quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

LEMBRANDO RAUL, LEMBRANDO O RIO


LEMBRANDO RAUL, LEMBRANDO O RIO
Clerisvaldo B. Chagas, 22 de dezembro de 2017
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1807

RIO IPANEMA. FOTO: Clerisvaldo B. Chagas).
IPANEMA

“Qual uma criança, ciosa do seu melhor brinquedo, jamais afastei do pensamento a doce imagem da minha infância no leito pedregoso do rio Ipanema. Ora eu andava em rompimento à temporânea correnteza, ora saltava e mergulhava na quietude dos poços que a enchente deixava em volta das pedras mais altas, que marcavam o remanso impetuoso das águas velozes para o São Francisco.
Era assim na fase hibernal, quando o leito do rio se paramentava orgulhosamente vestindo um lençol líquido, às vezes alvacento, que, todavia, não durava muito; aos poucos, com o avanço inevitável do estio, a coberta aquífera se rompia com a aparição das pedras que iam despontando aqui e ali, e em breve, um lombo de areia também surgia dividindo a vazante e serenando o embalo da correnteza.
Esse valente tributário do famoso rio Chico, entra em Alagoas procedente do município pernambucano de Pesqueira, seu nascedouro. É um rio querido das crianças que habitam a sua longa e animada ribeira e aprendem a nadar e fazer pescarias, bem assim, transformam o seu dorso de areias branquinhas e faiscantes em palco de verão para as suas animadas e ingênuas brincadeiras.
É mesmo um gosto beirarmos as margens do rio Ipanema fechadas por arbustos sempre verdes e, também, fartos de passarinhos alegres e saudáveis, que ali se aninham para o amor e a procriação.
Como se vê, o cálido verão regional, não apaga de todo o encanto natural do rio Ipanema, mormente em virtude da aparição de poços que restam da cheia e refrescam o ambiente represando peixes e também crustáceos, como, por exemplo, aratanhas e pitus, que, em clima de festa, são fisgados pela população em seus limites.
Tive a graça de participar da delícia dos festejos que acabo de enumerar, bem como de, ainda hoje – muitos anos são decorridos! – me deleitar na memória afetiva de todos eles.
O Ipanema há de acompanhar meus passos pela vida em fora, até que eu mergulhe no silêncio perpétuo que é o manto indevassável que nos separa do misterioso Outro Lado da Vida”.

·         MONTEIRO, Raul Pereira. Lembranças. Ideia, João Pessoa, 2002, págs. 33-34. 

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