vezes na fazenda de Rodrigues, manso, maneiroso, querendo notícia do filho, “pois gostava muito dele”. O pai, macaco velho, desconversava, alegando sempre que não sabia onde se encontrava o rapaz. Rodriguinho, sob a proteção do velho, nunca mais em vida viu Lampião. Rodrigues morreu com 102 anos, tendo anunciado com bastante antecedência o ano, o dia e à hora da passagem. Tudo se cumpriu.
Rodriguinho constituiu família e, já em idade avançada, o tempo do cangaço bateu novamente em sua porta. Com uma neta casada com um sujeito perdido, teve que ver e aguentar muitas coisas para continuar em paz. Um dia o marido da neta partiu para a última ofensa. Após desdenhar do passado de Rodriguinho como cangaceiro, ameaçou bater no velho e partiu para a ação. Mas o agressor só teve tempo mesmo de erguer a mão. Caiu para trás ao receber as balas de um revólver 38, após o velho limpar a vista e não tremer as mãos. Polícia e Justiça quiseram cair em cima, porém, o homem que mandava em São José da Tapera e região interferiu: Como poderia a polícia prender um ancião que defendera a própria vida para não ser desmoralizado? E assim o caso não deu em nada.
Se Rodriguinho tinha um nome de guerra no bando de Virgulino, meu narrador não lembra mais. A vida desse moço faz parte do todo que embasou as hostes lampionescas. Nem mesmo após os arrependimentos ninguém está livre das tentações; nem com idade avançada. Essa narrativa veio a lume, graças à boa vontade de “Tonhe Véi”, homem decente que ajudou a preencher com família a ribeira do Capiá. Entre tantas e tantas histórias narradas envolvendo Lampião, incluímos a do cangaceiro anônimo Rodriguinho REVIVENDO O CANGAÇO.
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