terça-feira, 21 de outubro de 2014

RIACHO, RUAS, LITERATURA



RIACHO, RUAS, LITERATURA
Clerisvaldo B. Chagas, 21 de outubro de 2014
Crônica Nº 1.286

Manezinho Chagas e a Rua Antonio Tavares. Fotos (Clerisvaldo).
E vêm as lembranças todas de uma vez. Vejo o riacho Salgadinho, seco e sumido, no Bairro Floresta. Revejo o mesmo Salgadinho, forte, pujante, absoluto lambendo os quintais, interrompendo a estrada da serra Aguda, levando o rolo d’água valente para o seu patrão, rio Ipanema.
E contemplo na tela grande da mente a minha Rua Antônio Tavares, a primeira de Santana. Seu Otávio magro, um homem enorme, com uma faca enorme, deslizando a arma nas mantas de carne de sol. Diante de si o cocho enorme da salgadeira. A faca de Seu Otávio magro parecia cortar manteiga de tão afiada. Seu Otávio vendia carne, Seu Antônio vendia doces, Seu José Camilo vendia farinha, Seu Manezinho Chagas vendia tecidos, Dona Zifina vendia candeeiros, Seu Carrito vendia a bodega... É... Seu Carrito vendia a bodega, diz a mente repisando lembranças.
Surge Seu Otávio Marchante com a peixeira no coldre. Torcedor do time da cidade. Torcedor número um, correndo às beiradas do Estádio Arnon de Melo com seus gritos robustos: “Bola rasteira, menino! Aí é Joãozinho”.
Seu Joaquim, o soldado que não prendia ninguém. Alfredo Forte fazendo calçados, Pedro Porqueiro negociando suínos e Antônio Marceneiro, sem camisa, arrastando a plana. Seu Tancredo tem caminhão, Seu Guilherme é merceeiro, Seu Né fumando cigarro constantemente, cuba terras. Soldado Leôncio fala grosso, Júlio Pisunha faz colchão de junco. Firmino Carreiro, Manezinho Quiliu com as casas cheias de moças. Eu hoje, espiritualmente falando com Zefinha de Seu Né, doce e amiga como sempre. Severino vende tecidos, Dona Alice chama pra “armoçar”, Dona Ester lê cordel para nós.
Os jornais me entediam, as redes sociais ficam nojentas com propagandas abjetas, não quero mais escrever... Mas a brisa sopra a memória e sopra e sopra e me arrasta para o teclado. E vejo Chico Assis namorando, professora Adercina lendo jornal, Ambrosina engomando, Elias batendo sola...
Sei não... Por que tenho que escrever isso nessa Literatura minação que às vezes seca como o Salgadinho, às vezes bota cheias enormes como esse mesmo riacho.



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