sábado, 18 de maio de 2013

O BARBUDO DE VALDEREDO



O BARBUDO DE VALDEREDO
Clerisvaldo B. Chagas, 17/18/19 de maio de 2013.
Crônica Nº 1019

foto: (passosmgonline).
     Na década de sessenta, principalmente, foram manchetes em jornais nordestinos e revistas nacionais, os embates no Sertão alagoano. Floro Gome Novais virava mito com suas vinganças pela morte do pai, em Olivença. Nas regiões dos povoados Várzea de Dona Joana e Pedra d’Água dos Alexandres, uma família se digladiava em rixa tremenda. Muitas emboscadas e mortes marcaram negativamente os bons invernos daquela década. Raramente os noticiários do dia deixavam de citar algum acontecimento ligado a Floro Novais ou à família Ferreira. Nos duelos sem fim que dizimavam jovens e adultos dos Ferreira, ganhou destaque o senhor Valderedo. Mesmo assim outros personagens da mesma família eram citados como ágeis e valentes. Valderedo e Floro tornaram-se amigos, mas Floro não se metia na briga interna dos Ferreira e nem aprovava os combates do mesmo sangue. No final de tantas lutas, Floro Novais foi emboscado e morto com um simples caroço de chumbo que lhe atingiu o coração. Valderedo desencarnou depois, dizem, vítima do próprio coração.
Certa feita, um vizinho nosso estava em um bar no cruzamento urbano Maracanã, em Santana do Ipanema. Gostava ─ como ainda hoje ─ de andar barbudo. Ao passar pelo local, sempre alerta e desconfiado, Valderedo avistou o cliente e agitou-se. Confundi-o com um dos seus terríveis inimigos. Quando estava pronto para eliminar o pobre caminhoneiro, foi convencido por alguém que aquele barbudo não era o fulano e sim, um rapaz muito trabalhador, motorista e conhecido de todos na cidade. Valderedo ainda demorou em acreditar no que lhe diziam, por causa da semelhança das pessoas em causa. Entretanto, o trabalho de convencimento teve êxito. Não temos certeza, todavia, se ao desistir do intento Valderedo ainda chegou a pedir desculpas à suposta vítima. Estar certo o que filosofa: “quem de uma escapa, cem anos vive”. Vez em quando passo e cumprimento o meu vizinho que continua barbado e caminhoneiro.  
Muitas vezes a vida não passa de ilusão de ótica ou de cabeça. Quantos covardes e traidores surgem entre os que você julgava amigos! Quanto alívio se sente ao saber que o inimigo estava apenas na ilusão, como O BARBUDO DE VALDEREDO!.

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quinta-feira, 16 de maio de 2013

COMO SERÁ AMANHÃ?



COMO SERÁ AMANHÃ
Clerisvaldo B. Chagas, 16 de maio de 2013
Crônica Nº 1018

O trânsito estava uma beleza. Parecia rodízio na cidade, às sete e meia. Ao entrar na repartição, já havia cerca de dez pessoas aguardando o início do expediente. Um sujeito animava os que aguardavam com um discurso em miniatura. Cabelos grisalhos e voz forte, o baixinho não se cansava de falar. Várias pessoas ali estavam em jejum e já enfrentavam a primeira barra do dia com as sucessivas críticas do homem. Todos apenas ouviam. Peguei uma revista e fingi que iria passar à vista, espiando por baixo (que nem porco, como dizia a professora Helena Oliveira). O baixinho não poupava ninguém da política. Entrava num assunto e terminava em outro. “O povo mesmo não gosta de reivindicar. Tá aí faltando tudo no Ipaseal e nada do povo. Aliás, um povo que vota em (e citou três ou quatro políticos famosos do estado) já está dizendo que se vende por vinte reais. Devia haver uma lei para se colocar político para fora. Ô raça ruim da boba! Acabaram com tudo. Todas as nossas tradições os prefeitos destruíram”. E foi relacionando os festejos que alcançara no Bebedouro e no Vergel. Terminou identificando-se como radialista.
Um senhor tentou entrar no discurso, para ajudar à malhação, mas logo recuou porque o baixinho queria exclusividade. Perguntava aos presentes isso ou aquilo, mas para logo em seguida castigar nas palavras. Saiu dizendo que o nosso povo não conhecia nada e botou para fora uma porção de vultos estrangeiros. Os que pretendiam ajudá-lo na conversa radical, recuaram, enquanto outros olhavam apreensivamente para o relógio. Que meia hora comprida! Ao dirigir os olhos para o meu lado, voltei às páginas da revista e ouvi o porteiro anunciar que o elevador estava liberado. Houve um assanhamento geral. Sobe? O baixinho, mesmo assim, saiu procurando quem lhe ouvisse mais ainda, até encontrar um cidadão com a camisa parecida com a do flamengo. Esse teve paciência para escutar a xaropada.
Ontem, foi diferente. Começamos na mesma repartição com um senhor cantarolando velhas melodias de serestas. Hoje foi a crítica abafada para uma plateia bronca. COMO SERÁ AMANHÃ?



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