CANTADOR DE VIOLA Clerisvaldo B. Chagas, 14 de novembro de 2012. Crônica Nº 907 A Literatura de Cordel sempre apresentou criat...

CANTADOR DE VIOLA



CANTADOR DE VIOLA
Clerisvaldo B. Chagas, 14 de novembro de 2012.
Crônica Nº 907

A Literatura de Cordel sempre apresentou criatividades para a “peleja”. Uma cantoria de viola entre repentistas nordestinos era chamada pelos cordelistas de “peleja”. Assim surgiram muitas cantorias famosas em folhetos vendidos nas feiras com as capas em xilogravura. Peleja de Severino Pinto X Severino Milanês; peleja de Carneiro X Serrador... E assim por diante. Em uma delas, não lembro mais o autor e nem os protagonistas, a dupla sai da básica e tradicional sextilha para o martelo agalopado. O martelo agalopado é entre os mais de quarenta gêneros de uma cantoria, o mais nobre e belo de todos. Nessa versão se canta de tudo, porém, é praxe usá-lo para um desafio. Um desafio, uma discussão sobre conhecimentos os mais diversos, pode pender até para o baixo calão, conforme o estado de espírito dos cantadores.  A cantoria a que estamos nos referindo, um dos repentistas saiu-se com esta estrofe:

“Certa vez agarrei um violeiro
Dei-lhe murro com meu possante braço
Que a cabeça voou pelo espaço
Foi cair lá no Rio de Janeiro;
Uma perna caiu em Limoeiro
E a outra caiu na Indochina;
A viola caiu na Cochinchina
A barriga e a espinha dorsal
Desabaram na França e Portugal
Foi o fato cair na Palestina”.

Certa feita, em palestra com um político e pesquisador do folclore, na cidade de Senador Rui Palmeira, contávamos histórias um para outro. A sua preferência era justamente pela cantoria de viola, glosas e versos ocasionais que formam historietas imorredouras. Entre uma geladinha e outra, às vibrações constantes pelas estrofes bem acabadas dos crânios do Sertão. Pessoas amantes da arte do repente iam encostando, puxando uns banquinhos e engrossando a turma dos apologistas. Depois de muitas gargalhadas e rodízio das “louras”, recitei a estrofe acima e fiquei aguardando o resultado. O pesquisador, mas também político e adversário do prefeito da época levantou-se sério, apoiou-se num galho de árvore com o braço, tirou o chapéu e suspirou. Depois olhou para a turma de amigos e disse por aqui assim: “Que pena! Parece que isso só acontece com CANTADOR DE VIOLA”.

ASSUMINDO O LUGAR Clerisvaldo B. Chagas, 13 de novembro de 2012. Crônica Nº 906 Esses movimentos religiosos com seus cantos al...

ASSUMINDO O LUGAR



ASSUMINDO O LUGAR
Clerisvaldo B. Chagas, 13 de novembro de 2012.
Crônica Nº 906

Esses movimentos religiosos com seus cantos alegres e tristes, de início de novembro, levam-me a lembrar de duas pessoas da minha infância. É interessante para o pesquisador encontrar em vários recantos desse Nordeste, gente que se destaca nas comunidades, de uma forma ou de outra. Era assim que se sobressaía Dona Maria Néris, no povoado Pedrão (é) nos cânticos do Ofício de Nossa Senhora. Povoado da, então, vila de Olho d’Água das Flores, o Pedrão não dispunha de padre permanente. Mas o sentimento católico dos seus líderes, entre eles, minha tia Delídia, fazia puxar o terço todas às noites na bela igreja branca daquele povoado. Outras vezes era o ofício de Nossa Senhora, quando a voz estridente e inconfundível de Dona Maria Néris, cobria as outras vozes na homenagem segura à Virgem Mãe de Jesus. Eram de arrepiar as estrofes que doíam nos ossos dos meninos. Dona Maria costurava enquanto o marido Antonio exercia a profissão de marceneiro, mais um seguidor de São José. Mais tarde o casal mudou-se para Santana do Ipanema, indo morar quase defronte a minha casa.
Vez em quando eu subia a calçada alta para brincar com seu filho Antonio, o qual apelidamos de “Tonho Bié”. Dona Maria Néris havia intensificado suas ações de costura e Seu Antonio não parava o serrote na madeira. Tornaram-se pessoas queridas e apreciadas na Rua Antonio Tavares. O senhor Antonio era alto, magro e atlético, homem que não media esforços em prestar seus serviços a quem o procurasse. Dona Maria Néris, sempre que encontrava oportunidades, continuava desempenhando o seu papel de católica, emprestando a sua voz. Lembro bem da sua filha Sônia que terminou casando com um rapaz de Santana. “Tonho Bié”, quando adversário de jogo de bola, no meio da rua ou nas areias do Ipanema irritava pela eficiência da sua defesa chutando de “paêta”. Já mais velho, Bié, tornou-se “rato” nas sinucas do Salão de Zé Galego. Ainda hoje estão as casas onde habitaram muitos personagens que abrilhantaram a rua da minha juventude. Várias estão em estado lastimável, guardando os segredos de uma dinâmica temporal.
O motivo desse trabalho foi mais por Seu Antonio, marceneiro, ter passado no meu sonho de ontem. Encerro meus escritos fazendo essa homenagem com a frase que citei no final do sonho, em relação a ele e ao também carpinteiro pai de Jesus: “Quando São José deixa a oficina, Seu Antonio vai ASSUMINDO O LUGAR”.


PELO AVESSO Clerisvaldo B. Chagas, 12 de novembro de 2012. Crônica Nº 905 Quem mora no interior tem o privilégio de respirar u...

PELO AVESSO



PELO AVESSO
Clerisvaldo B. Chagas, 12 de novembro de 2012.
Crônica Nº 905

Quem mora no interior tem o privilégio de respirar um ar menos poluído; de sentir e fazer parte da Natureza em suas caminhadas pelos arredores e sítios dos seus respectivos municípios; contemplar de perto inúmeros animais domésticos que a cidade grande ver apenas na televisão; subir montanhas, sentir o cheiro gostoso do mato verde e gozar de certa paz que some ao deixar o lugar. Mas quando se fala no aspecto social, da organização que hoje faz ligação direta com a vida de cada pessoa, o placar se abre contra numa tremenda goleada. Poucos benefícios sociais são implantados do interior para a capital. Continuamos como nos tempos dos bandeirantes, esperando que as novidades aconteçam e acobertem as capitais, para uma chegada longínqua e a conta-gotas pelo interior. É um bolo que não assa por igual, continuando um desenvolvimento capenga, demorado e injusto, sem atenção, sem ânimo, sem planejamento. Estamos nos referindo a todos os setores, principalmente nos que são criados para melhor qualidade de vida. Infelizmente ainda vivemos esse momento de China, quinze anos atrás.
O estado de Alagoas, por exemplo, tem um plano de Saúde chamado Ipaseal, mas não atende no interior. Como havia problemas de pagamento, os médicos deixaram o plano e os seus usuários ficaram apenas olhando para as paredes. Esse governo eliminou o pouco que restava em atendimento na cidade de Arapiraca e, atualmente, nenhum funcionário é atendido no interior do estado. Morrendo ou não, o indivíduo tem que procurar a capital, quando vai gastar o que não tem para ser atendido por dois ou três médicos com longos espaços entre os exames solicitados. Um verdadeiro massacre! Assim também são os documentos que precisam, como aposentadorias e benefícios cuja centralização funciona como falta de respeito aos nativos. A burocracia proposital nada tem a ver com falta de dinheiro, num estado em que usineiros são perdoados do imposto sobre o álcool. A origem de tudo é a ruindade mesmo, a ruindade de nascença do complexo do cão do inferno, que se desenvolve com o futuro dirigente. Infelizmente, em muitos casos Deus demora um bocado nos castigos que Dele se espera para esses monstrengos desalmados.
Geme povo alagoano, até o dia em que seus clamores consigam chegar aos céus. Nesse estado a palavra “esperança” veio PELO AVESSO.